Não, este artigo não trata da atualidade, nem de futuro próximo ou longínquo, mas sim de um passado ilusório que nosso país entrou, parecia ter um futuro espacial fantástico, mas o que conquistamos foi por grande esforço dos envolvidos.
Meu colega do INPE, Marcelo Petry, lembrou que na década de 1950, o Brasil já desenvolvia foguetes e até especulavam lançar um gato ao espaço, que retornaria vivo... Há o jornal Última Hora de 18/12/1958. Há um livro disponível para o kindle: "Coronel Lage: o mestre dos foguetes" de Bernardino Coelho da Silva.
O Coronel Manoel dos Santos Lage foi um pioneiro, professor da Escola Técnica do Exército (ETE), vaga, aliás, conquistada em 1950, após construir com os formandos um foguete bem sucedido. O foguete foi denominado F-114 R/E, um tubo de 114 mm por 1,8 m. Em 1952, ele foi enviado a Universidade de Michigan aperfeiçoar seus conhecimentos.
Em 1957, foi a vez do F-114 DE, maior, com dois estágios e que atingia 30 km de altitude (o anterior ia até 22 km), com a colaboração do major Aldir Maurício que fora à Paris estudar e estagiar em foguetes, conforme o Jornal do Brasil de dezembro de 1957.
Então veio Foguete Sonda 360-BD, chamando internamente de Foguete Sonda I EB (Exército Brasileiro). Não confundir com o homônimo posterior da Aeronáutica, criado em 1965. O Sonda I EB tinha 3,95 m, 59 kg e alcançando 70 km de altitude, com carga útil de 4,5 kg.
Em 1958, fabricaram outro para alcançar 120 km de altitude, com um foguete de um único estágio com diâmetro externo de 400 mm, comprimento de 4,3 metros e massa total de 350 kg, incluindo a carga útil de 30 kg composta de um gato chamado Flamengo, e os experimentos. O foguete foi apelidado pela imprensa de Félix I, devido ao desenho animado. Lages convencera os cientistas Cesar Lattes e Carlos Chagas Filho a colaborarem com a iniciativa. Mas a imprensa e os protetores dos animais... Finalmente, o general Mendes, por motivação escusa, acabou com o projeto.
Em 6 de janeiro de 1968, A revista O Cruzeiro anunciava que na semana retrasada, a Austrália colocara em órbita seu primeiro satélite artificial, juntando-se à França, Inglaterra, Itália e Canadá. Japão e Alemanha estavam próximos de conseguir e o Brasil anunciava também o seu, para 1971...
O Brasil começou de verdade o projeto do Satélite de Coleta de Dados em 1985, ano que entrei no INPE. Satélite que envolveu grande esforço nacional e pessoal dos envolvidos, com um resultado espetacular, em 17 de junho de 2023, o SCD-1 sobrevivera mais que o Geotail da NASA e tornara-se o satélite com aplicação de observação da Terra mais longevo, que mais tempo operou. E continua operando.
Então, por que fazemos pouco, o que deu errado? Por que fomos ultrapassados até pela falida Argentina? Porque temos uma maioria de políticos que não enxergam ganhos indiretos, a pandemia mostrou a pequenez de nossa nação. Para quebrar esse paradigma, precisamos que os políticos "terraglobalistas" façam mais, lutem vigorosamente, convençam melhor, esse é o único caminho para tornar o Brasil uma potência relevante.
Mario Eugenio Saturno é Tecnologista Sênior do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e congregado mariano (mariosaturno@uol.com.br)