OPINIÃO

Pulmão e o compasso da vida


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Vamos começar o nosso artigo com uma pequena experiência fisiológica?  Prometo que ela é bem simples e divertida. Vamos lá?

Com os olhos abertos mesmo, se concentre no seu ritmo respiratório. “Puxe” o ar para dentro do seu tórax e perceba como as costelas se expandem, algumas delas se movendo como se fossem “alças de balde”, abrindo-se para os lados do corpo. “Solte” o ar e sinta como elas voltam-se para o corpo e como a sua barriga “encolhe”, bem na altura do estomago. Esse é o movimento de um musculo chamado diafragma e é um dos principais responsáveis pelos movimentos respiratórios. 
 Repita o processo, sem pressa e com atenção, sendo cada vez mais lento, principalmente na parte expiratória. Deixe o ar sair pela boca, como estivesse enchendo uma bexiga delicada como uma bolha de sabão. Deixe o ciclo acontecer umas cinco vezes.

Agora, coloque a mão direita no lado esquerdo do tórax, um pouco para o lado, abaixo da linha do mamilo. Preste atenção. Pode demorar alguns segundos, mas irá perceber o ictus cordis, que é o impulso do pulsar no seu coração, sendo transmitido para o tórax pelo toque da ponta do miocárdio neste local.

Note o ritmo. Com o tempo, irá senti-lo mesmo sem colocar a mão no local para aumentar o tato. Perceba que ele ocorre independente da sua vontade: já estava lá, mesmo antes de percebê-lo, você agora só é consciente dele por outros sentidos, no caso, o tato.

Agora vem o “pulo do gato”: note que, enquanto você se atentava no seu coração, a sua respiração, com todo o ritmo e movimento dela, continuou a se processar, independente da sua vontade, até o momento de agora, quando eu chamei sua atenção para ela, novamente.

Agora, note que, se você quiser, pode dar uma pausa neste ritmo respiratório: basta reter o ar, em qualquer ponto do ciclo. Ou aumentar essa frequência. Claro que, quando você direcionar sua atenção para outra coisa, o ritmo respiratório vai voltar para o normal.

Essa é uma das dádivas da nossa respiração: ser ao mesmo tempo “voluntária” e “involuntária”. Isso quer dizer que duas “divisões” do nosso corpo podem a utilizar: o consciente (quando nos atentamos a ela) e o inconsciente. Este último reflete muito a fisiologia geral do nosso organismo e, entre outras coisas, nosso estado de humor e as emoções que estamos sentindo.

Quando estamos com medo, por exemplo, nossa respiração costuma ser “rápida e curta”, como se estivéssemos evitando nos mexer para respirar. Isso é uma defesa biológica, para que não chamemos a atenção enquanto procurarmos evitar o que nos causa medo.

Podemos usar isso a nosso favor, pois, assim como as emoções e a transição entre elas transformam o nosso corpo tal como a nossa respiração nos mostra, o processo pode ser usado no sentido contrário: controlando conscientemente a nossa respiração podemos influenciar a nossa fisiologia, mesmo a involuntária (ritmo cardíaco, por exemplo) para assumir estados que desejamos, para uma “calmaria” ou mesmo uma excitação.

Por conta disso que várias tradições orientais elegem o treinamento respiratório como a base dos seus métodos meditativos e mesmo de cura e promoção da saúde.

Alexandre Martin é médico, especialista em acupuntura e com formação em medicina tradicional chinesa e osteopatia (xan.martin@gmail.com)

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