Celebramos o Natal. O nascimento de Cristo continua a fascinar, a comover e a exercer um poder transformador que o tempo não conseguiu enfraquecer. Em meio à pressa e à ansiedade que marcam o mundo contemporâneo, o Natal é um convite a redescobrir o essencial: a simplicidade, o amor, a fé e o sentido profundo da existência.
Vivemos tempos de vertigem. A avalanche digital, a pressão do trabalho e o culto às aparências nos empurram para uma vida sem pausa e sem silêncio. Corremos muito, mas nem sempre sabemos para onde. O Natal, com sua luz discreta, recorda que o sentido da vida não está na velocidade, mas na direção. A pressa, travestida de eficiência, é uma forma de dispersão. Perdemos o foco, o tempo e, não raro, o coração.
Em muitas cidades, praças e avenidas, repletas de presépios e luzes, falam de um Deus que se faz criança para dizer que o infinito cabe num coração humano. Em um mundo cansado do barulho e da superficialidade, cresce a nostalgia de Deus, o desejo de transcendência e de certezas sólidas. A fé, que muitos julgavam superada, volta a ocupar espaço na vida de jovens e famílias. Quando parece que o materialismo prático ganha de goleada, o jogo vira. Sempre foi assim na longa história do cristianismo.
O Natal inaugura o mapa da santidade. O nascimento, a vida e a ressurreição de Cristo traçam o roteiro dessa fascinante viagem rumo ao Criador. E, para iluminar o caminho, nada melhor que o testemunho dos santos. Tive a alegria de conhecer pessoalmente um deles: São Josemaría Escrivá.
Há cinquenta e um anos, em 1974, São Josemaría visitou o Brasil e se encantou com a alma do nosso povo - alegre, generosa, acolhedora. Viu em nossa miscigenação um reflexo da universalidade do cristianismo. Liberdade, tolerância e cordialidade - traços tão nossos - o impressionaram profundamente. São valores que precisamos urgentemente resgatar num tempo dominado por polarizações e cancelamentos.
A figura de São Josemaría e a força da sua mensagem continuam atuais. Em tempos de ansiedade e dispersão, ele recorda que a verdadeira paz nasce da coerência e do sentido: “Ou sabemos encontrar o Senhor na nossa vida de todos os dias, ou não o encontraremos nunca.” O caminho para vencer o medo e a inquietação não está em acumular mais coisas, mas em viver com mais sentido. O cristianismo cotidiano - alegre, sereno, comprometido - é a verdadeira revolução que o mundo precisa.
O Natal nos chama, portanto, a um duplo movimento: para dentro e para o alto. Para dentro, porque precisamos reencontrar o silêncio interior onde Deus fala. Para o alto, porque o sentido da vida não se esgota nas conquistas passageiras. A ansiedade, esse mal silencioso do século, nasce da ilusão de que o ter pode substituir o ser. O Natal nos recorda o contrário: tudo começa na humildade de uma manjedoura. É ali, na pobreza de Belém, que a humanidade reencontra a esperança.
A redescoberta do essencial passa pela família. Ela é o primeiro espaço da fé, o berço das virtudes e a escola da paciência. O presépio é, antes de tudo, uma família reunida em torno do mistério do amor. Num tempo em que tantas casas se tornaram hotéis e tantas relações se enfraqueceram pela pressa e pela distração, o Natal nos convida a recuperar a convivência, o diálogo e a ternura.
Talvez o maior presente que possamos dar e receber neste Natal seja o da presença. Estar com quem amamos, olhar nos olhos, agradecer, recomeçar. Longe das telas e das urgências artificiais, o Menino de Belém nos convida a redescobrir o essencial: o tempo partilhado, a escuta atenta, o abraço sincero. São gestos simples, mas de um poder transformador imenso.
Feliz Natal!