A Organização Mundial da Saúde (OMS) publicou, em dezembro de 2024, o 5º Relatório Global de Segurança Viária. O Relatório, com dados de 2023, traz novo panorama sobre a segurança viária global mostrando a evolução transcorrida ao final da 1ª Década de Ação pela Segurança no Trânsito (2011-2020).
Em 2021, em escala mundial, registrou-se 1,19 milhão de mortes decorrentes de sinistros no trânsito, o que corresponde a uma taxa de 15 mortes para cada grupo de 100 mil habitantes. Em valores absolutos, houve uma queda de 5% quando comparado com o dado registrado em 2010, ou seja, 1,25 milhão de óbitos em escala global. De 2010 a 2021, no entanto, houve crescimentos no número de habitantes no planeta de quase 1 bilhão de habitantes e um crescimento na frota de veículos de 160%.
Ficou evidenciado que os habitantes dos países subdesenvolvidos estavam entre as principais vítimas em 2021; neles foram registrados 92% do total de óbitos. Para se ter uma ideia, com o intuito de comparação, nesses países a taxa geral foi de 21 mortes para cada grupo de 100 mil habitantes, enquanto que em países desenvolvidos a taxa foi de 8 óbitos. Considerando a faixa de idade das vítimas fatais, em 2021, constatou-se que 66% dos mortos no trânsito tinham entre 18 e 59 anos. Enfocando os dados de todas as faixas etárias, os sinistros fatais impactaram preponderantemente as pessoas do sexo masculinos (66%).
Quando se leva em conta os modos de transporte utilizados pelas vítimas fatais, os ocupantes de automóveis representaram 30% do total, seguidos pelo modo a pé (23%) e os ocupantes de motos/triciclos com 21% das mortes.
Considerando a performance de três grandes regiões no período 2010 a 2021, a Região Europeia foi aquela que melhor resultado apresentou, com uma queda de 36% no número de lesões fatais nos sinistros de trânsito. Já, na Região das Américas, registrou-se uma redução de somente 0,1%. A Região Africana, lamentavelmente, teve um aumento de 17% no número de vítimas fatais. Embora a Região Europeia tenha obtido uma significativa queda nos óbitos, ainda assim não atingiu a meta da Década que previra uma queda de 50% nos óbitos. Isto se deveu ao fato de que países europeus tem procurado consolidar a aplicação de filosofias como os Sistemas Seguros (SS), Visão Zero (VZ), dentre outras.
A filosofia de SS, por exemplo, pressupõe uma responsabilidade compartilhada pela segurança viária. Para um trânsito mais seguro cabe às autoridades, objetivamente, a responsabilidade de projetar e construir sistemas que considerem as falhas humanas, enquanto os usuários da via devem obedecer à legislação de trânsito. Já, o conceito de VZ possui como pressuposto que nenhuma morte no trânsito é aceitável, entendendo que a prioridade é a vida do ser humano. Dessa forma, os sistemas de mobilidade devem ser elaborados de forma a mitigar a gravidade em caso de sinistro.
A OMS estimou, para o caso brasileiro, uma taxa de 16 óbitos por 100 mil habitantes, para 2021, apontando para uma redução em relação ao valor estimado em 2018, que atingiu 19 mortes por 100 mil habitantes. Comparando o valor estimado de 2021 com outros países da Região das Américas, o Brasil atingiu um índice similar a países como Colômbia, Costa Rica e Suriname. Dentre outros vizinhos, a Argentina (9), o Chile (10), o Peru, Uruguai e Venezuela (13) e Guiana (15) apresentaram índices mais favoráveis do que o índice brasileiro. O Paraguai (21) e a Bolívia (18) apresentaram índices piores.
Enfim, explícito é que o Brasil não está fazendo seu dever de casa. Quer estar entre os melhores, mas seu desempenho é questionável. Vidas humanas são preciosas e a sinistralidade não pode continuar banalizada.
O autor é professor titular aposentado do Departamento de Engenharia Civil/Ênfase em Engenharia Urbana da UFSCar e coautor do livro Segurança no Trânsito