20 de novembro

24/11/2022 | Tempo de leitura: 3 min

Por força da Lei n. 10.639, de 9 de janeiro de 2003 a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, sofreu alteração para constar o dia 20 de novembro como "Dia Nacional da Consciência Negra".

Um dia com essa envergadura foi discutida desde o final da década de 1970 com idealização do sempre senador Abdias do Nascimento, tanto que apresentou, no ano de 1983, Projeto de Lei n. 1.550 que declara o dia como "feriado Nacional", aguardando andamento junto a Câmara dos Deputados desde o dia 22 de novembro de 1985. Independentemente desse projeto, o Senador Randolfe Rodrigues apresentou PLS – Projeto de Lei do Senado de n. 482/2017, com mesmo objeto, que aguarda andamento junto a Câmara dos Deputados desde o mês de setembro de 2021.

Sabemos que as propostas são de grande valia e, apesar dos interesses, a reflexão e abordagens não devem ser tratadas apenas no próprio dia, posto que tudo - e simplesmente tudo - que se relaciona à comunidade negra deve ser tratada todos os 365 dias do ano, lembrando que a Comunidade Negra é maioria e, lamentavelmente, os negros/as são encontrados nos mais altos postos da criminalidade, notadamente na condição de vítimas, quer agindo, quer sofrendo ação, como também nas piores condições humanas em todos os ambientes (saúde, educação, trabalho, moradia, justiça, etc e etc.)

Importante também destacar que a cada 23 minutos um jovem negro sofre morte violenta no Brasil. Alguns dirão: "mas ele era bandido"! E daí que era bandido? Ainda que o seja. não autoriza aplicação da sumária pena de morte. De mesmo modo e aqueles que são mortos apenas por serem negros e por "suspeita"? Lembremos daquela família no Rio de Janeiro contra a qual foram disparados 287 tiros de fuzil por militares do Exército, apenas por "suspeita". O cidadão que portava um guarda-chuva e outro uma furadeira, ambos fuzilados por "suspeita"; aquele que retornava do trabalho morto pelo militar (vizinho) que, apenas "suspeitando", não titubeou ao atingi-lo com disparos de arma de fogo.

Esses aspectos tipificam genocídio desenfreado, que deve ser somado aos danos psicológicos decorrentes da exclusão quer no mercado de trabalho, no tratamento da saúde, na moradia digna, na perseguição em supermercados e lojas de departamentos, nas abordagens policiais, na avaliação das condutas ilícitas pelo judiciário tratando de forma totalmente diversa delitos causados por não negros, e por aí vai.

É fato que as demandas devem e merecem ser tratadas todos os dias e não apenas no dia 20 de novembro, sendo que ao tratarmos tais fatos nos demais dias dos anos, deveríamos reservar o 20 de novembro apenas para avaliar e festejar os resultados positivos obtidos no período.

É certo que a comunidade negra avançou na luta a ponto de ocupar espaços até então exclusivos às pessoas não negras. Infelizmente a ocupação ainda é muito tímida, sabendo que é maioria da população brasileira. Se a igualdade prevista na Constituição Federal fosse verdadeira, teríamos personagens em todos os lugares (televisão, cinema, mercado de trabalho, decisões e cargos judiciais, tratamentos de saúde, educação, etc e etc).

Vimos experimentando também que uma das formas para inclusão efetiva somente é possível por força da implementação de cotas raciais e de gênero, vez que tais segmentos são acintosamente discriminados, com a perda de talentos do mais alto valor e potência.

Nos recentes dias muito se fala em "democracia", o que é impossível implementar se se mantiver a exclusão dessa grande parcela da população. Nessa caminhada não se verifica a mínima condição para produzir e entregar política pública de âmbito geral onde todos ganham.

Considerando que a Comunidade Negra é maioria da população brasileira, é fundamental que o tema "consciência negra" seja mote todos os dias de cada ano, até que a conscientização alcance seus fins e, com isso, a redução substancial das desigualdades, discriminações e tudo o mais, evitando a ocorrência de ofensas contra essas pessoas, enquanto seres humanos cuja diferença seja, sobremaneira, pela quantidade de melanina.

Democracia não combina com exclusão.

Eginaldo Honorio é advogado, doutor Honoris Causa e conselheiro estadual da OAB/SP (eginaldo.honorio@gmail.com)

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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