Araçatuba

Os 50 anos de Chaves

Por Redação |
| Tempo de leitura: 6 min
ENREDO A vila do Chaves era uma representação fiel aos conjuntos habitacionais da periferia da Cidade do México, onde famílias viviam próximas umas das outras e compartilhavam espaços em comum. Crédito da foto: Divulgação
ENREDO A vila do Chaves era uma representação fiel aos conjuntos habitacionais da periferia da Cidade do México, onde famílias viviam próximas umas das outras e compartilhavam espaços em comum. Crédito da foto: Divulgação

Série mexicana marcou diversas gerações; história traz um garoto órfão (Chaves) que considerava a vizinhança onde morava como sua família

Bryan Belati

É difícil encontrar alguém que não conheça ou tenha ouvido falar de "Chaves". O seriado, que foi transmitido nas tardes do SBT (Sistema Brasileiro de Televisão) durante 36 anos, é um clássico da televisão brasileira, ainda que seja uma produção mexicana.

No último domingo (20), o programa completou 50 anos desde sua estreia no México, em 20 de junho de 1971. Como parte da celebração, o Grupo Chespirito, empresa que detém os direitos de todas as obras de Roberto Bolaños, formada pelos herdeiros do ator e diretor, e a TV Televisa, promoveram uma homenagem nas redes sociais.

"Celebremos esses 50 anos aplaudindo o criador e a família da vizinhança de 'Chaves'", disse Roberto Gómez Fernández, filho do ator, em um vídeo publicado no Instagram. O ator também afirmou que lembra perfeitamente quando seu pai começou a ser uma parte importante da TV no México, até Chaves se tornar o programa mais importante do continente.

Em celebração ao aniversário de estreia da série e a importância que o seriado tem na cultura brasileira, bem como na trajetória da televisão no Brasil, a Folha da Região traz uma reportagem especial que conta a história por trás de "Chaves" e suas curiosidades.

HISTÓRIA

Um vilarejo com organização habitacional típica dos bairros populares da Cidade do México daquela época, foi pano de fundo para situações de um menino de rua muito pobre, que passava grande parte de seu tempo em um barril.

Um dos maiores desejos de Chaves, ou "Chavito", como era conhecido na série no idioma original, era comer um simples sanduíche de presunto. A história foi criada por Roberto Gómez Bolaños (1929-2014), ator, diretor e roteirista mexicano. Ele interpreta o protagonista de "Chaves", e outros seriados, como "Chapolin Colorado", e ganhou o mundo ao se tornar um grande sucesso, que atravessou gerações.

Os demais personagens são: Seu Madruga, um homem de meia-idade, desempregado, trapaceiro e que custava a pagar o aluguel; dona Clotilde, apelidada por todos como Bruxa do 71, uma senhora idosa, solteira e sem filhos; Chiquinha, uma criança astuta e inteligente; Kiko, uma criança que se gabava de ter os melhores brinquedos embora bastante carismático; Dona Florinda, uma mãe solteira que não gostava tanto de viver em um lugar que acreditava não estar à sua altura; Professor Girafales, o professor das crianças e pretendente de Dona Florinda; Senhor Barriga, o dono da vila e que cobrava o aluguel, pai de Nhonho, criança da elite e que brincava com os meninos da vila.

IMPACTO

Não só no México, mas em todo o continente, o seriado acabou influenciando até no vocabulário das pessoas. Algumas expressões utilizadas pelos personagens foram eternizadas, como por exemplo "sem querer querendo" e "gentalha".

Por ter um contexto muito familiar de diversos países latinos, a série se tornou um sucesso, pois culturalmente, há quem se sentia representado. Suas raízes na América Latina estavam ligadas ao ambiente e relações que nela se realizam. A vila, palco da história, partilhava características habitacionais de países latinos.

Em contextos políticos e econômicos, a pobreza, falta de espaço e ausência de planejamento governamental para garantir o sucesso aos serviços públicos básicos que caracterizavam cidades, levaram à criação de unidades multifamiliares onde vizinhos acabaram compartilhando lugares comuns como pátio, banheiro, lugares para lavar e secar roupas, escadas, etc. A vida de uma família estava ligada à outra.

No livro "As Chaves do Sucesso", de 2006, do autor Pablo Kaschner, ele comenta que a vila é um espaço peculiar de convívio de pessoas, e de classes sociais díspares, como ocorre nos países latinos.

"O cenário, extremamente simples e feito com materiais baratos, dá a impressão de que pode se desfazer com um peteleco e se encaixa como metáfora à vulnerabilidade a que estão sujeitos, desde sempre, os chamados 'países em desenvolvimento'. A concepção cênica funciona como linguagem, na medida que traduz o cenário social desigual e subdesenvolvido da América Latina."

CRIADOR Roberto Gómez Bolaños foi o criador de Chaves e Chapolin Colorado. Crédito da foto: Divulgação

MUNDO

Não demorou muito para que Chaves ganhasse fama além do México. A partir de 1973, a atração foi transmitida para quase toda sua região e sua popularidade o alçou como o programa mais visto da América Latina.

A série já foi dublada em mais de 50 idiomas e ganhou em 2006 sua versão em desenho. Nem o próprio Bolaños imaginava que seus bordões fossem tão repetidos assim. "Nunca imaginei que durariam assim, nem que eu escutaria essas frases sendo repetidas até em meios como na política", declarou ele numa entrevista concedida à BBC em 2005.

 Em outra entrevista, desta vez ao portal El Universo, declarou não conhecer a fórmula do sucesso, mas sim a do fracasso. "Tentar lisonjear a todos. Nunca fiz concessões nem investiguei o que o público gostava, só fazia o que gostava, confiando que muita gente também gostava", esclareceu.

 Nos anos 70, a série já gozava de grande sucesso no México e grande parte da América Latina. Os bordões dos personagens já eram amplamente difundidos e conhecidos, mas no Brasil, a série demorou algum tempo para estrear.

BRASIL

 Em um pacote da Televisa em meio às novelas, o SBT adquiriu Chapolin e Chaves em 1984. A qualidade de produção do seriado destoava do padrão de telenovelas da Televisa, e Silvio Santos ficou de analisar se ficaria ou não com o pacote, que só poderia ser adquirido caso Chaves também fosse exibido.

Na época, o vice-presidente da emissora Luciano Callegari lembrou, em uma entrevista ao livro "Chaves: Foi Sem Querer Querendo", de 2006, que no primeiro contrato de cinco anos, cada episódio custou US$ 250, sem a dublagem, e depois passou a custar US$ 500.

O ex-executivo da emissora ainda comentou que disse não ao seriado, e não se interessou por ele em um primeiro momento. "Em razão da péssima qualidade da imagem, e também me pareceu, na oportunidade, que não teria grande chance de sucesso na nossa grade", bradou.

Os diretores do SBT foram unânimes. Para eles, Chaves não tinha qualidade, mas Silvio Santos contrariou a todos e disse que compraria o pacote da rede mexicana. O sucesso foi instantâneo, se tornando um curinga na programação do canal.

ADEUS

O programa foi exibido pela emissora brasileira durante 36 anos, e era o "coringa" da programação no período da tarde, em que não haviam programas exclusivos, e o seriado era utilizado para recuperar a audiência do horário.

No entanto, Chaves saiu do ar no Brasil e em outros países devido a uma decisão da Televisa de não renovar o contrato de utilização dos direitos autorais das obras de Chespirito. Os mais de 1.200 episódios de Chaves, Chapolin e do programa Chespirito pertenciam à Televisa há 45 anos. Porém, o canal se fundiu ao canal 8 (TV Tim), que transmitia as séries.

 Bolaños tinha um acordo com a gigante da comunicação latina, e revelou que esta parceria aparentemente eterna teria prazo de validade, pois o ator tinha apalavrado um contrato de usufruto dos personagens e de sua criação literária até 30 de julho deste ano, quase seis anos depois de sua morte.

 E como a Televisa não renovou o contrato de direitos autorais, então os programas tiveram que sair do ar pois o canal não detinha mais os direitos de transmissão do produto. Em outras palavras, Bolaños estipulou uma data limite para a Televisa, produtora de seus humorísticos durante duas décadas, continuar lucrando com as reprises e exportações de Chaves. Se a rede quisesse as séries por mais tempo, teria que negociar com ele ou com seus herdeiros.

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