Ainda o Oscar. Os ataques que fiz a alguns dos indicados da edição 2023 custaram discussões variadas. Nas redes sociais, chamaram-me de exagerado e saíram em defesa de "Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo" e "Elvis", dos quais nunca escondi não gostar. Suas indicações exemplificam a decadência do prêmio.
Contudo, e como outras premiações do cinema, entendo que o Oscar também tem seus acertos - seja entre indicados ou mesmo vencedores. São esses acertos que ficam na memória. Assim, é preciso voltar ao passado, a uma lista de competidores que começou ainda nos anos 1920, quando a Academia de Hollywood foi criada.
Logo na primeira edição, "Asas", de William A. Wellman, venceu como melhor filme e derrotou "Sétimo Céu", de Frank Borzage. Nessa primeira edição havia o prêmio de "melhor produção artística", espécie de medalha de prata, que ficou com a obra-prima "Aurora", de Murnau. Na mesma categoria concorria "A Turba", de King Vidor.
Nos anos seguintes, os prêmios de melhor filme vão para obras marcantes como "Sem Novidade no Front", "Grande Hotel", "Aconteceu Naquela Noite" e, em 1940, considerada por alguns especialistas como a melhor edição do Oscar, "E o Vento Levou" desbanca "O Mágico de Oz", "A Mulher Faz o Homem" e "No Tempo das Diligências".
Estoura a Segunda Guerra, nasce a televisão, tudo muda em Hollywood. O Oscar mantém seu padrão de qualidade e o star system resiste aos anos seguintes. Em 1941 são indicados "As Vinhas da Ira", "A Longa Viagem de Volta", "A Carta", "Núpcias de Escândalo", "O Grande Ditador" e, o vencedor na ocasião, "Rebecca, a Mulher Inesquecível". Bastaria apenas um deles, hoje, para tirar o prêmio da mesmice. Outros tempos.
Naquele mesmo ano, 1941, John Ford, Alfred Hitchcock, George Cukor e William Wyler concorriam à estatueta de direção. No ano seguinte, Ford de novo, Wyler de novo, Howard Hawks e um jovem estreante Orson Welles por "Cidadão Kane". Em 1946, Billy Wilder derrotou Hitchcock e Jean Renoir com seu ótimo trabalho em "Farrapo Humano".
Outros exemplos de anos espetaculares podem ser observados nas décadas seguintes, como 1952, quando concorriam ao prêmio de direção Elia Kazan, George Stevens, John Huston, Vincente Minnelli e William Wyler. O melhor filme do ano foi "Sinfonia de Paris". O melhor diretor foi Stevens, por "Um Lugar ao Sol". Anos mais tarde, em 1964, foram indicados Kazan, Federico Fellini, Martin Ritt, Otto Preminger e, menos conhecido e vencedor, Tony Richardson pela deliciosa comédia "As Aventuras de Tom Jones".
Os anos 1970 foram incríveis para o Oscar. Imagine uma categoria de melhor direção com os seguintes nomes no páreo: Bob Fosse, Francis Ford Coppola, François Truffaut, John Cassavetes e Roman Polanski. Isso foi possível em 1975, quando Coppola levou a estatueta por "O Poderoso Chefão - Parte 2", também o melhor filme.
Escolha qualquer um desses nomes e se lembre que os vencedores da última edição são Daniel Kwan e Daniel Scheinert por "Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo". Sim, eu sei, eu disse que este texto seria voltado ao que o Oscar tem de melhor. Assim, recomendo olhar para o passado, recordar os tempos em que reinaram Ford, Wyler, Capra, Kazan, Wilder, Lean, Coppola, Friedkin e Milos Forman. Quando o Oscar era bom.
Rafael Amaral é crítico de cinema e jornalista; escreve em palavrasdecinema.com (ramaral@jj.com.br)