OPINIÃO

Jundiaí afundou Mauá?


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Mauá criou e custeou a Estrada de Ferro Santos a Jundiaí. Faliu e foi desacreditado. Mas reabilitou-se, conseguindo saldar todos os débitos, coisa que os falidos de hoje nunca fazem.

Em resposta à indagação: não! Jundiaí não fez Mauá falir. Mas ajudou. É ele mesmo quem o afirma, em sua autobiografia. Menciona a abertura da SJ como a quarta causa para o seu desastre pessoal. Fala em sua "desgraçada intervenção para dotar a Província de São Paulo com a estrada de ferro de Santos a Jundiaí", pois era então predominante a descrença no projeto. Para ele, pouco sensata a ideia de construir uma estrada de rodagem paralela à ferrovia.

Custeou os estudos iniciais, os projetos, os levantamentos, o trabalho de campo, a abertura de picadas, para comprovar a possibilidade de permitir que locomotivas e vagões vencessem a Serra de Cubatão e chegassem a Jundiaí. E que daqui levasse a produção agrícola do interior até o porto de Santos.

Tenta explicar como é que a abertura de uma ferrovia pode influir nos destinos da Casa Mauá. Mas nada mais simples nem de mais fácil demonstração. Os empreiteiros da estrada de ferro, acolhendo as instigações de Mauá, tinham um pessoal enorme empregado nessa construção. Para competir com a ferrovia, a abertura da estrada de rodagem, que era custeada pela Província, inflacionou o preço do trabalho ou o aluguel dos braços.  
   
Isso fez com que aumentasse também o custo da ferrovia nos quatro anos que ainda decorreram, até que ela ficasse pronta ou suficientemente adiantada. Algo em torno de dois mil contos a mais, o que fez ruir por terra os cálculos elaborados por Mauá. Foi ele quem, pessoalmente, arcou com os prejuízos decorrentes dessa manobra.

Acumulados os juros de seis em seis meses, sobre o capital que foi se dilapidando, devido à interferência dos poderes públicos provinciais, a fortuna corroeu o potencial econômico financeiro de Mauá, levando-o à bancarrota. A Santos a Jundiaí contribuiu, portanto, para o seu fracasso.

Não é demais lembrar que Mauá creditou ao Judiciário boa parte de seu insucesso. Colheu revezes pela oscilação da Justiça, a qual, desde então, não se preocupava com o anseio pela chamada "segurança jurídica". O que Mauá afirmou em sua autobiografia poderia ser dito hoje: "O primeiro dever dos poderes públicos, que constituem a organização social de qualquer país, é garantir a distribuição da mais reta e imparcial justiça. Sem isso, a propriedade e os direitos dos habitantes, que acreditam viver à sombra de instituições, não estão garantidos e a existência da própria organização social adotada corre perito iminente".

Várias vezes - e com razão - se mostrou escandalizado em relação às decisões judiciais. Chegou a debater na Câmara, contra Nabuco, que era seu colega e amigo. Mauá agrediu violenta e diretamente os magistrados do Tribunal do Comércio, nomeados por Nabuco e favoráveis a ele num pleito em que ele era parte. Seu clamor ecoou. Em 15.9.1861, foram "removidos! Os juízes do Tribunal do Comércio, ato de Sayão Lobato, então ministro da Justiça. Um dos punidos, o juiz Albino Barbosa de Oliveira, em suas memórias, extravasa sua ira contra Mauá.

Diante de decisões contraditórias ou injustas, Mauá chegou a propor na Câmara a "aposentadoria forçada" dos magistrados, o que leva a história a atribuir-lhe influência sobre Sayão Lobato, quando ele fez a pena incidir sobre juízes do Tribunal de Comércio.

Tudo igual no Brasil de sempre. Só mudam os nomes.

José Renato Nalini é reitor, docente de pós-graduação e Secretário-Executivo das Mudanças Climáticas de São Paulo (jose-nalini@uol.com.br)

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