O moço veio da Bahia, de um lugar distante de cidades turísticas. O seu sertão tinha belezas, porém, mais do que isso, a mãinha e o painho que lhe tinham afeto. A lugar era de extrema pobreza e exploração. Estudou pouco, porque foi ajudar na roça. Acumulou pensamentos de tentar um outro lugar. Quem sabe ganharia um pouco de dinheiro para ajudar a família ou trazê-los para cá. Criou coragem e veio. O Estado de São Paulo continua sendo um atrativo, embora tantos retornem com mais dificuldade do que quando chegaram.
Numa cidade vizinha se estabeleceu. Conseguiu com dificuldade um emprego com bastante desgaste, mas era sertanejo e como escreveu Euclides da Cunha, "O sertanejo é, antes de tudo, um forte".
Nestes três primeiros anos, o salário permitia pagar a pensão e se alimentar. O celular o aproximava dos seus. Tornou-se, de certa forma, de retalhos de esperança. O tombo na rua com traumatismo craniano, a UTI, o médico que anunciou que uma parte de sua cabeça morrera. Os vizinhos juntaram dinheiro para mãinha vir de ônibus. Assim que o viu, o desalento tomou conta dela. Mãe tem estas coisas de prever desventura. Não queria que ele viesse.
Ao se despedir dele no velório, sussurrou em seu ouvido que, um dia, Nossa Senhora da Conceição faria com que se reencontrassem.
No dia seguinte, juntou algumas lembranças dele e tomou o ônibus de volta, com os olhos apenas no Céu.
Estamos peregrinando pela Semana Santa. Não somos daqui e temos inúmeros que já se tornaram da Eternidade. Neste texto, penso em Maria peregrinando o mais próximo que podia do Filho que se detém diante dela no caminho do Calvário.
Que cruel, ela com Seu Menino de Belém, injustiçado, maltratado, cuspido, esvaindo em sangue e tudo por um Amor incompreensível ainda para tantos. Ela, sem dúvida, apesar do sofrimento imenso, compreendia esse Amor que salva.
Como disse o Pe. Márcio Felipe, Pároco e Reitor no Santuário Santa Rita de Cássia, em pregação no Setenário das Dores de Maria, organizado por Dom Gil Antonio Moreira, em Itapecerica – MG, "embora com o coração despedaçado, o Seu olhar (de Maria) voltado para a Cruz e para o Crucificado, a conforta. Em e, por Jesus, Maria permanece de pé. (...) Como nos ensina Santo Ambrósio: 'é a cruz de Cristo que alivia a enfermidade de toda a humanidade".
Valorizamos a Semana Santa ou não? Será que peregrinamos como Pedro, reconhecendo nossas covardias ou como Judas, que indicou quem era Jesus por trinta moedas? Será que seguimos como Maria Madalena ou como aqueles que Lhe dão bofetadas? Será que seguimos com coragem de João Evangelista ou com os que gritam: "Se és o Cristo, salva-te a ti mesmo? Ou será que não O seguimos, que a Semana Santa é um tempo com mais um feriado apenas? Será que temos consciência daquilo que falou o Padre Márcio Felipe em sua homilia no Domingo de Ramos: "Ele se esvaziou de si mesmo, para que assim toda a humanidade pudesse se 'encher' da Sua vida. Buscando ficar repletos das coisas de Deus, é que podemos superar tudo aquilo que deixa em desordem o nosso coração".
Se peregrinarmos pela Semana Santa com Maria, quebra-se o nosso pedestal de barro, abrimo-nos aos mais sofridos e vemos a Cruz como escada para a Eternidade.
Maria Cristina Castilho de Andrade é professora e cronista (criscast@terra.com.br)