Opinião

O Brasil confessa

22/09/2023 | Tempo de leitura: 3 min

Saudações de estilo, ilustradas pessoas.

Já tive a oportunidade de comentar aqui a interpretação que faço do art. 3º da Constituição Federal, com seguinte teor: "Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional;  III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação".

Na minha leitura e interpretação em se tratando de "objetivos fundamentais", "construir", "garantir", "erradicar", "reduzir", "promover" é que efetivamente não os cumpre.

As pessoas que acompanham a realidade tem a plena noção de que, por exemplo, a tal "sociedade livre justa e solidária" só consta no papel. De mesmo modo erradicar a pobreza e diminuir as desigualdades estão muito longe de serem conquistadas. Isso é fato e real. Infelizmente!

A recomendação do mencionado artigo constitucional, encontra inegável reforço com o recente Ato Normativo do Conselho Nacional de Justiça propondo que "Os Tribunais brasileiros deverão levar em conta, em julgamentos, as especificidades das pessoas envolvidas, a fim de evitar preconceitos e discriminação por gênero e outras características. O Conselho (CNJ) estabeleceu obrigatoriedade das diretrizes do protocolo para julgamento com perspectiva de gênero pelo Poder Judiciário Nacional. A decisão foi aprovada por unanimidade durante a terceira sessão ordinária. De acordo com o Ato Normativo as cortes (tribunais) deverão promover cursos de formação inicial e continuada que incluam obrigatoriamente os conteúdos relativos a direitos humanos, gênero, raça, etnia. Na oportunidade a Ministra do STF e CNJ Rosa Weber afirmou: "Esse é tema crucial para as mulheres e esse é um trabalho primoroso. Vivemos em uma sociedade infelizmente impregnada por um machismo estrutural sistêmico e precisamos agir contra isso".

Esse posicionamento é prova cabal de que a discriminação e preconceitos são praticados pelo Poder Judiciário, a ponto de recomendar a formação obrigatória, inicial e continuada tratando especificamente do gênero, raça, etnia, direitos humanos, que deveriam vir desde os primeiros dias nos bancos escolares e impreterivelmente no ensino superior.

O distanciamento desses conhecimentos acarretam danos irreparáveis e de dificílima reparação na medida em que as mulheres, os negros, os indígenas, pessoas pobres, LGBT... permanecerem ignoradas ou até excluídas das políticas públicas.

Assim - ainda que nesse momento, pois nunca é tarde para estudar - é imperioso que se coloque em pratica a recomendação do CNJ visando a formação continuada dos magistrados e magistradas nessa temática, abrindo oportunidade ampla para a redução das desigualdades, das ofensas e violências, indiretamente praticadas contra as alegadas "minorias".

A falta de estudos e conhecimento da realidade brasileira, no mais das vezes, impedem a produção de politicas publicas de alcance a toda população brasileira e em todos os segmentos, quer sejam relacionados a gênero, etnia, raça, orientação sexual, oferta de oportunidades, produção e revisão da farmacologia, produção do material-didático pedagógico e por ai vai.

Nessa linha  é possível adotar medidas de equilíbrio social e neutralidade tanto que, por exemplo, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de S.Paulo, composto por 25 desembargadores, ao julgar ação Direta de Inconstitucionalidade (proc. 2294532-79.2022.8.26.0000) contra o uso de expressão religiosa na abertura e fechamento de sessões de câmara municipal e leitura de trechos bíblicos, por unanimidade, entendeu que a atitude viola a liberdade religiosa e discrimina todas os demais além de desrespeitar aqueles que não nutrem fé alguma. Logo, é certo que que o Poder Público deve manter a cristalina, justa e equilibrada neutralidade, pois tem o dever institucional de atender a população independente da fé, preferência, orientação etc.

Eginaldo Honorio é advogado, doutor Honoris Causa e conselheiro estadual da OAB/SP (eginaldo.honorio@gmail.com)

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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