A cada partida de alguém que fez parte da História de nossa cidade, é uma porção dela que também se vai. A Jundiaí dos bons tempos é constantemente mutilada. A dinâmica existencial é surpreendente e por estarmos nela mergulhados, nem sempre a pressentimos. Só de quando em vez um golpe mais profundo nos faz refletir. O quão efêmera e frágil é a dádiva gratuita e milagrosa chamada vida. É preciso estar atento a essa inescapável circunstância que nos torna essencialmente iguais. Os mesmos, seres mortais, todos à espera do mistério.
Tais reflexões me envolvem quando lamento a morte de uma pessoa que aprendi a estimar e a admirar e que teve uma presença forte, embora discreta, em uma era já saudosa. Elena Cristina Pires Martins, que foi a esposa, companheira e inspiradora do prefeito Walmor Barbosa Martins, o apaixonado por esta cidade e que por dois mandatos a conduziu.
Ele era orgulhoso das qualidades da mulher a quem amou profundamente. Comentava a educação aprimorada que recebera, da mãe zelosa de filha única. Dona Augusta Blumer era severa na formação de sua joia. Foi esmerado o polimento daquelas qualidades que ornavam as moças da época. Além das prendas domésticas, o nível de perfeição na escola convencional e o apuro pianístico. Eleninha era uma concertista reconhecida.
Talvez o amor pela música a tenha produzido como ser harmônico. Era a contemporizadora, aquela que obtinha consensos, muito eficiente ao conter a impulsividade de Walmor, que era um apaixonado e podia, como alguém combativo e dinâmico, apresentar seus rompantes. Essa influência era eficaz porque discreta. Ela nunca se imiscuiu na administração, a não ser ao assumir um papel até então ausente nas gestões municipais. Eleninha iniciou aqui o ciclo das “Primeiras-Damas”.
Para isso contribuíram a sua paixão por Jundiaí, que defendia ardorosamente e o exemplo de Maria do Carmo Melão Sodré, a esposa do governador à época, Roberto Costa de Abreu Sodré.
Ambas representavam uma espécie de fidalguia nos modos e boas maneiras. Maria do Carmo pertencia a um clã tradicional, o equivalente à posição de Eleninha aqui em Jundiaí, uma cidade até então felizmente provinciana e que ainda não se tornara foco atrativo para pessoas que, por desconhecerem nossa história, nem sempre a respeitaram.
A presença da primeira-dama no setor assistencial conferiu novo patamar nas relações entre poder público e comunidade. Era a presença da suavidade generosa ao contemplar os menos favorecidos. Uma visão bem abrangente de que governar uma cidade é estar desperto para todos os seus problemas, principalmente aqueles que afligem os invisíveis, os excluídos, os carentes e perseguidos pela sorte.
Walmor ganhou bastante com o desempenho de Eleninha e a cidade ganhou ainda mais com esse casal que soube fazer a boa política. Aquela que não se faz sem uma dose consistente e consequente de humanidade.
A presença tranquila de Elena Cristina Pires Martins ao lado daquele dínamo chamado Walmor Barbosa Martins foi um fator de silenciosa revolução na administração pública desta terra de Petronilha. Walmor Júnior, Cristina e Luciana têm motivo para se orgulhar dos pais que tiveram. Ana Cristina, Isabela e Luana, dos fabulosos avós. E nós, jundiaienses natos, obrigação de cultuar quem se propôs a fazer pela cidade o que ela precisava e merecia, de maneira altruísta e inteiramente desvinculada de interesses subalternos.
Eleninha se foi, mas deixa um legado. Na trajetória terrena, um átimo perante a dimensão da eternidade. É isso, e só isso, o que realmente interessa.
José Renato Nalini é reitor, docente de pós-graduação e secretário-executivo das Mudanças Climáticas de São Paulo (jose-nalini@uol.com.br)
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