Se tem uma coisa que todos conhecem é o Masp, o ícone da Paulista onde se fazem as manifestações de toda ordem da democracia. Sua história é longa e muito significativa pra cultura brasileira. Temos que voltar a 1947 no pós-guerra, quando o casal Lina Bo e Pietro Maria Bardi chegam da Itália e Bardi é contratado por Chateaubriand para fazer o Museu de Arte de São Paulo. Inauguram o mesmo museu na rua 7 de Abril e Chateaubriand, que fez antológicas investidas para pagar as obras compradas por Bardi pra constituir o acervo, fez dele hoje o mais importante da América do Sul.
Bardi, um diretor que teve por toda sua história uma atividade na gestão do museu, por quase seis décadas, foi ousado e ultrapassou cânones e paradigmas das artes. Nunca se limitou às Belas-Artes. Ao contrário, ampliou para o território do design, da história e dos ofícios, difundindo permanentemente em exposições e edições antológicas o conhecimento e a contemporaneidade da arte, sua produção no mundo e a Arte antiga.
Mas agora é a hora de falar de suas assessoras, mais especificamente de Anna Carboncini Masini, que a convite de Bardi veio para o Brasil e trabalhou desde 1975 incansavelmente pelas realizações que ele inventava.
Bardi, em uma semana do mês de 1977 ou 78, colocou um anúncio na Veja convocando quem tivesse fotografias, documentos e ricordi sobre a imigração italiana no Brasil para uma grande exposição. O anuncio era minúsculo. Atendi, me apresentei.
Quem me recebe? Anna que, surpresa e feliz com o que trouxe como contribuição, leva tudo ao professor. Ambos notaram que havia documentos, fotografias e objetos inéditos, com importância para a exposição. Nesse tempo, passo a organizar as peças, objetos, documentos e fotografias, e a partir daí todas as semanas Bardi, Anna e André Masini vinham selecionar o que conseguíamos levantar. Anna teve o cuidado de catalogar todas as obras em empréstimo com recibos que tornavam confortável a operação dos colaboradores. Acompanhou todos os trabalhos de montagem da edição do catálogo, da desmontagem e da devolução das peças. Todos os documentos íntegros.
Assim inicia essa amizade que se estendeu até recentemente quando me despeço da querida Anna, que nos deixou no dia 20 de novembro.
Aquela exposição, de 1980, foi uma emblemática e pioneira mostra documental: "Itália-Brasil: relações entre os séculos XVI e XX", reuniu milhares de objetos e documentos que mostraram o panorama da contribuição da imigração italiana na cultura brasileira e mais ainda paulista, com conteúdo, a maioria, inédito.
Depois disso conseguimos que uma parte da exposição fosse apresentada em Jundiaí, no Museu Solar do Barão, que com Anna e no IAB coordenei a montagem. E foi memorável. Sete mil pessoas viram essa mostra. E não para aí. Em 1982, Bardi e Anna me chamam para colaborar na exposição do "Design no Brasil: história e realidade"
Aí, novamente a mesma coisa acontece. Para inaugurar o Sesc Pompeia, o Masp faz a exposição onde Lina mostra sua máxima capacidade expositiva, como num grande mercado do interior de São Paulo ou do Nordeste. Objetos feitos no Brasil que contam a história e mostram o desenho marcado em obras, as mais simples do universo, do cotidiano. Foi maravilhosa e de novo no backstage a seleção de Anna e Bardi estavam presentes para a realização dessa fantástica proeza de Lina. De novo com Anna, trouxemos parte dessa exposição para o Solar.
Em seguida fizemos, Anna e eu, a exposição "O design do cotidiano" em 1991 para inaugurar o meu escritório aqui em Jundiaí. Sua participação na realização do projeto arquitetônico do Polytheama também foi importante. Ela quem fez o meio de campo para que eu apresentasse a ideia a Lina e em seguida oferecesse o que significava e o que era o teatro.
Em 1990, Anna conseguiu com a Pirelli o patrocínio para constituir o acervo de fotografias do Masp, promovendo edições anuais da produção dos fotógrafos brasileiros, com destaque para a história contemporânea da fotografia no Brasil. Foram 16 edições. O acervo Pirelli de fotografia se deve a ela, assim como o importante reconhecimento da fotografia como arte que está completamente implantado no acervo do Masp. Nesta mesma década, Anna torna-se diretora do Instituto Bardi, guardiã intelectual do acervo destes grandes nomes e divulgadora de suas obras. Sua ausência é uma tristeza que não passará e Anna, você é insubstituível.
Eduardo Pereira é arquiteto (edupereiradesign@gmail.com)
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Tânia Cristina Bordon Miotto 07/12/2022Eduardo que texto inspirador, como a Anna e a parceria de vocês. Parabens pelo texto , e pelas obras e legado relatado. Obrigada.