OPINIÃO

Meus olhos (não) me enganam

Por Marina Machado | A autora é colaboradora de Opinião
| Tempo de leitura: 1 min

Se abro minha janela e a neblina da manhã tranca as janelas, então os pássaros cantam Vivaldi e o aroma repentino me informa do café coado e do tempo que tem passado.

Se a aurora dourada me cega os olhos, então sinto a brisa pura do Sol de inverno e começo a viver mais lentamente, apavorada pela ideia de pestanejar e cair no sono.

Se acordo e meus olhos não me enganam, então falhei. Porque meus irmãos não abrem as janelas porque os pássaros lá cantam Chopin terceiro ato Op. 35 número 2 em tom de si bemol menor e os conservatórios lá não tocam as quatro estações.

O peso da fumaça persistente marca os tempos passados e não se dissipa para o tempo que chega porque já passou.

Os feixes de luz asfixiam o Astro-Rei e meus irmãos se cegam de alma porque morrem rapidamente de forma que a brisa nem ao menos lhes beija o rosto, apavorados porque o sono vem antes da última aurora e da primeira pestanejada.

Se acordo e meus olhos não me enganam, então falhei; porque meus pássaros não cantam Chopin, e meu sangue não mancha os muros.

Então bordo um extenso véu negro e transformo meu plasma em tinta endereçada àquele que é O Misericordioso, porque o sangue sobre as ruínas é vermelho, e eu não sei como estancar.

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