OPINIÃO

Briga vexatória entre poderes

Por Zarcillo Barbosa | O autor é jornalista e articulista do JC
| Tempo de leitura: 3 min

Na história da República brasileira, membros do Supremo Tribunal Federal são indicados pelo presidente do país, mas precisam ser avaliados pelo Senado.

É o mesmo modelo das principais democracias do mundo moderno. A nossa Constituição exige que o candidato tenha idade entre 35 e 70 anos, seja brasileiro nato, revele notável saber jurídico e tenha reputação ilibada. A aposentadoria compulsória ocorre ao completar 75 anos.

Em novembro o presidente Lula indicou o advogado-geral da União, Jorge Messias, à vaga deixada por Luís Roberto Barroso no STF. O presidente do Senado Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), ficou desgostoso porque deixou de ser atendido na sua preferência pelo colega e antecessor Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Resolveu dar o troco boicotando o candidato do presidente Lula. Alcolumbre reuniu a patota para evitar que Messias atinja o número mínimo de votos, necessários para carimbar o novo ministro da Suprema Corte.

Durante o governo de Jair Bolsonaro o próprio Alcolumbre tentou fazer o mesmo com André Mendonça, no fim aprovado. A briga durou mais de quatro meses, com a sabatina no plenário adiada várias vezes porque o candidato preferido à época era Augusto Aras, ex-Procurador Geral da República.

Historicamente, até hoje houve apenas cinco casos de nomes apresentados pela Presidência da República que não foram referendados pelo Congresso. Todos durante a gestão do segundo presidente da República, o militar Floriano Peixoto (1839-1895) que governou o país de 1891 a 1894. Naquele tempo não se falava em "notório saber jurídico". Pedia-se simplesmente "notório saber". O médico Cândido Barata Ribeiro (1843-1910) chegou a assumir o posto. Ficou na Suprema Corte por 10 meses, até ser barrado pelos senadores. Na história recente, percebe-se com nitidez que os indicados ao STF são premiados pela sua fidelidade ao chefe do Executivo e não pelo currículo como jurista.

O presidente do Senado, ameaça com represálias para conseguir cargos em ministérios e rapidez na liberação de verbas orçamentárias. Age no próprio interesse não no interesse da "viúva".

A sabatina de Jorge Messias foi adiada para o ano que vem. Alcolumbre acusa Lula de "omissão grave e sem precedentes" por não ter enviado a papelada do candidato em tempo hábil. A briga, já vexatória, ganha outro desafeto. Entra o ministro Gilmar Mendes, decano do Supremo, que acaba de suspender diversos artigos da Lei de Impeachment de 1950. O diploma diz que qualquer pessoa pode pedir impedimento de ministro do STF. O Senado decide se acata ou rejeita, julga ou não, por maioria simples. Gilmar descobriu que a Lei de Impeachment, até então nunca contestada, é incompatível com a Constituição de 1988 e tratou de arredondá-la: segundo ele, o único que pode apresentar denúncia contra um ministro é o Procurador Geral da República. A votação no Senado terá que ser qualificada por dois terços dos votos. Não mais por maioria simples. O ministro é acusado de legislar em desprezo da atribuição exclusiva do Congresso.

O Senado Federal tem 81 pedidos de impeachment de membros do STF. Alexandre de Moraes é o campeão, com 43: Roberto Barroso vem em segundo com 20 e Gilmar Mendes tem 10. Flávio Dino, 8; Dias Tóffoli, 6; Cármen Lúcia, 5; Edson Fachin, 4; Cristiano Zanin, 3; Luís Fux, 2; Kássio Marques e André Mendonça, 1. Todos os pedidos foram engavetados. Não tiveram prosseguimento nem foram arquivados.

Ninguém nessa briga visa os interesses do Estado-Nação. Ao dizer que Messias "não vai passar de jeito nenhum", Alcolumbre quer que Lula abra as comportas do céu, o que, em política, significa as portas do cofre público. Lula quer alguém fiel a ele no Supremo. Vai que precisa. Messias, que não é bobo nem nada, como advogado-geral da União correu para apoiar o Senado contra a investida de Gilmar e pede que o ministro reconsidere as suspensões na Lei do Impeachment. Ninguém está preocupado com a Constituição.

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