OPINIÃO

A cidade precisa de você


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E você precisa dela. O munícipe não pode ser mero espectador da realidade urbana. Tem de participar de tudo aquilo que interessa para aprimorar o convívio e melhorar a qualidade do município em que mora.

De acordo com o censo do IBGE de 2022, quase 70% da população brasileira mora em zona urbana. Mas será que todos esses brasileiros conhecem os problemas locais?

O que você acha da rede elétrica, da coleta de resíduos sólidos, da reciclagem, da compostagem? Sabe se sua cidade tem água para os próximos vinte anos? Como está o saneamento básico, o sistema de esgoto e de drenagem? Quais os bairros em que as pessoas vivem precariamente e correm risco de vida e de perda de seus patrimônios, se houver uma catástrofe climática?

É comum a reclamação contra o governo, contra todas as suas exteriorizações. Menos comum é a participação na gestão municipal. E participação é a palavra de ordem para os brasileiros, cujos municípios são entidades federativas, ao lado da União e dos Estados. O constituinte de 1988, constatando a desilusão de grande parte da população com o sistema representativo, acenou com uma Democracia Participativa.

E a USP está ajudando a cidadania a acordar para essa necessidade urgente. O grupo “Cartilha da Cidade”, do Instituto de Arquitetura e Urbanismo da USP em São Carlos, criou um jogo “Agentes Urbanos e a Cidade Participativa”. É uma simulação com abordagem lúdica para propiciar discussão a respeito de questões urbanas e provocar reflexão sobre o espaço que habitam os urbanos.

A proposta partiu da constatação de que são inúmeros os munícipes que desconhecem sua cidade e seus serviços. O jogo simula situações-problema reais e coloca os partícipes no papel dos agentes urbanos. Cada qual com interesses específicos. Por exemplo: um edifício em que parte da população quer transformá-lo em habitação social, o empreendedor quer ali fazer um shopping e a Prefeitura sugere uma destinação cultural.

É muito difícil conciliar propostas antagônicas, daí os conflitos que surgem, muitos deles bem complexos. O objetivo é estimular um diálogo respeitoso, sem a polaridade que contaminou o Brasil dos últimos anos e a adoção de soluções que não firam qualquer dos protagonistas envolvidos. É uma tentativa, porque nem sempre se consegue conter a ira, a raiva, o ressentimento e a intolerância. São produtos abundantes no convívio, enquanto que a busca da paz, da harmonia, do respeito e da ética são ingredientes em falta.

Esse exemplo da USP em São Carlos poderia servir de inspiração para outras cidades. Já se consolidou o conceito de direito à cidade, que inclui a necessidade de se pensar e de participar do projeto municipal. O gerenciamento do município é obrigação da Prefeitura, mas a chamada de munícipes para legitimar a opção por uma dentre as muitas alternativas é algo que o mundo civilizado adota e apoia.

Um bom começo é fazer as escolas municipais incluírem no ensino-aprendizado questões locais. Ensinar a história local, a origem da cidade, os seus herois, as suas tradições, a sua cultura e os seus desafios. Para fazer com que os educandos se sintam pertencentes a um organismo vivo, que não começou com o nascimento deles, mas que foi resultado do esforço, trabalho e sacrifício de muitas gerações.

Um dos estímulos utilizados durante o jogo, é a consulta à cartilha “História da Cidade Rios Perenes e seus Agentes Urbanos”, material de apoio que apresenta a cidade fictícia de “Rios Perenes”. A criatividade de professores e também dos alunos, nestas gerações que já nasceram com chips e conhecem algoritmos como ninguém, pode criar outras estratégias de incentivar a participação da cidadania nos destinos de sua cidade.

A cidade é de todos. Não é de grupos. Não é dos poderosos. Não é espaço particular ou privado. Quem não participa não tem condições de criticar o que se adotou como política pública, a que se chegou a despeito de sua omissão.

José Renato Nalini é reitor, docente de pós-graduação e Secretário-Executivo das Mudanças Climáticas de São Paulo (jose-nalini@uol.com.br)

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