OPINIÃO

A fragilidade dos laços familiares 


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Pai. Mãe. Filhos. Avós maternos. Avós paternos. Tios e tias. A casa da avó apinhada de gente. A criançada correndo alvoroçada no quintal. Onde foram parar todos eles na família do chamado fenômeno “vida em vídeo”? Publicado, visto – muitos likes, e não vivido.

Tudo bem. O tempo encurtou, as demandas diárias são muitas. O estilo de vida se transformou e quase não há tempo nem para cuidar da família nuclear. É nítido o desmantelamento dos laços familiares, mas dois casos chocantes ganharam as manchetes das mídias, na última semana. Uma mãe deixou a filha de três anos sozinha em casa para ir a um baile funk, e um casal que planejava viajar para o exterior, embarcou largando o filho de dez anos, no aeroporto sozinho, esperando um adulto que supostamente viria buscá-lo.     

Esses episódios, além de evidenciar a fragilidade dos laços familiares revelam um crescente e inquietante enfraquecimento da responsabilidade parental em nossa sociedade. O que é isso? Parentalidade é o conjunto de funções, responsabilidades, atitudes e vínculos que um adulto, seja pai, mãe biológico, adotivo ou cuidador, assume para garantir o cuidado, a proteção, a educação e o desenvolvimento integral de uma criança ou adolescente. 

Para os pesquisadores, Maccoby e Martin (1983), "parentalidade é o conjunto de atitudes, comportamentos e práticas que os pais utilizam para socializar seus filhos, incluindo o suporte emocional, a supervisão e o estabelecimento de limites".

Outro estudioso do tema, Belsky (1984) afirma que "o comportamento parental é determinado por um processo dinâmico que envolve características dos pais, da criança e do contexto socioecológico", ressaltando que a parentalidade é moldada por fatores pessoais, familiares e culturais. O conceito vai além do simples ato biológico de gerar um filho, pois envolve presença física e emocional, oferta de afeto, estabelecimento de limites, orientação moral e ética, estímulo ao aprendizado, promoção da saúde física e mental, e construção de um ambiente seguro para o crescimento. 

Presença. Eis a chave. Crianças aprendem pelo exemplo, imitando o que vê ao seu redor. Vera Iaconelli, diz que “criar filhos no século XXI requer presença ativa, conversas complexas, e capacidade de sustentar o desconforto emocional que a educação impõe”. Mas a sociedade, marcada pelo imediatismo, muitas vezes não prepara adultos para sustentar essas exigências. A cultura do prazer instantâneo e do “direito individual acima de tudo” enfraquece o compromisso intergeracional. Quando os pais deixam de exercer seu papel formador, a lacuna é ocupada pela escola, internet e, muitas vezes, pela rua, que educam de forma fragmentada, sem os valores e sem o afeto que apenas a família pode oferecer. Já o modelo ecológico de Bronfenbrenner reforça que “o desenvolvimento da criança depende de interações consistentes e de um contexto estável. Se a base familiar é frágil, todo o edifício da formação humana fica comprometido”. 

Voltamos à polêmica: fortalecer o núcleo familiar é essencial. A sociedade vem terceirizando sistematicamente a educação das crianças, negligenciando a criação, com baixo envolvimento afetivo, ausência de supervisão e falha na imposição de limites claros. Resultado? Adultos emocionalmente frágeis, inseguros, com o desenvolvimento cognitivo comprometido e dificuldade de tomada de decisão. A quem interessa tudo isso?

Rosângela Portela é jornalista, mentora e facilitadora
(rosangela.portela@consultoriadiniz.com.br) 

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