DA REDAÇÃO. "Em suas cartas aos amigos, Monteiro Lobato mostrou-se eugenista e racista. Mas ele não escreveu que Narizinho era uma menina de 7 anos, com a pele da cor do jambo? E de que cor é o jambo? É mais escuro que uma ameixa! Como um autor racista constrói sua personagem mais importante descrevendo-a como uma menina negra? Por que ninguém, ao longo de quase 100 anos, leu direito essa frase escrita por ele? Narizinho é negra!".
A defesa de Pedro Bandeira deixou muita gente de cabelo em pé. Convidado a criar "Narizinho - A Menina Mais Querida do Brasil", publicado pela Editora Moderna, o autor foi acusado de eliminar palavras e expressões utilizadas por Lobato e ter suprimido trechos racistas.
Mas, segundo o escritor, sua preocupação foi deixar intocado o estilo do criador do Sítio do Picapau Amarelo, ressaltando aquela que foi a intenção de Lobato: escrever sobre o poder da imaginação das crianças.
"Eu tinha várias intenções para destrinchar a literatura desse autor de Taubaté, e procurei expor o protagonismo da personagem que origina tudo que de maravilhoso acontece no sítio. É ela que faz uma boneca falar, um sabugo filosofar, que se casa com um peixe e é ela que faz uma boneca casar-se com um leitão", afirmou Bandeira.
"Neste livro, obviamente inspirado por Lewis Carroll, Lobato criou a personagem à sua maneira. Carroll criou sua Alice genialmente descrevendo como se sonha, quando os acontecimentos desenrolam-se de roldão, sobrepondo-se uns aos outros. Lobato fez também Narizinho sonhar, mas ela sonha de modo mais ordenado. Ela sonha como se estivesse acordada! Ela sonha o que quer sonhar!", analisou o escritor.
DNA.
Admirador da obra lobatiana, Bandeira lembra quando lhe caiu nas mãos "As Reinações de Narizinho". "Eu lia da 1º à última página e em seguida virava o livro e recomeçava a leitura desde o início", contou ele na época com sete anos de idade. "Sei que a partir daí minha vida tem sido os livros, as histórias, a imaginação. Lobato foi minha formação".
Adulto, Bandeira cursou Ciências Sociais e passou a trabalhar com jornalismo. Mais tarde, ao trabalhar em uma grande editora de revistas, começou a escrever pequenas histórias para publicações infantis. "Foi quando fui levado pela sugestão de uma amiga, Marisa Lajolo, a escrever um livro infantil de minha própria vontade e inspiração. E imaginei que, se Lobato era o meu campeão, eu deveria escrever como ele", revelou. Inspirado em "A menina do narizinho arrebitado" (1920) lançou "O dinossauro que fazia au-au", sua primeira obra literária.
"Mas logo vi que um escritor não pode vestir o paletó de outro. E meu estilo era bem diferente do grande Lobato e daí parti com segurança para não imitar mais ninguém. Mas posso afirmar que Lobato faz parte do meu DNA literário"..