COLUNISTA

Câncer totalmente evitado

Por Alberto Consolaro | 03/02/2024 | Tempo de leitura: 3 min

Professor Titular da USP e Colunista de Ciências do JC

Reprodução

Sem o freio, perde-se o controle do carro; o HPV descontrola o freio da células na proliferação: o gene p53 !
Sem o freio, perde-se o controle do carro; o HPV descontrola o freio da células na proliferação: o gene p53 !

O freio diminui a velocidade do carro e o gene p53 controla a quantidade e proliferação das células. Se as células proliferarem sem parar, teremos o câncer e, no caso do carro, teremos um acidente grave.

Em alguns cânceres, descobriu-se que a causa é um vírus que, ao entrar nas células da pele e mucosas, inibe o gene p53 e a célula perde o freio. Depois de alguns anos pode se ter um câncer. Este vírus é o HPV, ou papilomavirus humano, com mais de 200 tipos, sendo 12 deles indutores de câncer ou oncogênicos, principalmente os tipos 16 e 18. As lesões benignas induzidas pelo HPV, não são induzidas por tipos oncogênicos.

COMO SE PEGA

É impossível não ter contato com o HPV, pois está presente em algum momento da vida de mais 80% ou mais, das pessoas ativas sexualmente. O contágio se dá no contato direto com pele e ou mucosas infectadas sem nenhum sinal ou sintoma. Qualquer pessoa pode ser portadora.

O contágio pode ser: 1º) por contato entre as partes genitais ou entre as partes genitais com as mãos ou a boca. 2º) Não precisa ter relação sexual completa, pode ser transmitido apenas pelas carícias. 3º) As secreções podem ajudar o HPV a contaminar as pessoas.

Três observações: a) contaminação por objetos, vaso sanitário, toalhas e roupas íntimas nunca foi comprovada, b) contaminação no parto não afeta a criança, c) procedimentos operatórios não transmitem HPV, desde que se use luvas, máscaras, óculos de proteção e material esterilizado.

TEMPO QUE FICA

Na pele ou mucosa, o HPV fica entre 6 meses e 2 anos e tende a desaparecer pela resposta imune, mas não tem como saber ou tratar. Em algumas pessoas, ele persiste latente por 15 a 20 anos, e depois vem a manifestar-se como lesões precursoras ou invasivas no colo uterino, vagina, vulva, ânus, pênis, orofaringe e boca. As lesões precursoras podem ser tratadas para não virar câncer e, assim, os exames anuais são importantíssimos para todos.

Os nome dos cânceres provocados pelo HPV são: carcinoma de colo uterino, carcinoma anal, carcinoma de vulva, vagina, pênis, orofaringe, laringe e boca. Ele também provoca tumores benignos como: papiloma bucal, verruga comum, condilomas e hiperplasia epitelial focal.

QUE BOA NOTÍCIA

Pessoas colocavam em dúvida se a vacina anti-HPV era eficiente na proteção contra os canceres por ele induzidos. Muitas evidências revelavam que sim e alguns serviços de saúde no mundo começaram a vacinar suas crianças, para prepará-las imunologicamente contra as infecções pelo HPV. Mas, as evidências dos efeitos obtidos no serviço de saúde da Escócia, são impactantes demais.

Neste ano, pesquisadores escoceses liderados por Tim Palmer (https:doi.org/10.1093/jnci/djad263), relataram a ausência completa de câncer uterino cervical nas mulheres depois que houve a vacinação das crianças de 12 e 13 anos, nascidas entre janeiro de 1988 e junho de 1996.

O programa iniciou-se com a vacina bivalente para os tipos 16 e 18, os mais oncogênicos (Cervarix - GlaxoSmithKline Biologicals), com significante proteção cruzada contra os tipos 31, 33 e 45. Depois se estendeu para a vacina quadrivalente (Gardasil - Merck & Co) e logo depois para a vacina nonavalente (Gardasil 9 - Merck Sharp & Dohme).

E mais, em mulheres adultas vacinadas entre 14 e 22 anos, com 3 doses bivalentes de vacina anti-HPV, houve uma significante redução da incidência quando comparadas, às não vacinadas, onde a incidência do câncer foi muito mais alta. O impacto dos benefícios da vacina anti-HPV e o alto grau de agressividade do carcinoma cervical invasivo uterino, é contrastante. Mesmo na vacinação após os 18 anos de idade, o impacto na prevenção é muito grande.

REFLEXÃO FINAL

O carcinoma de colo de útero é o primeiro a ser completamente previnível depois deste trabalho. Vacinar as crianças contra o HPV é um ato de amor aos adultos das próximas gerações. Há de se ressaltar que, outros resultados para os demais cânceres e lesões induzidas pelo HPV, devem ser semelhantes. No SUS também temos, então: comemoremos!

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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