
Em novembro de 2013, logo após uma apreensão de 282 quilos de cocaína em um contêiner com ração animal que iria para a Bélgica, um traficante, apelidado de "Lionel Messi", tentou acalmar um de seus comparsas: "Moleque, fica tranquilo. Não vai dar nada para você". Márcio Henrique Garcia Santos foi preso anos depois, na Operação Oversea e agora, assim como o traficante André do Rap, um dos chefes da facção criminosa paulista que atua dentro e fora dos presídios, é um dos que pediram ao Supremo Tribunal Federal habeas corpus para deixar a cadeia após a decisão favorável ao chefe da facção.
Na semana passada, Marco Aurélio considerou que André do Rap tinha direito a deixar a prisão porque a Justiça não renovou a justificativa de sua prisão temporária por 90 dias, prazo estipulado pela nova lei anticrime. Assim como o chefe da facção, as defesas de Marcio Henrique Garcia Santos e Gilcimar de Abreu já protocolaram no STF pedido similar. Assim como no processo de André, a prisão deveria ser renovada ou suspensa após 90 dias.
Entre os dois, entretanto, Marcio Henrique Garcia Santos é o mais relevante e poderoso. Condenado a 33 anos de prisão por tráfico internacional de drogas, Márcio, vulgo Orelha ou Lionel Messi, já era conhecido há tempos pelos policiais da Baixada Santista, desde sua adolescência. Envolvido na organização criminosa, ele é considerado um intermediário entre os donos das drogas que eram enviados para a Europa e os responsáveis no Porto de Santos. Em parceria com outro réu, ele possuía um galpão com grande quantidade droga, que era remetida ao exterior em contêineres, principalmente para a Alemanha.
Hoje com pedido de liberdade, Marcio passou todo o seu processo como foragido. Em condenação de junho de 2019, o desembargador Nino Toldo, também responsável pela condenação de André do Rap, manteve a condenação de Márcio.
"Márcio não foi interrogado pois permaneceu foragido ao longo de toda a instrução criminal. Assim, não há dúvidas da autoria em relação a Márcio henrique Garcia Santos, de modo que mantenho a sua condenação", afirmou o desembargador.
Márcio quase foi preso em 2015 junto com seus comparsas. Na ocasião, policiais ficaram de campana do lado de fora do galpão onde a quadrilha guardava cocaína. Após perseguição, os suspeitos colidiram com a traseira de um caminhão. Após o acidente, os ocupantes tentaram fugir e atiraram contra os policiais, segundo a denúncia. Marcio foi reconhecido pelos policiais, mas conseguiu fugir - dois outros suspeitos, irmãos dele, foram presos. Ele só viria a ser preso um ano depois.
Ex-funcionário da JBS também pediu liberdadeOutro suspeito também condenado que pediu que a decisão de Marco Aurélio se extendesse a ele foi Gilcimar de Abreu. Preso em Mirandópolis, ele atuava diretamente com o grupo de André do Rap. No esquema, que consistia em enviar drogas em contêineres de empresas para a Europa, Gilcimar era o responsável por indicar qual a melhor forma de envio da droga.
Segundo documentos do processo, ele era funcionário da empresa Friboi/JBS. Segundo as investigações, ele dava suporte à execução do crime e estava à disposição da quadrilha. Os contatos entre os traficantes e ele eram feitos por orelhões. Quando precisavam de algum contêiner para o envio de drogas, eles ligavam para o funcionário. Conhecido como Popó, Gilcimar teve seu telefone interceptado pela polícia. O celular estava em nome de sua esposa.
Segundo o processo, em dezembro de 2013, durante apreensão de cocaína no Porto de Santos, foi constatado que o contêiner pertencia ao frigorífico, confirmando a associação de Gilcimar à quadrilha. Duas equipes de policiais foram mandadas no encalço de Gilcimar, mas ele não foi em contrado.
"Foi tentado contato com Gilcimar nesse mesmo dia através do celular de sua esposa, mas as ligações caíam diretamente na caixa postal. Segundo informações da JBS, Gilcimar jamais retornou ao local de trabalho".
Para justificar a prisão preventiva de Gilcimar, o desembargador Nino Toldo utilizou o mesmo argumento para a prisão de André do Rap.
"A manutenção da prisão preventiva dos réus é necessária porque permaneceram foragidos durante toda a instrução processual, o que denota a necessidade de se garantir a aplicação da lei penal, e suas prisões estão pautadas na gravidade concreta do delito, que envolveu grande quantidade de droga e uma estrutura criminosa reveladora da sua periculosidade e da probabilidade de reiteração delitiva. Lembro, ainda, que este feito estava pautado para julgamento na sessão de 12 de março passado e só não foi realizado em virtude de atitudes das próprias defesas", disse o desembargador.