De vez em quando, a história dá um passo à frente justamente quando parece tropeçar. A ascensão de Donald Trump e sua política de tarifas protecionistas, tão barulhenta quanto um trovão, podem, ironicamente, estar acelerando um dos projetos mais silenciosos e promissores do comércio internacional: o acordo entre Mercosul e União Europeia.
Sim, o mundo gira — e Trump gira contra. Enquanto os Estados Unidos se trancam em suas próprias fronteiras e redescobrem o nacionalismo como um velho casaco mofado, Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai e os 27 países da União Europeia ensaiam um movimento contrário. Acordos como este são mais do que cifras e documentos: são gestos de confiança em tempos de incerteza, pontes construídas entre continentes que escolheram dialogar em vez de erguer muros.
O Mercosul e a União Europeia juntos somam 718 milhões de pessoas e um PIB de 22 trilhões de dólares. É um número que se equipara ao dos Estados Unidos — e que mostra que a relevância geopolítica não é exclusividade de quem grita mais alto, mas de quem sabe estender a mão. O comércio entre Brasil e Europa já movimenta cerca de 92 bilhões de dólares. Com o acordo, as empresas europeias economizarão cerca de 4 bilhões de euros por ano em tarifas. E o mais importante: empregos serão gerados, rendas elevadas, ideias trocadas.
Mas não sejamos ingênuos: o caminho ainda é sinuoso. O protecionismo europeu, disfarçado de preocupação ambiental, ressuscita a velha cautela contra os gigantes do agronegócio sul-americano. A França de Emmanuel Macron já classificou o acordo como "inaceitável" — embora, agora, diante da porta que Trump bateu na cara dos europeus, talvez o "inaceitável" se torne "urgente". É hora de lembrar que este tratado não é apenas um contrato comercial. É uma declaração de intenções. Em um mundo cada vez mais fraturado, ele representa uma tentativa de união. É a reafirmação de que ainda é possível apostar na cooperação, no livre comércio e na diplomacia como alternativas à gritaria das redes sociais e à chantagem tarifária.
Ao Brasil — e ao Mercosul — cabe fazer sua parte: retomar com firmeza os compromissos ambientais e civilizatórios que justificam essa aliança. A Europa, por sua vez, precisa enxergar além de seus temores agrícolas e reconhecer a oportunidade histórica de fortalecer uma parceria estratégica.
O mundo está em movimento e, enquanto uns se isolam, outros se encontram. Que este acordo, tão aguardado quanto necessário, seja a nossa forma de dizer, em alto e bom som: não vamos retroceder. Vamos juntos.