O Poder Público nem sempre está atento às reais necessidades do único titular da soberania que a Constituição da República reconhece: o povo. A prática da política tem priorizado a busca de prestígio e patrimônio pessoal, a permanência nos cargos, mediante táticas nocivas, como a reeleição, considerada a "matriz da pestilência". Em recente encontro, o Presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, sinalizou sua intenção de acabar com essa nefasta iniciativa, que faz com que, desde o primeiro dia do primeiro mandato, o mandatário pretenda angariar popularidade para continuar por mais quatro anos.
O mundo está precisando de agentes públicos mais responsáveis. Que honrem seus mandatos. Que saibam adaptar as cidades às mudanças climáticas. Elas são irreversíveis e serão cada vez mais danosas.
Uma cidade como a nossa tem muitas áreas vulneráveis. É urgente reconhecer que existem aquelas que não podem ser ocupadas. Encostas, proximidades de escassos mananciais, a Serra do Japi e seu entorno.
A densidade populacional é diretamente proporcional às tragédias que ocorrerão daqui por diante. As cidades são viveiros de ameaças climáticas, mas também viveiros de soluções climáticas. É preciso criar um Gabinete de Crise Climática, integrado por representantes de cada secretaria, mas com propósitos, metas e prazos prefixados. Avaliar os riscos, incorporar sua ocorrência ao planejamento urbano, protocolos e sistemas de alarmes para eventos extremos, seguros contra desastres naturais, tudo isso tem de estar no radar do administrador.
Existem ao menos seis áreas de ação para adaptar as cidades brasileiras ao cataclisma climático. Em saúde pública, as temperaturas altas elevam os riscos de agravamento de doenças crônicas, especialmente cardiovasculares. Os hospitais têm de estar atentos a isso. A distribuição de cloro e de desinfetantes pode reduzir riscos associados à insalubridade da água em períodos de seca. A remoção mais eficiente do lixo urbano e programas de vacinação podem diminuir a incidência de doenças infecciosas, transmitidas por insetos em épocas de chuva e calor.
É imperiosa a expansão de áreas verdes. Não basta invocar a presença da Serra do Japi. Pequenos núcleos e árvores nas ruas, criam ambientes mais agradáveis, promovem mais conforto térmico e melhor drenagem do solo.
Sistemas de alerta e evacuação eficiente podem reduzir as consequências de enchentes e deslizamentos. É preciso edificar obras de contenção. Centro de atendimento podem servir desde abrigo durante inundações ou vendavais e até como locais de refrigeração e postos de hidratação. Os chamados "oásis urbanos" ou "refúgios climáticos" vão ser uma obrigação para as cidades que realmente querem proteger seus cidadãos.
Principalmente, é preciso educar a população. Mostrar a ela que as consequências de nossa insana irresponsabilidade, da insensatez com que destruímos áreas verdes, poluímos o solo, a atmosfera e a água, nós mesmos sofreremos. Fazer com que cada pessoa compreenda a sua responsabilidade no aproveitamento de tudo o que é produzido e da ignorância que faz com que descartemos resíduos sólidos aproveitáveis.
Uma cidade em que cada indivíduo se considerar "amigo da natureza", sofrerá menos do que aquela em que a devastação, a sujeira e o pouco caso forem a regra, com a conivência das autoridades locais. Não é esse o nosso desejo, nem o nosso irreversível destino.
Somos abençoados e queremos continuar assim.
José Renato Nalini é reitor de universidade, docente de pós-graduação e Secretário-Geral da Academia Paulista de Letras (jose-nalini@uol.com.br).