INDÍGENAS

Câmara aprova Marco Temporal e reabre discussão sobre proteção aos indígenas no país

Projeto de lei aprovado em regime de urgência na Câmara dos Deputados recebe críticas por ameaçar integridade de terras indígenas no país

Por Da redação | 04/06/2023 | Tempo de leitura: 3 min
São José dos Campos

Divulgação

Indígenas no Brasil
Indígenas no Brasil

Na noite da última terça-feira (30), sob protestos de representantes de povos indígenas, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 490/2007, que legitima o chamado Marco Temporal.

O projeto nasceu de tese jurídica de que terras indígenas só possam ser demarcadas e convertidas legalmente em reservas se for comprovado que os povos originários já ocupavam ou reivindicavam o território na data da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro 1988.

Em 24 de maio, os deputados haviam aprovado o requerimento de urgência para analisar o projeto de lei. Com isso, a medida foi votada diretamente no plenário, sem passar pelas comissões temáticas da Câmara e, na prática, teve o trâmite acelerado.

O PL 490 foi aprovado por 283 votos a favor e 155 contra, com uma abstenção, e agora segue para o Senado. Caso também tenha o aval dos senadores, o texto vai para a sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que pode sancionar ou vetar o texto.

Na avaliação da ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, o projeto fragiliza uma série de direitos dos indígenas.

“Aprovado o PL 490 pela Câmara: um ataque grave aos povos indígenas e ao meio ambiente. Seguimos lutando pela vida. Ainda no Senado, dialogaremos para evitar a negociação de nossas vidas em troca de lucro e destruição. Não desistiremos!”, escreveu a ministra no Twitter.

Sônia Guajajara já se reuniu com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para tratar do assunto. A ministra fez um apelo para que os senadores rejeitem o texto.

Segundo a assessoria do Senado, Pacheco ressaltou que os indígenas “merecem respeito” e que pretende construir “uma grande concertação, que busque equilibrar todos os interesses”.

RURALISTAS

O projeto de lei votado na Câmara é originalmente de 2007. Inicialmente, ele tinha o objetivo de transferir do Executivo para o Legislativo o poder de demarcar terras indígenas. Contudo, o texto recebeu várias modificações.

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), afirmou que a votação no plenário ocorreu rapidamente por conta da previsão de julgamento do tema no STF (Supremo Tribunal Federal).

A Corte avalia uma ação envolvendo uma terra indígena em Santa Catarina e a decisão terá repercussão em todos os processos do tipo no país, incluindo o que for aprovado pelo Congresso. O julgamento deve ser retomado no próximo dia 7 de junho.

“Tentamos um acordo para que a gente não chegasse a este momento, mas o fato é que o Supremo vai julgar no dia 7 e este Congresso precisa demonstrar que está tratando a matéria com responsabilidade”, disse Lira.

“Nós não temos nada contra povos originários, nem o Congresso tem e não pode ser acusado disso. Agora, nós estamos falando de 0,2% da população brasileira em cima de 14% da área do país", completou o presidente da Câmara, segundo informações da Agência Câmara.

Na prática, a tese permite que indígenas sejam expulsos de terras que ocupam, caso não se comprove que estavam lá antes de 1988, e não autoriza que os povos que já foram expulsos ou forçados a saírem de seus locais de origem voltem para as terras.

Além disso, processos de demarcação de terras indígenas históricos, que se arrastam por anos, poderão ser suspensos.

O marco temporal também irá facilitar que áreas que não deveriam ter titularidade, por pertencerem aos indígenas, protegendo física e culturalmente povos originários, possam ser privatizadas e comercializadas.

O tema é do interesse da bancada ruralista e do agronegócio, que vêm pressionando desde o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro para a medida ser aprovada.

A comercialização responde diretamente ao interesse do setor ruralista, favorável à aplicação da tese. Os proprietários rurais também argumentam que há necessidade de garantir segurança jurídica ao grupo, e apontam o risco de desapropriações.

“O Marco Temporal é muito preocupante e traz danos aos povos indígenas, além de se tratar de uma anomalia jurídica, pois subverte atribuições de legisladores e desrespeita a Constituição, que garante o direito à terra para os povos originários. Esse PL 490 é um pacote de maldades”, disse Artionka Capiberibe, professora de antropologia da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), em live na internet.

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