OPINIÃO

Na Borda

Por Claudia Zogheib |
| Tempo de leitura: 3 min
O autor é psicóloga clínica pela USC, psicanalista, especialista pela USP - @augurihumanamente e @cinemaeartenodivã

O transtorno de personalidade borderline foi descrito primeiramente pelo psicanalista Adolph Stern em 1938 e se trata de um quadro com condições clínicas que em muitos aspectos se assemelha às psicoses, mas conserva um grau substancial de integração da personalidade e de contato com a realidade, descrito como uma fronteira entre a neurose e a psicose, uma zona mista onde o paciente tem sintomas das duas estruturas clínicas.

Este quadro foi introduzido no DSM por Otto F. Kernberg, um psicanalista naturalizado americano nascido na Áustria, professor de psiquiatria na Weill Cornell Medicine e que a partir da década de 60 descreveu o quadro como um sintoma que envolve um sentimento de que em algum momento vai ser abandonado, podendo ser sentido pelo indivíduo como algo que de fato vai acontecer ou algo que está no campo de seu imaginário, mas o fato é que sente o medo do abandono ou tem um sentimento que está na iminência de ser abandonado. Além disto, tem uma instabilidade entre o ideal e o real, entre a expectativa, a realidade e as contrariedades, tendo sempre muita idealização, e quando algo sai fora do esperado tem uma reação desproporcional, intempestiva.

Uma outra característica é a instabilidade que tem com relação a imagem de si mesmo, de se sentir muito ou pouco do que realmente é.

Outro traço é a impulsividade e reatividade que neste quadro se mostra às vezes em práticas de auto agressão, auto mutilação, e quando a pessoa se coloca em situações de risco objetivamente e subjetivamente. É aquela pessoa que precisa "movimentar", "causar", que não suporta tranquilidade e que atua o tempo todo.

Outra característica é a tentativa de suicídio ou o próprio suicídio. É uma pessoa que tem uma constante instabilidade de afeto e um sentimento constante de vazio, sempre sente que está faltando alguma coisa, e por assim ser, torna-se uma pessoa impulsiva: se ocupa criando confronto e confusão o tempo todo.

Um outro sintoma mais raro é a ideação paranoide transitória que é quando o indivíduo se sente perseguido, sempre acha que tem um complô contra ele e que as pessoas estão armando, e para tentar descobrir, se coloca em situações de perseguição e risco.

Outro traço é quando a pessoa não tem controle de sua raiva, sendo dominada sempre por este sentimento tendo ataques de fúria que é desproporcional à causa.

No livro de Jacques Alain Miller, "A Psicose Ordinária" ele descreve este quadro de forma precisa, identificando vários gatilhos que nos ajudam a perceber o sofrimento do sujeito que sofre deste quadro.

No transtorno borderline existem sintomas que são agrupamentos de dois estímulos, descritos muito bem no livro "Elementos para a Psicanálise Contemporânea" pelo psicanalista Luís Cláudio Figueiredo, onde ele fala da problemática do narcisismo e da esquizoidia, dizendo que estas duas complicações entram em compensação e equilíbrio mutuo, sendo este o diferencial que explica o transtorno borderline.

É um transtorno muito recorrente que merece ser olhado com cuidado e atenção, que exige psicoterapia constante por conta de seus desdobramentos. É um indivíduo que sofre e que faz quem está à sua volta sofrer.

Este texto foi escrito ao som da música "With Or Without You", de U2, por Military Wives.

Comentários

1 Comentários

  • Lucia Korsteim 13/09/2023
    Parabéns pelo texto. Muito esclarecedor.