A homenagem que se prestou neste feriado é talvez a mais justa, na dedicação à reflexão sobre a inserção do negro na sociedade brasileira.
Não só pela forte contribuição na formação étnica de nosso povo, como também pela grande influência cultural, arraigada em todos os seus segmentos
Houve um poeta, que, pela sua obra, sensível ao grave problema social de seu tempo, ousou denunciar, veemente a crueldade da escravidão. Não. Não era negro. Mas sentia a alma negra em todos os seus sentimentos. Jovem, culto, garboso, jamais se influenciou pela fidalguia sem fé.
Castro Alves, poeta baiano, estudante de direito do histórico Largo de São Francisco, fez em versos o mais famoso poema abolicionista de seu tempo. Retratou em suas palavras condoreiras, a verdade escondida na infâmia e covardia de muitos seres humanos. Em “ O Navio Negreiro”, sua obra imortal, escrita há mais de 140 anos, podemos sentir toda a saga deste povo sofrido, angustiado e escravizado.
No Brasil surgiram expoentes que marcam em letras douradas a nossa história.
A heróica resistência dos ideais negros de Zumbi dos Palmares, nosso maior escritor, Machado de Assis, tem suas raízes fincadas na raça. Na arte do futebol, Leônidas da Silva, o homem borracha, assombrou o mundo com seus gols de bicicleta e abriu o caminho real para o nosso maior rei, o grande e inquestionável Pelé. Um humilde faxineiro, Joaquim Barbosa Gomes, pelo saber jurídico, tornou-se o primeiro ministro negro da nossa mais alta corte, o Supremo Federal, e aplicou o primeiro mandamento de nossa Carta Magna – todos são iguais perante a lei.
Na música são incontáveis. Reservo-me num abraço saudoso ao querido cantor Jamelão. Nas artes plásticas, Antonio Francisco da Costa Lisboa, o genial Aleijadinho.
Em Jundiaí, a forte presença da comunidade negra está registrada num dos seus maiores patrimônios, o secular Clube 28 de Setembro.
Quem viveu a vida social da cidade, por certo também ali teve momentos memoráveis e inesquecíveis. A praça da Bandeira, na Petronilha Antunes, sempre foi o jardim florido, que ornamentava a fachada do tradicional prédio. Festas tradicionais, eventos sociais e grandes casamentos da sociedade jundiaiense estão registrados nas páginas do seu livro de ouro.
Talvez o sofrer, a injustiça e a dor dos seus antepassados fizeram esta gente dar mais valor às coisas mais belas e mais simples da vida, que muitas vezes, em nossa miopia, não conseguimos enxergar. A solidariedade mútua, a alegria de viver, a doce esperança, a fé inabalável e o amor, simplesmente o amor.
Todos neste feriado, por certo, curtiram todos os amores, os sabores, o encantamento de uma cultura, que ganhou todos os cantos deste imenso Brasil.
Talvez a homenagem que se presta neste dia não pague toda a dívida que nosso País tem com esta gente. As flores do reconhecimento, muito provavelmente, estão chegando tarde.
Mas para todos nós, que acreditamos em Deus, jamais serão seres humanos diferentes. Esta sim, a indiferença, é a mais cruel das ingratidões.
Guaraci Alvarenga é advogado (guaraci.alvarenga@yahoo.com.br)