
Até alguns anos, falar sobre saúde mental no ambiente corporativo era algo incomum. Lembro-me de quando assisti ao clássico O Diabo Veste Prada e não consegui entender por que a personagem Andy desistiu de uma oportunidade tão promissora ao lado da poderosa Miranda Priestly. Na época, aos 21 anos, eu não tinha maturidade suficiente para perceber que relacionamentos pessoais e qualidade de vida deveriam ter um peso tão ou mais relevante do que o sucesso profissional.
Isso não significa que eu seja contra a dedicação ao trabalho – pelo contrário, sempre fui extremamente comprometida. No entanto, confesso que, por muito tempo, olhei com ceticismo para o tema da saúde mental. Diferente de uma fratura exposta, os impactos de um transtorno psicológico não são visíveis de forma imediata e incontestável.
Mas essa percepção mudou – e muito. Ao longo dos últimos vinte anos, vivenciei inúmeras experiências que me fizeram enxergar o quanto nossa saúde mental afeta todos os aspectos da vida. E essa não foi apenas uma constatação individual: nos últimos anos, o tema tornou-se central no mundo corporativo, impulsionado pelo alarmante aumento de afastamentos pelo INSS devido a transtornos psicológicos. Dados recentes apontam um crescimento superior a 400% nesses afastamentos, o que levou as autoridades a direcionarem maior atenção aos riscos psicossociais no ambiente de trabalho.
Como resposta a essa preocupação crescente, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) revisou a Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), que, a partir de maio, exigirá que as empresas adotem medidas concretas para prevenir e mitigar impactos à saúde mental dos empregados. A nova redação equipara os riscos psicossociais aos demais riscos ocupacionais, como agentes físicos, químicos, biológicos e ergonômicos. Essa mudança reforça a obrigação dos empregadores de garantir um ambiente de trabalho saudável, que não apenas minimize doenças físicas, mas também preserve o equilíbrio emocional dos funcionários.
Os riscos psicossociais abrangem fatores como assédio moral, pressão excessiva por metas, jornadas exaustivas, falta de reconhecimento e ambientes tóxicos. Para cumprir as exigências da NR-1, as empresas deverão incorporar a análise desses riscos em seus Programas de Gerenciamento de Riscos (PGR), realizando avaliações periódicas sobre carga de trabalho, relações interpessoais e estrutura organizacional. Além disso, políticas internas que incentivem a comunicação aberta, a flexibilidade e a valorização dos profissionais tornam-se essenciais para a construção de um ambiente mais equilibrado.
A implementação dessas medidas não apenas reduz o risco de ações trabalhistas e penalizações, mas também fortalece a reputação da empresa, melhora a retenção de talentos e aumenta a produtividade. Negócios que investem na saúde mental de seus colaboradores tendem a ter menores índices de rotatividade e um clima organizacional mais positivo.
O avanço da legislação trabalhista nesse campo reflete uma crescente conscientização sobre a importância da saúde mental no ambiente corporativo. Cabe às empresas entenderem que um ambiente de trabalho seguro não se limita à prevenção de acidentes físicos, mas inclui, cada vez mais, o cuidado com o bem-estar emocional de seus trabalhadores.
Roberta Capozzi Maciel é advogada especialista em processo civil, processo do trabalho e direito imobiliário.