Deve haver criminalização do aborto, nas hipóteses excepcionais, hoje contempladas na legislação penal? Como se justificaria a punição criminal à gestante, no caso de ter sido vítima de estupro; ou tendo havido risco à vida da mulher? Ou no caso do feto malformado, com graves danos cerebrais?
Essas situações, prestigiadas no Código Penal como 'excludentes da criminalidade', podem ser consideradas infração criminal (homicídio), quando o aborto ocorrer após 22 semanas da gestação; as sanções privativas de liberdade (prisão) seriam as do homicídio [matar alguém]: reclusão de 6 a 20 anos! Essa penalidade à gestante e outros atores criminais é assaz desproporcional: o estuprador da gestante estaria sujeito a sanção menor de 6 a 10 anos!
Isso tudo ocorrerá se for adiante o projeto de lei em tramitação na Câmara dos Deputados. Essa Casa Legislativa aprovou regime de urgência na tramitação do projeto de lei que criminaliza (como homicídio) o aborto realizado após 22 semanas de gestação; o que tem proporcionado acirradas discussões, cujo debate espraia-se na imprensa.
Após várias manifestações da sociedade, no sentido de desapreço à tramitação urgente e ao próprio conteúdo do projeto de lei, a Câmara dos Deputados resolveu deixar para o segundo semestre a discussão a respeito desse polêmico tema. Justamente, em momento eleitoral, propício, na verdade, para outras vertentes, de âmbito restrito ao Município (eleição de prefeitos e vereadores), e não de espectro nacional, difuso.
Considerando-se os aspectos jurídicos, políticos, ideológicos e até religiosos, esse assunto deveria ser tratado com o devido comedimento, com a participação dos diversos setores da sociedade brasileira.
A dignidade da pessoa humana, a liberdade [escolha] e outros pontos correlatos, estabelecidos na Constituição Federal, encarecidos no regime democrático de Direito, merecem respeito, elevada consideração, antes de qualquer medida que possa alterar a legislação de tema tão sensível.
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