Velho político vencedor, em todas as eleições que participava, trazia no bolsinho do paletó, onde deveria ser colocado um lenço de seda, um pequeno lembrete manuscrito. Guardava-o com carinho, para jamais esquecer, o ensinamento de um grande mestre, a quem tinha tamanha admiração. Evidente que os tempos eram outros.
Toda esta massificação de promessas com os candidatos não se cansando de dizer que vão cuidar da saúde, segurança, educação, moradia e transportes. Claro está, que todos conhecem os problemas, mas alguns deles não se invocam em um mote inovador a ser apresentado, para ganhar de imediato o disputado voto. A maioria dos candidatos ataca e denigre os adversários, mesmo os mais íntegros e bem intencionados, através da pobre genialidade dos seus rotuladores de plantão. Mas guardadas as devidas proporções, o caminho ainda, para se buscar o voto é a empatia pessoal com o público, a afinidade do aperto de mão, o contagiante sorriso largo, a cortesia da humildade em pedir. Mais que tudo isso, a disposição para vencer. Não se acomodar. Não ter cansaço, labutar o dia a dia, não faltar aos compromissos, telefonar para os amigos e abraçar a todos.
Esta velha raposa política contou-me, então, que participou de uma dura campanha eleitoral. Teve numa ocasião, um dia singular. Chovia e fazia muito frio. O tempo era desgastante. Tinha que cumprir a agenda. Encontros políticos em diversos bairros. A cansativa agenda à noite. O atendimento aos populares. A militância não poderia desanimar. Com a entrada da madrugada, fatigado, recostou-se no banco do veículo. Tinha vencido mais um dia. Seu agendador de campanha, no entanto, o alertou que faltava mais um compromisso. Mas como? Teria que tomar um café na residência de um eleitor, num bairro do outro lado da cidade. Estava atrasado. Pensou. Já era tarde. Frio e chuva que não paravam. Tinha que atravessar toda a cidade, No bairro distante, o asfalto não havia chegado, poderia até atolar o veículo. Deixaria o encontro para outra oportunidade. Até porque era um único voto. Aí se lembrou do bilhete, guardado no paletó. Retirou com cuidado, protegendo-o para não molhar. Releu seus dizeres; “voto tem que se buscar até o último eleitor”.
Deixou o cansaço de lado, reuniu o que tinha de forças e foi ao encontro marcado. Chegando ao endereço, o morador, apesar da hora adiantada, ainda o aguardava. Foi recebido com as honras da casa humilde. Conduziram-no até a cozinha. Foi servido um café e saboreou uma fatia de bolo de fubá, guardado para a ocasião. Despediu-se com um forte abraço. Chegou o dia da eleição. Apuração dos votos. Venceu por uma contagem mínima. Recordou-se então daquele dia duro da campanha, a madrugada chuvosa e fria, o cansaço físico e a fatia do bolo de fubá. Por certo tinha ganhado a eleição com o voto do morador do bairro distante. Acariciou o bolso do paletó, onde escondia o velho segredo, do sábio conselho para se ganhar uma eleição: “voto tem que se buscar até o último eleitor”.
Guaraci Alvarenga é advogado (guaraci.alvarenga@yahoo.com.br)