OPINIÃO

A raiva contra as mulheres

Por Zarcillo Barbosa |
| Tempo de leitura: 3 min
O autor é jornalista e articulista do JC

A minissérie "Adolescência" (Netflix), levantou debates no mundo sobre o grande desafio dos pais, com a tarefa de fiscalizar o uso excessivo de redes sociais pelos filhos crianças e adolescentes. Como se eles fossem responsáveis pelas consequências negativas dessa obsessão, por faltarem com o dever da vigilância. Estreou no dia 13 de março e já contabiliza 100 milhões de visualizações.

O visual britânico conta os antecedentes que levaram um menino de 13 anos a esfaquear uma colega de escola. Deixa clara as influências tóxicas e misóginas da internet, que produziram tribos de "celibatários involuntários". Odeiam mulheres. Sentem-se rejeitados pelo insucesso em conquistá-las, feridos no orgulho machista. Elas seriam as únicas culpadas.

Os adolescentes, que sofrem com a insistência dos pais para que joguem futebol, "esporte de macho", embora não levem jeito, quando tentam se aproximar das meninas e são por elas repelidos, entram em crise de masculinidade.

As mulheres são chamadas de "depósito". Seres que "não passam de pedaços de carne, sem alma, seres sem a mínima capacidade criativa". Pontuam os psicólogos que os "machocratas" também torcem "pelo dia em que androides terão corpo feminino e útero artificial para que as mulheres morram de fome".

Durante o bullying engendrado pela comunidade na escola, a garota é morta com sete facadas. Câmeras de vigilância captam as cenas do crime. Policiais armados, como se fora um comando de guerra, invadem a casa dos pais do garoto acusado, e o submetem sob a mira de fuzis ainda na cama.

O pai, apavorado, implora que os policiais não atirem... "erraram de casa". A câmera acompanha toda a operação, como se o espectador também estivesse participando da rocambolesca prisão do "perigoso" assassino, um garoto de 13 anos, desarmado.

Na Grã-Bretanha, criminosos vão para a cadeia, não importa a idade. Do reformatório, vão para a penitenciária quando atingem a idade adulta e de lá só saem quando considerados habilitados a viver em sociedade, sem representar perigo. No Brasil, a internação máxima é de três anos, por mais hediondo que seja o crime.

Os pais hoje estão com a responsabilidade de educar os filhos, sem saber nada do que se passa no mundo digital. Até as palavras desse universo das redes sociais são difíceis de entender. "Incels", na internet, são aqueles celibatários involuntários dos quais falamos. Nonofobia é o medo irracional de não ter celular ou não conseguir usá-lo.

O ambiente nas escolas é caótico e hostil, como mostra a série. Professores não querem se envolver nas brigas de comunidades e procuram matar o tempo exibindo vídeos em sala de aula.

A única orientação que os pais recebem dos educadores e psicólogos é de não se utilizarem de tom autoritário e nem demonizar as redes. No caso, a série mostra que os pais do menino Jamie, o acusado, simples encanador, nunca foi violento e a mãe sempre o cobriu de carinho. Quando percebia luz acesa no quarto do filho, altas horas, levantava para pedir que dormisse para acordar disposto, cedinho.

As estatísticas revelam que os brasileiros passam mais de 9 horas online, por dia. Agora tentam proibir celulares nas escolas. Começam a surgir as primeiras ferramentas que permitem aos responsáveis monitorarem e gerenciarem o que os filhos fazem no celular.

Um desses "parental control" permite que o conteúdo do aparelho do menor seja replicado para outro aparelho, bloqueando aplicativos ou restringindo acesso a determinados conteúdos. O valor anual do uso do aplicativo é de quase R$ 350.

O espectador acompanha o sofrimento dos pais e da irmã menor e certinha de Jamie, enquanto aguardam o julgamento. A molecada da vizinhança picha a van do encanador com tinta indelével: Per-ver-ti-do.

O pobre homem se pergunta "onde foi que eu errei?" O filho o adora, até telefona da casa de detenção para cumprimentar o pai pelo aniversário. Como pode ter criado um monstro?

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