Opinião

O cisne negro do Vale do Silicio

15/03/2023 | Tempo de leitura: 3 min

O termo "Cisne Negro" é usado para descrever um acontecimento inesperado e raro, quase impossível de prever e dificilmente mitigável. Nassim Taleb, em seu livro "A Lógica do Cisne Negro", publicado em 2007, argumentou que estes eventos são mais comuns do que se pensa e têm um impacto significativo na sociedade e na economia. Ele argumentou que muitos dos modelos usados para prever eventos financeiros são baseados em suposições que não levam em conta a imprevisibilidade. Embora Taleb não tenha previsto especificamente a crise financeira de 2008, sua teoria foi amplamente citada como uma explicação do que aconteceu e da necessidade de repensar a maneira como gerenciamos o risco financeiro. 15 anos depois, continuamos a ignorar cisnes negros. Em janeiro deste ano Taleb já nos alertava: "preparem-se para um doloroso retorno à realidade. A Disneylândia acabou. Temos os 'valuations' mais estranhos da história". De fato seguimos uma sequência de quebras de unicórnios sem lastro, cujos valuations eram estimados em dezenas de bilhões de dólares como o WeWork, a Theranos, Quirky, Zirtual etc. Não precisa ser um gênio de Wall Street para entender que só é possível considerar um coworking como uma empresa valendo mais que a Coca-Cola, estando dentro de uma bolha financeira. A Coca-Cola tem como produzir bilhões de dólares em produtos, o WeWork não. No último dia 10, o Silicon Valley Bank (SVB), 16º maior banco dos EUA, foi à falência. O SVB é um banco comercial fundado em 1983 na Califórnia, foi um dos principais parceiros financeiros do setor de tecnologia do Vale do Silício, investindo em empresas como a Amazon e o Google. Operava em vários países como China e Índia. O mercado financeiro é sabidamente emocional, um banco quebra por medo e desconfiança dos seus clientes. Nenhum banco no mundo tem 100% de lastro. Logo, se boa parte de seus clientes quiser sacar o valor que tem depositado, certamente haverá quebra. Na pandemia, o governo dos EUA permitiu que os papéis fossem negociados com zero lastro, na ideia de fortalecer uma economia vulnerabilizada pelo Covid. O SVB foi longe demais e abriu um rombo de 2,5 bilhões de dólares para cobrir uma perda causada pelas taxas de juros elevadas. A notícia fez com que seus clientes fugissem do banco, derrubando suas ações em 60% em um único dia. Órgãos reguladores dos Estados Unidos assumiram o controle na maior falência de um banco desde 2008 e vão reembolsar até 250 mil dólares para os clientes. O problema é que startups como a Zanara na Índia tinham no banco mais de USD 7,7 milhões. Mesmo que Biden esteja gritando nas capas dos principais jornais do mundo: "No losses will be borne by the taxpayers", o setor de tecnologia mundial será certamente afetado. Os cisnes negros não são novidades e já comprovaram que o sistema financeiro global é muito mais complexo e imprevisível do que os modelos matemáticos convencionais podem explicar e que muitas vezes subestimamos o impacto significativo na economia global que podem causar.

Elisa Carlos é engenheira, especialista em inovação e head de operação (elisaecp@gmail.com)

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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