OPINIÃO

As duas caras de Tarcísio


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Ao sentar-se no banco dos réus, sendo julgado por sua participação na tentativa de golpe de Estado para se manter no poder mesmo após ter sido derrotado nas urnas, Jair Bolsonaro tirou Tarcísio de Freitas de sua zona de conforto.

Com a disputa de 2026 no horizonte e a possibilidade de alçar voos mais altos, o atual governador tem se desdobrado para encarnar diferentes personagens, em um esforço para se viabilizar como novo messias da extrema direita.

Ao mesmo tempo em que busca manter a imagem de político moderado, construída nos últimos anos, ele tem elevado o tom em pautas caras ao bolsonarismo, trazendo à tona um radicalismo que vinha tentando esconder.

Equilibrar-se entre esses dois universos parece demais até para o governador, que logo terá que decidir por um dos lados do muro. Minha aposta é que o radicalismo político que marca o bolsonarismo irá tragá-lo em um caminho sem volta.

Apesar de ser uma guinada em seu posicionamento, o governador tem se mostrado bastante confortável em seu flerte com a extrema direita. Tanto que me arrisco a dizer que, no fundo, Tarcísio e Bolsonaro são faces de uma mesma moeda, farinha do mesmo saco, como se diz no linguajar popular.

Por mais que, publicamente, insista que irá disputar a sua reeleição ao governo de São Paulo, Tarcísio vem construindo pontes em uma direção oposta, que o levará à candidatura pela Presidência da República. No entanto, a missão se torna impossível sem o apoio da extrema direita e a benção de Bolsonaro.

Para a primeira parte do desafio ele já colocou a solução em marcha, com a radicalização do seu discurso. Já a segunda, é uma incógnita e talvez dependa dos resultados de seus índices de aprovação pessoal, que estão umbilicalmente ligados à sua imagem de moderado. É aí que o conflito está posto.

Pesquisa da Quaest divulgada em fevereiro aponta que 53% das pessoas rejeitam o nome de Jair Bolsonaro para a Presidência. O que por si só já coloca em xeque a viabilidade eleitoral da sua cada vez mais distante candidatura e nos faz refletir sobre o impacto do seu apoio a outro candidato.

E o levantamento não mede o desgaste recente que Bolsonaro vem sofrendo com o seu julgamento no STF, o Supremo Tribunal Federal, e que deve aumentar ainda mais a sua rejeição.

Já a rejeição de Tarcísio no mesmo estudo é bem menor, de 32%. No entanto, tende a subir à medida que ele mergulhe cada vez mais fundo no bolsonarismo.

A realidade é que o governo Tarcísio é frágil. Bandeiras importantes para a sua base, como a segurança pública, acumulam fiascos. Em outras áreas fundamentais os retrocessos são imensos, como a redução do percentual obrigatório do orçamento para investimentos na Educação.

O grande legado que Tarcísio deixará será a venda do patrimônio público a preço de banana. Uma estratégia que favorece apenas os grandes grupos econômicos da Faria Lima, que acumulam ainda mais fortuna às custas da exploração de serviços essenciais para a população.

Esse modelo já se mostrou fracassado. França e Alemanha, para citar alguns exemplos, já começaram a fazer o caminho oposto e reestatizaram a gestão de água e esgoto após constatarem que a privatização piorou a qualidade do serviço e aumentou o valor das tarifas.

O Brasil não precisa disso. Já experimentamos a nossa dose de radicalismo com Bolsonaro na presidência e o gosto foi amargo. Pode ser que Tarcísio conserve um verniz diferente até 2026, mas o seu alinhamento com a extrema direita o tornará intragável.

Mário Maurici de Lima Morais é jornalista. Foi vereador e prefeito de Franco da Rocha, vice-presidente da EBC e presidente da Ceagesp. Atualmente, é deputado estadual e primeiro secretário da Assembleia Legislativa de São Paulo.

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