OPINIÃO

Novembro negro


| Tempo de leitura: 3 min

Continuando a crônica anterior, neste mês de novembro muitas atividades foram realizadas envolvendo o tema, inclusive pelo que dispõe a Lei n. 14.759, de 21 dezembro de 2023, declarando o dia 20 de novembro “feriado nacional de Zumbi e da consciência negra” .

Interessante notar que, como exposto na crônica anterior, as ditas atividades eram realizadas no dia 20 de novembro, sem perder de vista que a proclamação de feriado no âmbito nacional fez parte do Projeto de Lei n. 1.550, de autoria do sempre senador Abdias do Nascimento propondo o dia como “Feriado Nacional” alcançando resultado 40 anos após, a partir da edição da Lei n. 14.759/23.

A luta por direitos e valorização cultural, pessoal, moral, de direitos humanos e etc não tem fim, até porque boa parte da sociedade detentora de privilégios não mede esforços para dificultar o reconhecimento e respeito a tais direitos, apesar de potentes debates e discussões se arrastando ao longo do tempo.

As ofensas e práticas racistas não têm fim ou mesmo limites, em especial no mercado de trabalho, no qual e, por exemplo, uma pessoa fez um teste diante da publicação de oferta de emprego para atividade muito específica enviando dois “currículos” semelhantes, diferenciando apenas o nome e a foto (uma com pessoa de pele escura e outra branca). Nem precisa perguntar qual deles foi chamado para entrevista né?

As mais deslavadas desculpas são de todas as ordens. Certa feita, em um jornal de grande circulação, publicou-se “precisa-se de motorista de cor branca”. Na oportunidade, comuniquei a autoridade policial que, de imediato, determinou que dois de seus servidores (um negro e outro branco) se dirigissem a agência de emprego. Lá chegando o negro disse que ali estava por conta do anúncio recebendo em resposta que a vaga já estava ocupada. Na sequência entrou o outro policial que,muito bem atendido, preencheu a ficha e documentos para entrevista. “Resumo da ópera”, o caso terminou sob alegação de que houve erro de digitação alegando que onde constou “cor branca” o correto era “conhecimento de banco”!

De mesmo modo aquele jogador que agrediu o colega, a desculpa foi de que o negro fora chamado de “malaco” e não de “macaco”. Brincam né?

Até para escrever sobre isso revolta, mas ignorar seria pior. Esse comportamento é real, atual, cotidiano! Nessa trilha, em uma chamada no Facebook para a Marcha da Consciência Negra/2025 daqui de Jundiaí, algumas pessoas destilando ódio e desconhecimento, escreveram que deveria ter “marcha da consciência humana”;“consciência branca”; disso ou daquilo; que “não existe desigualdade”, entre outros absurdos ...  comprovando a absoluta ausência de proximidade com a realidade, com os estudos e medo da perda dos privilégios que a cor da pele oferece.

Basta perguntar, justamente a essas pessoas se gostariam de viver, por alguns dias, na pele de uma pessoa negra que a resposta será um silêncio sepulcral. Tentem.

Ainda na crônica anterior mencionei o caso daquele menino com 12 anos de idade, vítima de ofensa racial em uma disputa de futebol, que a mãe o surpreende em crises de choro, sendo que, nesse caso, era apenas o choro pois que o número de suicidas e daqueles que tentaram contra a própria vida são alarmantes, no mais das vezes decorrentes de ofensas dessa natureza, exigindo atenção redobrada.

Diante desses quadros, discutir sobre o tema por meio de palestras, simpósios, convenções, marchas, debates nas escolas e em toda sociedade é de fundamental importância para que as pessoas se aproximem da realidade e, com isso, para que desigualdade seja reduzida e os danos minimizados, cujas providências – não me canso de afirmar – não teremos respostas em curto e médio prazo, uma vez que a maldade imposta contra as pessoas de pele escura estão introjetadas nas profundezas mentais.

Não me canso também de afirmar que a redução dessas maldades será conquistada a partir da implementação efetiva da lei que obriga o ensino da história africana, afro-brasileira e indígenaem todos os níveis de ensino e em todo o ano não apenas no mês.

Novembro passa. A Luta não.

Eginaldo Honório é advogado, doutor Honoris Causa e conselheiro estadual da OAB/SP

Comentários

Comentários