Já se vão mais de seis anos desde que o cardeal francês Jean-Louis Tauran surpreendeu o mundo ao anunciar que o desconhecido argentino Jorge Mario Bergoglio era o novo Papa, líder espiritual de mais de 1,2 bilhão de pessoas espalhadas mundo afora. “Habemus Papam”, anunciou, da sacada da Basílica de São Pedro, à multidão reunida no Vaticano. Era noite de 13 de março de 2013 e Francisco, como Bergoglio decidira ser chamado, substituía Bento XVI, que de forma igualmente surpreendente havia renunciado ao pontificado semanas antes.
Por outra dessas surpresas que a vida reserva, tive a oportunidade de conhecer, poucos meses depois, o mítico Tauran. Era o casamento de uma prima da minha mulher e Tauran, parente do noivo, celebrou a união, realizada numa belíssima e pequena capela dentro dos muros do Vaticano. A celebração foi rápida e não houve como me aproximar. Mas na festa, realizada numa espécie de chácara na histórica Via Appia, por onde há milhares de anos todos chegam a Roma, tive a chance de cumprimentá-lo. Mas foi só.
Nunca me perdoei por não ter dado um jeito de conversar um pouco mais com ele e perguntar sobre o conclave e, quem sabe, entender melhor as circunstâncias que levaram à escolha de Bergoglio como Papa. Tauran acabou escolhido carmelengo – administrador da Igreja Católica na eventual ausência do Papa – por Francisco e assim continuou até sua morte, em julho do ano passado. Certamente teria muito a contar. Não consegui.
Para minha sorte – e de todo mundo que gosta de política, de história das religiões, ou de ambos - um jornalista irlandês especializado na cobertura dos assuntos do Vaticano acaba de lançar um livro que lança luz sobre o tema. A Eleição do Papa Francisco: Um relato íntimo do conclave que mudou a história, escrito por Gerard O’Connell, traz muitos detalhes sobre como se construiu, em grande parte à margem do próprio protagonista, a vitória de Francisco.
É curioso constatar que Francisco venceu exatamente porque não queria – ou, pelo manos, parecia não querer – ser Papa. Ele chegou a Roma para o conclave já com a passagem de volta marcada para Buenos Aires. Tinha preparado a homilia para a missa da quinta-feira Santa, que pretendia celebrar na capital portenha, e nunca se colocou como “candidato”.
Os favoritos eram o italiano Angelo Scola, arcebispo de Milão; o canadense Marc Ouellet, arcebisbo metropolitano de Quebec e primaz do Canadá; e o brasileiro Dom Odilio Scherer, arcebispo de São Paulo. O problema dos três era exatamente o mesmo: todos eram identificados com o então Papa Bento XVI e suas posturas conservadoras. A maior parte dos 115 cardeais eleitores queria o oposto disso. E, ao ouvir um brevíssimo discurso de três minutos e meio de Bergoglio na penúltima reunião das congregações gerais, encontros que acontecem antes do conclave, um grupo significativo de cardeais passou a identificar no argentino a perspectiva de mudança.
Foi só a partir da terceira rodada de votação que Bergoglio ganhou força. Seu caminho foi pavimentado lentamente, aos poucos, contra os favoritos, e sem preparação prévia alguma. Um antigo ditado ensina que o “apressado come cru, e quente”. Os bastidores do conclave de Francisco reforçam a premissa de que a paciência é uma virtude que deve, sempre, ser exercida. Tanto na política, quanto na vida.
Corrêa Neves Júnior, publisher do Comércio e vereador.
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