OPINIÃO

A vida recomeça e igual

29/02/2024 | Tempo de leitura: 3 min

Encerradas as festividades de final de ano, entramos nos preparativos carnavalescos. Só alegrias!

Interessante notar que o comportamento de boa parte da população não mudou, notadamente no que respeita às ofensas de ordens pessoais, violência desenfreada, feminicídio, atos racistas inegavelmente envolvendo os protagonistas, por exemplo, dos eventos carnavalescos, onde as vítimas - "coincidentemente" - em grande parte pessoas negras e mulheres.

São de conhecimento os efeitos odiosos do denominado "crime contra a humanidade" assim fixado na "Conferência Mundial Contra o Racismo, Discriminação Racial Xenofobia e Intolerância Correlata, realizada em Durban na África do Sul no ano de 2001, envolvendo 173 países e em torno de 4.000 organizações não governamentais.

Estamos há 23 anos dessa valorosa Conferência e, infelizmente, ainda não alcançamos os resultados positivos, não exigindo muito esforço para confirmar que, em especial as ofensas raciais se repetem, dentre as quais a inversão dos fatos, como, por exemplo, do recente caso daquele motoboy atacado por um homem branco que o agredira com um canivete resultando na prisão dele (a vítima) !!!! Espantoso, pois além de sofrer a agressão física, acabou preso! Como assim???

Não bastando tais ocorrências, outra grande dificuldade é a produção de provas dessas ofensas apesar do conhecimento geral de que, todos os dias, em todo o Brasil, as pessoas negras são vítimas de constrangimento nas chamadas lojas de departamentos e supermercados, onde, invariavelmente, são vigiadas ostensivamente e tidas enquanto criminosas em potencial; o mesmo se verificando nas sinistras portas giratórias das agências bancárias comandadas por vigilantes despreparados ou orientados a dificultar o acesso das pessoas negras.

Diante dessa postura (constrangimento e perseguição) ao levar o fato a conhecimento das autoridades, raros os casos de adoção dos procedimentos necessários! Aqui vale lembrar daquela jogadora de vôlei que agrediu um casal de entregadores no Rio de Janeiro, em ato indiscutivelmente de cunho racial, que obriga prisão em flagrante, todavia ainda responde em liberdade pelo crime de injúria e perseguição!

Ainda que ocorra condenação, não percamos de vista aquele caso em que o sujeito anunciou a venda de um "escravo, único dono, baratinho" na internet, que foi condenado à "prestação de serviços comunitários", consistente em uma hora por dia, durante 365 dias. Não se exige esforço algum para entender que a "condenação" não produziu efeitos pedagógicos no sentido de noticiar que tais condutas geram consequências graves e evitem sua repetição.

Por que isso acontece? Porque primeiro diz respeito à formação das "autoridades" sobre o tema; na sequência o distanciamento das "otoridades" desses fenômenos; segue-se a ausência de pessoas que integram as alegadas minorias nesses locais; aqui destaco as pessoas com deficiência, vez que, em especial nos espaços públicos que tem o dever de servir de exemplo, não atendem às determinações de acessibilidade. Basta reparar.

Quando menciono acessibilidade, costumo questionar algumas pessoas se, por exemplo, conduziram um PcD em cadeiras de rodas? Em grande parte, as respostas são negativas. Eu passei por essa experiência e asseguro que é muito difícil, além da horrível empunhadura que não oferece segurança e firmeza alguma, os obstáculos são quase intransponíveis. No quesito "empunhadura", os fabricantes das cadeiras de rodas deveriam seguir o mesmo formato da empunhadura dos carrinhos de supermercado (segue a dica), deixando transparecer que não fazem uso desse equipamento. Outro questionamento diz respeito às pessoas cegas em restaurante "self service" sozinhas na escolha do alimento, é de uma dificuldade sem tamanho!

Costumo dizer também que não é preciso fazer parte e família convivendo com pessoa drogada para avaliar o que passam; não é preciso ser deficiente para saber e entender as dificuldades enfrentadas no dia-a-dia; não precisa ser negro e etc, mas sim mais próximo dessa realidade.

Fechando: "SÓ QUEM SENTE A DOR SABE O QUANTO DÓI".

Eginaldo Honorio é advogado, doutor Honoris Causa e conselheiro estadual da OAB/SP (eginaldo.honorio@gmail.com)

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

COMENTÁRIOS

A responsabilidade pelos comentários é exclusiva dos respectivos autores. Por isso, os leitores e usuários desse canal encontram-se sujeitos às condições de uso do portal de internet do Portal SAMPI e se comprometem a respeitar o código de Conduta On-line do SAMPI.