
Uma verdade inconveniente, mas necessária.
O padrão de beleza impõe principalmente às mulheres, mas não só, uma estética muitas vezes irreal e que pode levar pacientes a problemas de saúde decorrentes de intervenções estéticas.
No centro desse debate está a prótese de silicone, que se tornou quase obrigatória na busca pela melhoria da aparência. No entanto, há riscos pouco discutidos e que se perdem na utopia da busca pelo corpo perfeito.
De forma corajosa, ousada e inédita, a cirurgiã plástica Fabiana Catherino, de Taubaté, escreveu um livro para alertar os riscos do silicone, os quais ela conhece na própria pele.
A obra ‘Silicone: um padrão de beleza que adoece?’ traz informações consistentes sobre esses riscos e mira a conscientização da população, para alertar sobre o outro lado da busca incessante pela beleza.
Trata-se de leitura necessária para todos os públicos e que dá acesso a conteúdo muito pouco difundido. Não à toa, o prefácio do livro é assinado por um dos maiores cientistas do Brasil, o médico infectologista David Uip.
“Eu não levanto bandeira, porque não sou ativista. Eu simplesmente acredito que levanto um processo de conscientização. Fazer as pessoas terem acesso às informações e realmente levar a conscientização adiante”, diz a médica.
Silicone.
Graduada em Medicina pela Universidade de Taubaté e especializada em cirurgia geral, Fabiana Catherino fez especialização em cirurgia plástica na Santa Casa de Santos. Também é pós-graduada em perícias médicas e medicina legal na Santa Casa de São Paulo. Ela está instalada em Taubaté desde o ano 2000 e faz cirurgias e atende pacientes da região, de outros estados e até de outros países.
Mãe de gêmeos, a médica decidiu colocar próteses nas mamas após ter os filhos. “Era uma coisa do meu dia a dia, era algo que para mim estava ali de fácil acesso. Para mim silicone sempre foi algo positivo”, conta a profissional.
Acontece que os implantes transtornaram a vida da médica. “Adoeci por causa das próteses em muito pouco tempo”. Fabiana foi evoluindo com os problemas de saúde até que resolveu tirar as próteses e descobriu que eram elas que estavam lhe fazendo mal. “Retirei e realmente a minha vida mudou”.
Sentir o problema na própria pele levou a médica a estudar cada vez mais a fundo o tema. Ela buscou artigos, conteúdos sobre o assunto e optou por não colocar mais prótese. “Foi uma decisão, uma escolha, não julgo quem coloque, não julgo quem decide ter, só acredito que as pessoas têm que ter conhecimento para fazer as escolhas”.
Ela também notou um grande número de pessoas que tinham problemas como o dela e que não imaginavam que vinham das próteses. Isso culminou na decisão de aprofundar os estudos e publicar o livro. “É uma coragem muito grande. Tem que ter uma força muito grande para poder se expor dessa forma, porque tomar essa linha de falar sobre silicone é um assunto polêmico, um assunto difícil. Eu vou contra muita coisa do que a sociedade prega sobre a plástica”, admite Fabiana.
Coragem que lhe cobra um preço, muitas vezes em forma de perseguição, ataques e ameaças que ela já sofreu, e que exigiram a tomada de cuidados extras. Mas a ciência fala mais alto e Fabiana manteve-se firme no propósito de alertar as pessoas sobre os riscos do silicone, sem julgamentos.
“Apesar de toda a minha história, apesar de tudo o que eu sei sobre silicone, eu ainda assim faço um trabalho de conscientização e não de julgamento. É bastante corajoso mesmo por essa maneira.”
O livro.
‘Silicone: um padrão de beleza que adoece?’ é um livro bastante completo e profundo naquilo que se propõe, além de debater temas como a beleza, trazer histórias pessoais e dados científicos os quais poucos têm acesso.
Fabiana conta um pouco da sua história, fala sobre o silicone e todas as questões que estão ao redor desse produto químico usado nos implantes, os prós e contras, as doenças, os problemas conhecidos.
Ela também debate os motivos da busca pelo silicone, os porquês da procura pela melhoria estética, o quanto isso está vinculado ao físico e o quanto vai além disso, os questionamentos. A médica também narra um pouquinho da história beleza, da estética, não envolvendo apenas o silicone.
“Falo de Michael Jackson, que foi um exemplo clássico de buscar estética incessantemente. E aí eu vou desenvolvendo o tema nessa linha, para as pessoas pararem para refletir”, afirma a autora.
Fabiana ressalta que o livro não é uma afirmação, não é uma verdade absoluta. É uma visão da profissional, cientista e estudiosa do assunto. “Coloco algumas questões de ciência, o que ela mostra e o que tem comprovado até hoje, e deixo as pessoas com a interrogação do título para elas refletirem sobre como elas querem ver e entender a questão estética, a questão do silicone, a questão de como o padrão social hoje envolve a gente”.
Por outro lado, ela abre uma porta de conhecimento que estava fechada para a maior parte do público. “Até onde eu sei, o meu livro é o primeiro no mundo escrito por médico com esse tipo de conteúdo. No Brasil, o único livro escrito antes é de uma paciente minha que conta toda a jornada dela com o implante [‘Explante, explante meu’, de Mariana Fortti]. O meu livro complementa uma história de jornada com dados científicos e traz algo realmente inovador, onde as pessoas vão ter acesso à informação que elas não tinham em outros lugares”.
Beleza.
E a beleza, doutora? A cirurgiã plástica passou a enxergar a beleza de maneira diferente depois das vivências de consultório e da experiência com o livro? A resposta é sim.
“Eu posso dizer que entendo hoje que as pessoas vinculam silicone à beleza. Elas entendem que prótese de silicone são mamas e corpos bonitos. Eu discordo disso e faço as pessoas pensarem sobre isso”, responde.
Ou seja, prótese de silicone não é sinônimo de beleza, como faz crer o senso comum. E nem tábua de salvação de uma vida sem propósito. Bem viver é mais importante do que aparentar.
“O silicone não pode vir com essa premissa de que ele é certeza de que você vai ser aceito e se sentir aceito, de que você vai ter um corpo bonito, não é assim. O silicone pode ser bom e ter sido benéfico esteticamente para muitas mulheres. Mas muitas delas procuram não porque acham que a mama ficaria mais bonita, por exemplo, mas porque alguém contou para elas que a mama com volume seria mais bonita e não necessariamente ela precise disso”.
Por fim, Fabiana destaca o perigo de usar as redes sociais como parâmetro de beleza e de felicidade, como acontece enormemente em nossos dias. Os filtros dos aplicativos e os programas de edição de imagens tornaram-se “catálogos de sonhos”, quase sempre ilusórios.
“A pessoa usa filtros na imagem e se olha daquele jeito o tempo todo. Inclusive, quando ela procura uma cirurgia, ela tem a imagem do que ela vê no filtro, que não vai ser o que ela vai ver na vida real, mesmo sendo operada. Então, o filtro engana”, alerta.
“Então, isso preocupa sim, até porque é um bombardeio de imagens perfeitas o tempo todo, que você se olha e não se acha suficiente. As pessoas se frustram em olhar no espelho e falar: ‘Eu não sou o que todo mundo é’. E por isso essa busca desesperada muitas vezes até por coisas que essas pessoas nem queriam”, diz Fabiana.
Se depender dela e do livro sobre o silicone, a conscientização virá para quem se dispor a aprender com as páginas da obra, feita com muito carinho, esmero e preocupação com a vida alheia. Mesmo que soe clichê, a beleza é olhar para dentro e não reduzir-se ao externo.
“É um livro que abrange exatamente essa discussão, esse debate para médicos, pessoas leigas, mulheres e homens de todas as idades, para que essas pessoas parem para refletir o quanto essa busca incessante pelo que o outro deseja, não vai fazer você mais feliz. Que você tem que olhar para dentro e não para fora. Isso ainda é um caminho que não vai ser curto, mas não solto a mão de ninguém”, afirma Fabiana.
Que conclui: “Acredito que o livro vai gerar debate e vou tirar as pessoas da zona de conforto. Eu não sei se isso é chamado de polêmico, mas creio que de certa forma vai ser sobre isso”.
Boa leitura.
SERVIÇO
Livro: ‘Silicone: um padrão de beleza que adoece?’
Páginas: 282
Lançamento: sexta-feira, 14/3
Horário: 19h
Local: Livraria da Travessa, Shopping Villa Lobos, São Paulo
Venda: www.travessa.com.br
Saiba mais sobre a autora: www.instagram.com/drafabianacatherino