Ascensão do bolsonarismo e do neo-bolsonarismo, na pessoa de Pablo Marçal, tem uma gênese: a violência. Ambos bem compreenderam a trama humana que se enreda - com muito prazer - no fascínio por aquilo que se apresenta violento. Os calorosos debates entre Leonal Brizola e Paulo Maluf, a fala contundente e histriônica de Enéias Carneiro e o histórico embate entre Rui Xavier e Orestes Quércia, são exemplos memoráveis de que o violento, o abominável e o esquisito fascinam a grande massa e se torna inesquecível.
Basta notar, também, o sucesso de audiência de programas policiais, filmes de catástrofes, séries que relatam a vida íntima de criminosos, ou mesmo pelo incalculável número de visualizações em mídias e redes sociais quando a cena representa alguma espécie de violência. Seu "dedo rola a tela", num consumo compulsivo por ver mais e mais o repugnante e o tosco. O assunto assassinato, ocultação de cadáver, corrupção e mistério, colocam todos num deleite prazeroso de suposições e pré-julgamentos
A violência é um elemento familiar, antropológico, que integra a nossa constituição psíquica e, portanto, vem a ser um nutriente extremamente potente para capturar massas eleitorais. A Horda e o Rebanho, termos utilizados por Sigmund Freud para descrever o fenômeno das massas (1921), representam precisamente a ideia de admiração por um "Pai temido", com poder messiânico para promover a salvação daqueles que clamam por uma autoridade. Não por outro motivo que tais políticos se valem da desobediência, do enfrentamento, da potência, do obtuso, da virilidade, do fálico. Se assemelham nessa cilada para a Democracia: potencializam o ódio em relação ao inimigo e, com isso, capturam massas e eleitores.
A essência da política é justamente essa, segundo Carl Schimitt, teórico do conservadorismo autoritário da Alemanha: reconhecer a "distinção entre o amigo e o inimigo" e se valer disso. Bolsonaro fez isso muito bem; Marçal já escolheu os seus alvos.
Com isso as massas de ambos os lados se constituem, a exemplo de Blackblocs ou patriotas que se reúnem em atos antidemocráticos, para promover violência de toda espécie. O inimigo não precisa ser moralmente mau ou esteticamente feio. Basta estar "do outro lado".
Creio que não por leitura, mas por instinto arcaico, Pablo Marçal bem compreendeu este fenômeno - arrisco-me a dizer - por sua imersão aguda em mídias e redes sociais. Estes locais virtuais representam exatamente o real: uma sociedade de espetáculo que se nutre de violência, corpos, dinheiro e narcisismo. Marçal é fruto disso.
É vítima da própria consciência, capturada pela métrica de algoritmos que potencializa seu nome e sua candidatura por meio do tosco, do vil, da violência como missão.
Eis a gênese de seu sucesso.