OPINIÃO

Griot e a solução

01/12/2023 | Tempo de leitura: 3 min

"Griot ", para alguns povos do continente africano, são anciões também conhecidos por guardiões da tradição oral de seu povo, além da função primordial de informar, educar, preservar, entreter etc.

Esses personagens eram tratados com o maior respeito que se pode imaginar em razão da idade; em relação ao que construíram ao longo dos tempos; ao acúmulo de experiências que os transformam em consultores e detentores de alto poder e muito conhecimento.

Cena clássica daquele senhor rodeado por crianças à sombra de frondosa árvore transmitindo seus ensinamentos, histórias e passagens, muito comum no candomblé.

Lembro de uma leitura contando que um griot fora questionado várias vezes sobre o mesmo tema, quer por uma das crianças, quer por outras e ele, sempre com muito respeito e paciência dizia que tantas vezes que fosse questionado, quantas responderia e justificava seu posicionamento afirmando que a ninguém é dado o direito ou ideia de acreditar que todas as pessoas gozem da mesma facilidade, compreensão aos ensinamentos transmitidos.

Sem falsa modéstia carrego comigo esse posicionamento e tantas vezes que fui questionado, quantas respondi aos meus filhos e aquelas pessoas a quem me dirigia até porque, nas minhas dificuldades de compreensão, ao questionar visando eliminar a dúvida, a pessoa questionada dizia que já havia informado e que se limitaria ao que havia transmitido! Essa postura, além de criar um clima ruim, agravava ainda mais a minha dúvida da qual, praticando empatia, não vejo qualquer impedimento ou dificuldade em responder quantas vezes questionado, pois que ensinamento - a meu olhar - é isso e toda dúvida deve ser eliminada com muito respeito, considerando também a limitação de cada qual.

Estamos saindo do "mês da consciência negra", em que grande parte da atenção foi direcionada à população e consciência negra, seus feitos, importância, ofensas, constrangimentos, reflexões, marchas, debates e tudo o mais, com a pretensão - em todas essas atividades - na redução das desigualdades enfrentadas por tão importante parcela da população, cujos conhecimentos foram abordados por todo o Brasil.

Em um desses encontros, uma pessoa afirmou que fora discriminada em uma locadora de veículos, na Bahia, cujo constrangimento a levou até a tratamento hospitalar. Ao ajuizar ação indenizatória pelos danos morais, a empresa fora condenada a pagar a esse título a "vultosa" importância de, não se assustem, R$ 1.500,00! Revoltante, né?

Infelizmente é assim que que se pune pessoas que praticam atos discriminatórios no Brasil, onde, conforme o Mestre Kabengele Munanga, se trata de "crime perfeito." Isso quando são ajuizados!

Mudanças chegando, vez que ainda nesta semana, toda a mídia divulgou o caso daquela senhora que fora submetida a revista em uma loja no aeroporto da capital federal, da qual resultou no clássico pedido de "desculpas"; na mesma linha, aquele sujeito que matou a mulher negra, grávida para que não lhe fosse atribuída paternidade de um filho negro; aquela torcedora de futebol ofendendo outra chamando-a de "pedaço de macaca", nesse caso, a juíza agiu de acordo com a lei e decretou a prisão preventiva da ofensora; e também aquele médico condenado, no Estado de Goiás, ao pagamento de 300 mil reais pela pratica de racismo recreativo.

A meu olhar, o Judiciário pode contribuir sobremaneira com a redução dessas maldades impondo penas severas contra esses crimes, a exemplo das aqui descritas.

Diante de fenômenos e ausência de tratamento pedagógico, o Conselho Nacional de Justiça baixou no mês de março/23 a Resolução n.492, aprovando protocolo que determina "capacitação de magistrados e magistradas nas temáticas relacionadas a direitos humanos, gênero, raça e etnia" em formação inicial e continuada criando, inclusive, um "comitê de acompanhamento em caráter Nacional e permanente, o que, confiando na qualidade e captação de conhecimentos, inclusive ouvindo griots e militantes gabaritados, certamente produzirá resultados importantes no combate a esses crimes. Estamos de olho, pois chega de tanta maldade.

Eginaldo Honorio é advogado, doutor Honoris Causa e conselheiro estadual da OAB/SP (eginaldo.honorio@gmail.com)

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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