OPINIÃO

Europa ajuda natureza brasileira


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Embora não seja bem compreendida, a estratégia da Europa em relação à preservação da natureza brasileira é uma inspiração saudável. Aprovou-se o EUDR – Regulamento da União Europeia sobre Produtos Livres de Desmatamento, para vedar a comercialização de produtos oriundos de áreas desmatadas a partir de dezembro de 2020.

Essa providência levou em consideração a circunstância de o Brasil ter migrado da condição de promissora potência verde, na fase áurea entre 1970 e 2000, e rebaixado à situação de “Pária Ambiental”, quando seguidos retrocessos fizeram recrudescer o extermínio da cobertura vegetal.

Sete produtos principais foram o alvo europeu: soja, carne bovina, óleo de palma, madeira, cacau, café e borracha. Não deixa de ser importante que países mais desenvolvidos se preocupem com aquele de colonização mais recente e, portanto, menos civilizado, que não tem sabido cuidar do valiosíssimo patrimônio: a derradeira floresta tropical do planeta e a mais fabulosa biodiversidade encontrada na Terra.

A sanção é uma ferramenta pedagógica. No momento em que são cerradas as portas do mercado, o fornecedor vai saber que padrões do Velho Mundo não se compadecem com o extermínio da floresta impunemente praticado no Brasil.

O agronegócio ecológico já sabe disso. Muitos cultivos procuram se adaptar às melhores práticas. O bom agricultor tem noção da indispensabilidade de uma preservação ambiental para obter os melhores resultados. Outros praticam o “ogronegócio”, ou seja, uma ocupação indevida do solo, um verdadeiro saque ambiental e o resultado indesejável: a fabricação de desertos.

Os bons produtores têm uma sanção positiva: portas abertas de um mercado ávido por bens customizados, um café gourmet, fruto de cultivo esmerado e cada vez mais adequado à sofisticação de consumidores exigentes. Estes não dependem das velhas commodities, mas obtêm ganhos acrescidos mediante cultivo de espécies aprimoradas. Bons cafeicultores se preocupam com a certificação e com a sustentabilidade. Não participam do processo de “terra arrasada”.

O agronegócio brasileiro terá de se acostumar à prática da rastreabilidade. Saber onde foi plantado aquele produto, para que o consumidor tenha certeza de sua origem, inteiramente desvinculada da prática de crimes ambientais. 
 
As duas cadeias produtivas mais afetadas pela normativa são a do gado e da soja. No gado, a dificuldade de rastrear a origem dos bovinos, pois esses passam por muitos territórios desde a cria e a engorda até o abate. Ainda incipiente o investimento em programas e estratégias que auxiliem na certificação de origem do gado.

Quanto ao extermínio da floresta, o mundo assiste estarrecido ao noticiário de incessante atuação de cadeias de ilicitude, a criminalidade organizada, além dos incêndios derivados de combustão espontânea, diante da seca inclemente que se abate sobre o país que acaba com suas águas.

O Brasil elimina as suas riquezas, antes mesmo de conhecê-las. Não acordou para o valor da mata preservada, o potencial contido na destinação de suas espécies para a indústria farmacêutica, alimentícia, estética e de outras inúmeras possibilidades de utilização de um acervo que vai desaparecer antes de servir à humanidade.  

Embora ainda exista quem critique a política de restrições da União Europeia, é preciso refletir com ponderação. Que isso sirva para o Brasil tomar juízo e cuidar melhor do que é seu. Mas que também interessa ao restante da humanidade, porque ninguém se salvará sozinho, se a catástrofe derradeira vier a ocorrer, por nossa culpa, nossa máxima culpa.

José Renato Nalini é reitor, docente de pós-graduação e Secretário-Executivo das Mudanças Climáticas de São Paulo (jose-nalini@uol.com.br) 

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