Hoje acordei meio filosofando sobre a vida. E de forma especial lembrando dos meus tempos de inúmeras viagens a trabalho. E uma das coisas que mais fiz ao longo de minha vida profissional, nos áureos tempos de pesquisa de mercado, era pegar táxis entre aeroportos, hotéis, escritórios, salas de pesquisa. Viajei muito por esse Brasil. De norte a sul. Leste a oeste. Já falei com instaladores de ar condicionado em Belém, em Sinop. Já entrevistei médicos de todas as especialidades possíveis. Pacientes de várias doenças. Com gente muito rica e gente muito pobre. Já fui visitar marcenaria em Paulista (zona metropolitana de Recife) e em Porto Alegre. Com revendedoras de Avon. Tive projetos também com gestores de cidades. Com autoridades. Uma das mais simpáticas foi o atual prefeito de Curitiba, Rafael Greca de Macedo, um homem de uma cultura e alegria contagiantes (um dia, escreverei apenas sobre ele e minha cidade natal, Curitiba; apesar de só ter nascido lá, é um lugar pelo qual tenho muito carinho).
Todas essas experiências eu carrego com orgulho. Me fizeram ter uma visão ampla do mundo.
E onde se encaixam os táxis nisso tudo? Bom, como eu era terceirizado e precisava prestar contas de meus gastos, era mais fácil pegar táxis e recibos, numa época em que a oferta de Uber e 99 era ínfima, demorada. Cada táxi, uma conversa. Uma observação. Uma história. Vou compartilhar nesses dias frios alguns desses causos.
Os belenenses, por exemplo, simpaticíssimos, faziam questão de divulgar as comidas paraenses (a melhor do mundo, na minha opinião). Os de Salvador odeiam o trânsito. Cheguei a pegar um que me largou no meio do caminho e desistiu ("Devia ter ficado jogando dominó no ponto... essa hora é um inferno aqui em Pituba").
Uma vez, o taxista de Fortaleza ficou indignado comigo.
- O senhor veio para visitar que praia?
- Nenhuma... vim a trabalho.
- Como assim? Não vai conhecer nenhuma praia?
- Não vou ter tempo, tenho que trabalhar?
- Mas... nenhuma praia? Mesmo? - Nem gosto muito de praia...
- Vish! É louco, é?
E nada aproveitei dessa linda capital do Ceará.
Os taxistas do Rio de Janeiro parecem praticar num constante rally, como se não houvesse amanhã. Mas um deles me deu uma lição de vida. Era uma linda noite e eu acabava de sair de um show de Bossa Nova com Maria Creuza em Ipanema. Entrei no carro.
- Botafogo, por favor.
- Pela orla ou por dentro?
- Pelo caminho mais rápido.
- Nessa hora é tudo a mesma coisa. Vai pela orla, paulista. Aproveita essa vista. A brisa do mar. Nem tudo é pressa.
E foi um dos percursos mais bonitos que já fiz.
A pressa e o anseio de fazer as coisas nos tornam brutos. Faz com que esqueçamos de olhar para fora da gente e enxergue a beleza do mundo.
Desculpem-me pela filosofia toda. Pela coluna um tanto quanto "coach" de hoje. Mas essas lembranças me vieram e achei oportuno compartilhar. Acho que é um pouco disso que trata a vida, não é? Compartilhar não apenas opiniões, análises, mas também memórias, vivências, lembranças. Uma forma de deixar alguma marca nossa em um mundo cada vez mais rápido, fluido, em que nada parece sólido e constante.
Samuel Vidilli é cientista social (svidilli@gmail.com)