Segundo domingo do mês de agosto todo carinho aos nossos pais. A homenagem carregada, nestes tempos, de tantas motivações comerciais na mídia, traz emoções mais íntimas que ainda se atropelam dentro de mim. Sim, deixai que meu coração e meu pensamento voem no tempo, fuja um pouco da hora risonha desta convivência, penetre num doce passado distante e como num vídeo tape, traga a imagem de um senhor sereno e devotado à família. Deus sabe com que sacrifícios que este homem abdicou de bens materiais para dar aos filhos. Criou, educou e nos fez homens. Naquela pequena cidade do interior. Corria o ano de 1957. Garoto que não chegara aos dez anos de idade. Na pequena rua de terra, o local das brincadeiras de criança.
A bola de capotão rolava na ilusão de um gramado de um campo de futebol. No olhar do devaneio, o alegre brincar de um sonho distante. Uma partida de craques , num grande estádio. Ligava o rádio, me encantava com que o locutor narrava. Ele percebeu.Numa noite de sábado, mandou-me dormir bem cedo. Tinha que acordar logo de manhãzinha. Vestiu-me com a melhor roupa, sapatos de ir para a igreja, meias brancas, calça comprida. Segurou firme a minha mão. O relógio da estação ferroviária marcava 6 horas.
O trem partiu com uma surpreendente viagem, um descobrimento ao menininho humilde. Quantas cidades. Jundiaí, a cidade das antenas. Mal sabia que iria tanto amar esta terra. A chegada. Estação da Luz, na Capital. Tanta gente. Tanta novidade. Continuava surpreso. Não lhe perguntei aonde iríamos. Nem ele me havia dito. Sua mão carinhosa, não me largava. Entramos num ônibus. Vale do Anhangabaú. O edifício Martinelli, O cruzamento da Avenida São João com a Ipiranga: “alguma coisa acontece no meu coração”. A Avenida Pacaembu. Corredor de duas torcidas, em tempo de paz. Bandeirolas e distintivos do time do coração, marcando território. O arquitetônico portal do estádio do Pacaembu. Aglomeração na entrada. Avisou-me para acelerar o passo. Tínhamos que encontrar um lugar no meio da arquibancada, para melhor ver o espetáculo. A entrada dos jogadores pelos túneis dos vestiários. O espocar do foguetório. Luzes e cores.
Era verdade. O narrador esportivo de rádio, não fantasiava o espetáculo. Início da partida. A cada lance, um aperto de emoção. O gol. Não vi. Os torcedores da frente se levantaram primeiro. Mas não precisava ver. Eu já o tinha feito antes, nos meus sonhos. Fim de jogo. Nossas mãos dadas pareciam coladas. Paramos numa lanchonete. Pela primeira vez apreciei o famoso “bauru”. Uma descoberta deliciosa, Retornamos pelo mesmo velho trem. Dentro do vagão, encostei minha cabeça no seu colo e adormeci. Ao acordar, em meu êxtase, estava confuso. Sonho ou realidade. Hoje, passados tantos anos, ao tentar reverenciar a memória de meu saudoso pai, lembrei-me deste inesquecível episódio em minha vida. Não pelos acontecimentos vividos, à luz de meus primeiros passos fora de casa, mas sim pela doce imagem viva, das mãos dadas.
Lágrimas furtivas escapam de meus olhos, com gratidão e o reconhecimento, ao meu saudoso “velho”, por nunca ter deixado de segurar minhas mãos. Aos meus filhos Daniel Alvarenga e Thais Alvarenga não me tragam presentes neste domingo, tragam tão somente os netos Leticia e Gabriel, netos que são os melhores presentes que Deus me ofereceu. A benção meu pai.
Guaraci Alvarenga é advogado (guaraci.alvarenga@yahoo.com.br)
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