ACUSAÇÃO

Justiça manda produzir provas em ação contra Boeing por cooptação de talentos em S.José

Empresa americana teria contratado 400 pessoas em São José desde o começo de 2022; do total, 120 profissionais eram da Embraer

Por Da redação | 08/09/2023 | Tempo de leitura: 4 min
São José dos Campos

Divulgação

Gigante americana é acusada de cooptar irregularmente profissionais brasileiros
Gigante americana é acusada de cooptar irregularmente profissionais brasileiros

A Justiça Federal decidiu dar continuidade à ação inédita das indústrias aeronáutica e de defesa nacionais contra a política de contratação de engenheiros brasileiros da empresa norte-americana Boeing.

A ação civil pública cível é movida pela Abimde (Associação Brasileira das Indústrias de Materiais de Defesa e Segurança) e pela Aiab (Associação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil), que acusam a companhia americana de cooptar irregularmente profissionais brasileiros.

Na semana passada, a 3ª Vara Federal de São José dos Campos decidiu que o processo para descobrir se os americanos estão praticando concorrência predatória no polo aeroespacial da cidade, encabeçado pela Embraer e que inclui dezenas de empresas menores, deve avançar para a fase de produção de provas e testemunhos.

CONTRATAÇÕES

As entidades estimam que cerca de 400 pessoas foram contratadas pela Boeing em São José, desde o começo de 2022. Desse total, ao menos 120 profissionais eram da Embraer, que tem cerca de 3.500 profissionais no setor de engenharia, que seria o mais visado pela empresa americana.

A reclamação do segmento é que estão sendo contratados brasileiros de setores estratégicos para a soberania nacional, movimento que pode causar danos em programas e atrasar projetos fundamentais para os setores aeroespacial e de defesa.

Em setembro do ano passado, César Silva, presidente da empresa de engenharia Akaer, de São José e envolvida em projetos estratégicos para o país, como o do caça Gripen, queixou-se da perda de quadros para a Boeing. "Estilo de predador", escreveu ele em postagens nas redes sociais.

EMBRAER

“A Embraer tem perdido, em média, cerca de 10 profissionais altamente especializados por mês para a empresa norte-americana. São profissionais com muitos anos de experiência e de substituição impossível”, disseram Julio Shidara e Roberto Gallo, presidentes da Aiab e da Abimde, respectivamente.

Na segunda instância da Justiça Federal, as associações pediram a concessão, em caráter de urgência, de liminares para evitar o “agravamento da perda de capital humano altamente especializado pelas empresas de defesa brasileiras”.

A meta é limitar a contratação a 0,6% do corpo de engenharia de empresas estratégicas de defesa ou com contratos em projetos do tipo. Também previa R$ 5 milhões em multa para a Boeing, a serem repassados para instituições de ensino na área aeronáutica.

"É uma questão de soberania, não de protecionismo. A Boeing tem faturamento equivalente a 1/3 do PIB industrial brasileiro", disse Gallo.

LEIA MAIS: 'Fuga de cérebros': em ofensiva, Boeing já cooptou cerca de 120 profissionais da Embraer

GOVERNO

O governo federal mudou a postura diante da ação das entidades contra a Boeing. Provocado a se manifestar desde o ano passado, o Ministério da Defesa sustentava não ter interesse na causa, que envolve questões de geopolítica e do relacionamento do Brasil com os Estados Unidos.

No entanto, o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio e Serviços, comandando por Geraldo Alckmin (PSB), se manifestou afirmando que há risco de sangria de cérebros da chamada BID (Base Industrial de Defesa), o que provocou mudança também na postura da Defesa, em razão de o caso trazer risco à soberania nacional.

“Com a recente revisão de posicionamento, temos posição favorável do Ministério da Defesa e também do Ministério de Desenvolvimento, da AGU (Advocacia-Geral da União) e do Ministério Público Federal para que a Justiça Federal julgue, em caráter de urgência, os citados pedidos liminares”, apontaram os presidentes das duas entidades.

Para Shidara, é essencial a participação do Estado brasileiro na causa. “Não falamos mais da indústria aeronáutica, é sobre o talento brasileiro”.

SEM ACORDO

A Boeing já tentou comprar a área comercial da Embraer desde 2017, em negócio avaliado em US$ 5,2 bilhões. Na época, o governo, que tem poder de veto em decisões estratégicas da empresa, liberou o negócio.

Uma das principais vantagens para a americana no negócio, além dos produtos da Embraer, seria absorver o corpo de engenharia da fabricante brasileira, considerado um dos mais eficientes do mercado.

Mas o negócio não deu certo e acabou com ações na justiça. A Boeing alegou que a Embraer não estava cumprindo seus prazos na parceria e encerrou o processo. A brasileira acionou os americanos na corte de arbitragem de Nova York, buscando indenizações.

Em recente entrevista a OVALE, o CEO e presidente da Embraer, Francisco Gomes Neto, sem citar diretamente a Boeing, disse que a fabricante brasileira “se opõe ao processo de captura sistemática e contratação de engenheiros que atuam em projetos estratégicos para o país, ameaçando a soberania nacional e a Base Industrial de Defesa”.

OUTRO LADO

Procurada, a Boeing destacou a parceria com o Brasil: “Como empresa global, estamos comprometidos em atrair e desenvolver os melhores talentos nos Estados Unidos e em todo o mundo para atender à demanda global por nossos produtos e serviços aeroespaciais. Temos orgulho de nossos mais de 90 anos de parceria com o Brasil no fomento à inovação aeroespacial, sustentabilidade e segurança”.

E completou: “O país possui um rico histórico de aviação, universidades técnicas de ponta e um forte ecossistema de engenharia. Esperamos continuar contribuindo com a indústria aeroespacial no Brasil”.

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