OPINIÃO

Falta verde na cidade


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Todas as cidades brasileiras têm carência de cobertura arbórea. Um estudo realizado pelo MapBiomas, uma rede ambiental que congrega Universidades, Organizações Não Governamentais e empresas de tecnologia, apurou que somente 6,9% das áreas urbanas das cidades brasileiras são cobertas por vegetação.

O total de áreas verdes urbanas é ínfimo, considerada a dimensão nacional. São 283,7 mil hectares, metade da extensão territorial do Distrito Federal, que já é diminuto, se comparado a Estados como Amazonas, Mato Grosso e Pará.

Não é preciso ser especialista em ecologia, nem botânico ou engenheiro agrônomo, para concluir que isso é insuficiente. As árvores são essenciais para a sadia qualidade de vida da população. Elas prestam serviço ecossistêmico gratuito e imprescindível. Pela ecotranspiração, elas absorvem gás carbônico e liberam oxigênio. Conseguem favorecer um regime equilibrado de chuvas, muito diferente das precipitações pluviométricas intensas, as grandes tempestades que acometem nossos municípios nos últimos tempos.

Áreas urbanas arborizadas garantem temperatura amena, que chega a dez graus menos do que as áreas áridas. A Sociedade Brasileira de Arborização Urbana recomenda ao menos quinze metros quadrados por habitante como proporção ideal para a sadia qualidade de vida. Já o levantamento feito pelo MapBiomas indica média de treze metros quadrados por morador urbano.

A situação chega a ser mais preocupante quando se constata que a distribuição é desigual. Ruas sem árvores tendem a ser muito mais quentes e a verticalização – construção de edifícios – faz com que se formem as “ondas de calor”. Elas matam mais do que as ondas de frio, de acordo com pesquisas levadas a efeito pelo grande médico Paulo Saldiva, da USP, hoje integrante da Cátedra Clima & Sustentabilidade junto ao IEA – Instituto de Estudos Avançados da maior Universidade brasileira.

É óbvio que “calor” não vai aparecer como “causa mortis” nos assentos de óbito das pessoas. Mas as altas temperaturas constituem o gatilho que vai deflagrar AVCs, acidentes vasculares cerebrais, embolias, enfartes, complicações diabéticas e outras comorbidades agravadas em virtude das altas temperaturas.

Toda a população precisa se convencer de que o plantio de árvores é uma urgência para todo o Brasil. É incrível que as pessoas que residem nas regiões mais desprovidas de arborização, venham a ser aquelas que mais resistam ao projeto de intensificação do verde. Comodismo e ignorância podem caminhar juntas nesse repúdio à melhor amiga da vida. Há quem reclame que as árvores estragam a calçada. Ou deixem cair folhas, o que obriga a várias varreduras no passeio. Já ouvi até que as árvores servem de refúgio para bandidos. São temas desproporcionais à importância e significado da arborização nas áreas densificadas.

Além da temperatura, a vegetação urbana regula o microclima, contribui para os sistemas de drenagem, principalmente em cidades impermeabilizadas e que servem prioritariamente ao automóvel e não às pessoas e serve de abrigo para a fauna, principalmente as aves. E o que dizer então da paisagem? A saúde mental se torna mais hígida em ambientes providos de exemplares arbóreos.

Uma administração realmente empenhada em propiciar melhores dias para o seu povo precisa investir na arborização e numa campanha permanente de conscientização da cidadania, para que a iniciativa do plantio, preservação e cuidado arbóreo faça parte da vida cotidiana e não precisa depender exclusivamente do Poder Público. A arborização é, ainda, um índice do grau civilizatório que uma comunidade atingiu.

José Renato Nalini é reitor, docente de pós-graduação e Secretário-Executivo das Mudanças Climáticas de São Paulo (jose-nalini@uol.com.br)

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