OPINIÃO

A estupidez humana

Por Zarcillo Barbosa | O autor é jornalista e articulista do JC
| Tempo de leitura: 3 min

A guerra comercial e política aberta pelo presidente Donald Trump, contra o Brasil, chegou a um novo patamar com a abertura de investigações sobre supostas práticas comerciais que estariam restringindo injustamente as exportações norte-americanas no mercado brasileiro. Há coisas desconectadas, como a reclamação sobre a instituição do Pix e do comércio popular da Rua 25 de Março, em São Paulo. Outras, têm direção como o comércio de madeira ilegalmente extraída e desmatamento de áreas de proteção ambiental pelo agronegócio.

O Pix seria uma prática desleal de pagamentos eletrônicos. Prejudica a rentabilidade dos cartões Visa e Mastercard, e não deixa que se desenvolvam o Google e o Apple Pay. Se há uma invenção de instrumento financeiro que o Brasil deve se orgulhar, é o Pix. São 175 milhões de usuários que dele se utilizam, de maneira barata e segura. Os brasileiros movimentaram R$ 26,4 trilhões em transferências ao longo de 2024. Até os mendigos e guardadores de carro dele se utilizam. Outros países passaram a adotar o Pix, que tem uma razão social fortíssima, com a inclusão de milhões de pessoas, antes alijadas do sistema financeiro. A "nova ameaça", vem aí com o Pix parcelado, com juros menores do que os cobrados pelos Bancos e cartões de crédito. Uma competição saudável e que beneficia o coletivo. Chegou a hora dos cartões se reinventarem, com seus custos de manutenção elevados e juros estratosféricos.

Quem foi a Nova York, certamente circulou pela Canal Street, na Lower Manhattan, uma Rua 25 de Março piorada, onde se vendem abertamente bolsas Luis Vuitton, Ralph Lauren e perfumes franceses, "todos legitimamente falsificados". Os fabricantes originais até gostam. Quando aparecem imitações de produtos recém-lançados na Chinatown, é sinal que "pegou". Quem vai à Galeria Pajé, sabe que o Nike de R$ 250,00 é falso. Acrescenta-se a criatividade local. A camiseta Tommy Hilfiger vira Tommy Caipirinha.

O presidente Trump lembra a fábula do Lobo e o Cordeiro. Os mais fortes sempre encontram uma razão para oprimir os mais fracos. Mas também não precisa ter "olhos tão grandes", como a vovó do Chapeuzinho Vermelho, só "Porque eu posso".

Lula não recua. Chama o homem de gringo. A porta-voz da Casa Branca respondeu que Trump não é o imperador do mundo, mas um "líder do mundo livre". Os chineses dizem que "falar não cozinha arroz". Bater boca na mídia, muito menos.

Há que se usar a razão. O presidente Ronald Reagan, um conservador pragmático, disse contra as barreiras econômicas: "... Então, o pior acontece: mercados encolhem e entram em colapso; negócios e indústrias fecham; e milhões de pessoas perdem seus empregos". Reagan estava se referindo às guerras fiscais entre países. Saiu do governo em 1989, com 93% de aprovação.

A Câmara Federal, compromete o Brasil. No momento em que Trump reclama do comércio de madeiras ilegalmente extraídas de áreas de preservação, os deputados aprovam a flexibilização do licenciamento ambiental. O agronegócio e a indústria tornam-se aptos a construir seus empreendimentos sem vistoria prévia, sem fiscalização do poder público, sem ouvir as populações afetadas e sem estudos de impactos ambientais. A matéria já é considerada um "crime histórico", ou a "mãe de todas as boiadas". Ameaça o pouco que resta da Mata Atlântica. Saúde e bem-estar ficam mais comprometidos pela contaminação da água e ar por poluentes tóxicos. Mineração e aterros sanitários, sem controle.

Depois de escrito este artigo, chega a notícia das medidas cautelares impostas pelo STF a Jair Bolsonaro, com o uso de tornozeleira eletrônica, o toque de recolher e a proibição de contato com diplomatas e uso de redes sociais. Uma condenação antecipada. Jogo bruto.

Gustave Flaubert começou a escrever um Dicionário de Ideias Feitas. Morreu quando estava no verbete "estupidez humana". Mesmo se vivesse mil anos não conseguiria concluí-lo, porque a estupidez humana não tem fim.

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