OPINIÃO

Trança Nagô


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Através da professora de Trança Nagô na Casa da Fonte, Marcilene Moraes da Silva, a conhecida Nega, que se coloca sempre à disposição para partilhar seus conhecimentos, assisti a um vídeo, que muito me encantou, da professora Floresta, sobre Tranças Africanas e sua Linguagem de Fuga no Brasil.

Inicia-se assim: “Mais que um simples penteado, as tranças nagô guardam o poder e a resistência de um povo que lutou para se libertar”.

A denominação é referente aos africanos de origem nagô, ou seja, vindos da Costa da Mina, região onde Gana, Togo, Benim e Nigéria estão hoje localizados. Os nagôs eram oriundos de várias etnias entre elas os jejes, iorubás, haussás, mahis e mandingas, de acordo com o site MultiRio.rj.gov.br.

Diferentes tranças de acordo com a etnia e também com o estado civil, a condição social. Na morte, no casamento ou na coroação de rei e rainha existiam ainda distinções no cabelo.

Com o tráfico de escravos, rainhas e reis capturados, raspavam a cabeça, apagavam sua identidade, tiravam-lhes o direito à vida livre e às suas características culturais. Ademais, aqui sofriam, além da violência física, a dos preconceitos, como acontece até hoje. Para muitos, o negro não era gente e seria vergonhoso fazer qualquer coisa que eles faziam.

Os cabelos cresceram e voltaram a fazer tranças. Os brancos não deram importância alguma. Para eles não simbolizava “perigo”; perigo para deixar de explorar gente.

Através das tranças, os africanos abriram uma brecha para conhecer quais as tribos estavam no Brasil e para a liberdade. As mais utilizadas eram as da tribo Nagô. Nas tranças, aos que desejavam fugir, colocavam mensagens e também, idealizavam, nos espaços vagos delas o caminho para um quilombo. Tornavam-se mapas de autonomia. Nas maiores, encaixavam sementes de feijão, milho, dentre outras, para plantar no local em que fixariam moradia.

Com sua cultura e tradição, fortaleceram a resistência à escravidão.

Desconhecia esse fato, que é tão forte e mostra a inteligência, a sensibilidade, a determinação do povo negro, que não desistiu, mesmo diante das atrocidades da escravidão, de recuperar sua identidade, negada por gente cruel, embora até hoje possua sequelas dessa barbárie no Brasil.

Fez-me um bem maior, após saber da origem da trança nagô, ter na Casa da Fonte, onde trabalho, através do curso da Nega, o sinal de esperança de uma nação que sangrava em nosso país. E ainda sangra no olhar e reação de pessoas com alma e coração nanicos.

Impossível não se recordar do poeta dos escravos Antônio Frederico Castro Alves (1847-1871) com “Navio Negreiro”. Cito os versos em que demonstra seu desapontamento diante da nossa bandeira manchada pelo tráfico de escravos: “Auriverde pendão de minha terra, / Que a brisa do Brasil beija e balança, / Estandarte que a luz do sol encerra/ E as promessas divinas da esperança... /Tu que, da liberdade após a guerra, /Foste hasteado dos heróis na lança / Antes te houvessem roto na batalha, /Que servires a um povo de mortalha! /Fatalidade atroz que a mente esmaga! /Extingue nesta hora o brigue imundo/ O trilho que Colombo abriu nas vagas (...) Mas é infâmia demais! (...)/ Levantai-vos, heróis do Novo Mundo! /Andrada! arranca esse pendão dos ares! /Colombo! fecha a porta dos teus mares!”

Maria Cristina Castilho de Andrade é professora e cronista (criscast@terra.com.br)

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