OPINIÃO

O sexo, essa coisa obsoleta

Por Zarcillo Barbosa | 13/01/2024 | Tempo de leitura: 3 min

O autor é jornalista e articulista do JC

Na guerra dos homossexuais pelo seu reconhecimento, a população LBTQIA está decidida a participar ativamente do processo político, como forma decisiva de resistência, como previu Michel Foucault. A liberação sexual não é somente colocar em jogo as verdades secretas sobre si mesmo. O ideal de uma homossexualidade completamente despolitizada e silenciosa, vai ficando para trás e a questão da sexualidade se reveste de conotações mais modernas.

A França acaba de ver empossado o seu mais jovem e primeiro chanceler assumidamente gay, indicado pelo presidente Emmanuel Macron. Gabriel Attal é casado com um deputado de 28 anos e já era Secretário de Estado da Educação. Está fora do armário desde 2019. Para os franceses não foi uma grande surpresa. A notícia foi recebida positivamente, exceto pelos extremistas de direita, pois ajudará o país que ficará sob os holofotes do mundo, por causa dos Jogos Olímpicos de Paris.

Na Europa, o fato sequer é inédito. O primeiro ministro de Luxemburgo, Xavier Bettel, também é assumidamente gay. Sua colega da Servia, Ana Brnabie, declarou-se lésbica. Nem por isso deixou de ser respeitada, embora a Sérvia seja vista como um país altamente conservador e que sequer admite casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Já tivemos casos idênticos na Islândia, na Irlanda e na Noruega. Aqui no Brasil, ainda não fomos longe mas, o governador atual do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, 38, aspira o lugar de Lula. Jamais vez segredo de sua união estável com o médico Thalis Bolzan, pediatra de 31 anos.

Há alguns anos, coincidiu a minha ida a São Francisco, na Califórnia, com o Dia da Parada Gay. A deles é a maior do mundo. Anotei os dizeres de um grande banner conduzido por alegres rapazes vestidos com as cores do arco-íris: We´re queer, we´re here, so get fuckin´used do it (numa tradução livre e muito puritana: "Somos bichas, aqui estamos, vão ter que se habituar".

A frase estava em todos os jornais, no dia seguinte, com os jornalistas encarregados da cobertura do evento indo além do seu sentido literal. Significa também que a sexualidade só pode criar uma identidade coletiva e individual quando lhe é conferido um sentido para isso. Ou seja, quando se acredita que é possível dar-lhe um sentido que excede qualquer descrição científica e comportamental. O "desejo", agora é o "desejo de revolução", pela política, assumindo obrigações junto ao povo, antes deles mesmos.

Aquele maio de 1968 morreu, com as lutas estudantis, as barricadas nas ruas, a contracultura, black power, liberação das drogas.

No Brasil, 12% das pessoas adultas se declaram assexuais, lésbicas, gays, bissexuais, transgênero e queer ("estranho", em inglês, palavra antes usada para insultar e que foi retomada de maneira positiva).

Somos o maior país gay do mundo, e também o que mais mata. Razões suficientes para que essa enorme comunidade participe, também, da luta pela melhor distribuição de Justiça, e do direito de as minorias viverem em segurança.

O sexo vai perdendo a sua prioridade, tão obsoleto como a alma, e já não é a fonte mais importante do fluxo dos desejos. Freud dizia que "tudo é sexo", mas a vida moderna nos demonstra que não é bem assim. Até a reprodução se cumpre por meios completamente artificiais, sem vínculos com a sexualidade.

A política é aberta, na vida democrática. Os segmentos da sociedade precisam se fazer representar, se quiserem ser ouvidos e atendidos. O famoso conceito de "máquinas desejantes" (O Anti-Édipo, Deleuze e Guattari), alimentou uma geração que tinha começado a substituir a revolução pelo desejo. Frustrou-se. Hoje já nem conseguimos deslumbrar o que isso significa. No caminho de volta, "o desejo de revolução" se sobrepõe, principalmente para aqueles que sonham com a libertação e um mundo onde os diferentes sejam reconhecidos e respeitados.

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