O laudo do Instituto de Engenharia Aplicada a Controvérsias (Ideac) que sinalizou para uma revisão completa no projeto estrutural da Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) Vargem Limpa é imprestável, superficial e deve ser engavetado, afirma a Prefeitura de Bauru.
A manifestação veio no final de fevereiro no âmbito da disputa travada há quatro anos com a COM Engenharia, responsável até 2021 pela faraônica ETE Vargem Limpa. O DAE também opinou no mesmo sentido. A Justiça ainda não decidiu.
Para a administração, uma nova perícia deve ser feita no local ante as irregularidades que, segundo o governo, maculam este primeiro relatório.
O laudo sobre a ETE foi apresentado pelo Ideac em setembro do ano passado. Em mais de 600 páginas, o documento afirma que todos os envolvidos têm parcela de culpa sobre o atraso na conclusão da obra: a responsável pelo projeto, Arcadis Logos (antiga Etep), a Prefeitura de Bauru e a COM Engenharia.
O relatório menciona falhas da COM Engenharia na condução da obra - a empreiteira deixou de seguir diretrizes da planta em várias ocasiões - e morosidade da prefeitura na gestão do empreendimento.
Por isso, afirmou, "a recomendação técnica é que, antes que as obras sejam retomadas, seja feita uma revisão completa do projeto estrutural, com previsão de reforços em todas as estruturas subdimensionadas, para que elas possam atender adequadamente a todos os esforços solicitantes quando a ETE estiver em plena operação".
O governo, contudo, contesta a conclusão a que chegou o instituto. "O laudo é imprestável por ferir princípios elementares de um laudo técnico, apresentando-se totalmente superficial. Não foram realizadas inspeções relevantes, como testes e ensaios, para avaliar a qualidade das estruturas e a conformidade com as normas técnicas", afirma.
Para a administração, também "não houve a elaboração de relatórios fotográficos para perpetuar a condição constatada da estrutura, o que é essencial para uma análise técnica robusta".
Mais do que isso, o governo diz também que a equipe do Ideac também não tinha qualificação adequada. "Não foi localizado em qualquer ponto do material elaborado número de registro do Crea [Conselho Regional de Engenharia] ou CAU [Conselho de Arquitetura e Urbanismo] da empresa Ideac e de seus colaboradores", diz.
A impugnação da prefeitura também sugere que há vínculos entre o Ideac e a COM Engenharia.
A manifestação acompanha um apontamento de conflito de interesses feito pelo governo no ano passado. Na época, a administração argumentou que o quadro do instituto possuía um engenheiro que assinou um laudo contratado pela COM em 2021.
Esse vínculo, argumenta a prefeitura, é constante. Tanto que o próprio Ideac admite no laudo ter utilizado equipamentos de proteção individual (EPIs) fornecidos pela COM durante a inspeção na ETE.
Para a administração, "a ausência de equipamentos de proteção EPIs e a falta de acompanhamento por profissionais especializados em segurança do trabalho comprometem a validade do laudo".
"A empresa assina a incapacidade e despreparo da equipe, muito bem remunerada para tal, e demonstra se sentir confortável com o vinculo constante com a empresa COM, inclusive com empréstimos de Equipamentos de Proteção Individual como Capacetes e Cintos", acrescenta.
ESTRUTURA E CONTRATO
A prefeitura aponta também para a falta detalhamento da infraestrutura durante a avaliação da ETE. À Justiça, afirmou que "o laudo não realizou análise técnica detalhada das estruturas, limitando-se a observações superficiais" e que "não foram realizados exames simples, como ensaios de resistência ou, análise de integridade das armaduras". Para o governo, a "ausência desses elementos essenciais invalida as conclusões apresentadas no laudo".
A impugnação diz também que o relatório do Ideac "não analisa, de forma crítica, os 12 aditivos contratuais realizados que aumentaram o valor do contrato em mais de 18,29%, ultrapassando o limite legal estipulado pela lei 8.666/93 [antiga Lei de Licitações]".
"De mais a mais a empresa [COM] confessa que tinha conhecimento das falhas de projeto e mesmo assim assumiu o risco de construir uma obra, que segundo ela mesma seria inexequível".
Disputa deve se estender ainda mais
A disputa em torno da responsabilidade sobre o atraso na ETE Vargem Limpa ainda deve se estender por meses - e afetar, inclusive, a própria concessão do sistema de esgoto à iniciativa privada, pacote de R$ 3,5 bilhões cujo maior objetivo é finalizar a obra da estação de tratamento.
A licitação já foi aberta, mas está suspensa por determinação do Tribunal de Contas de São Paulo (TCE-SP) desde janeiro. Se liberada, porém, a vencedora do certame poderá ter de aguardar o desfecho da disputa entre a COM e a administração - sobretudo se a Justiça acolher os argumentos da prefeitura e determinar uma nova perícia sobre a ETE.
Para se ter ideia, o levantamento sobre as condições da estação de tratamento foi determinada no final de 2023 e a indicação do instituto foi contestada numa discussão que levou três meses. A perícia começaria em março, mas só iniciou de fato em junho. O laudo, por sua vez, veio em setembro - e impugnações contrárias ao relatório ainda estão sob discussão.