COLUNISTA

Como se inicia um câncer!

Por Alberto Consolaro | 17/06/2023 | Tempo de leitura: 3 min

Professor Titular pela USP e Colunista de Ciências do JC

Célula em verde está se fragmentando como uma rosa perdendo suas pétalas e isto se chama apoptose, um mecanismo anticâncer
Célula em verde está se fragmentando como uma rosa perdendo suas pétalas e isto se chama apoptose, um mecanismo anticâncer

Na superfície das células têm-se milhões de ouvidos bioquímicos como pontinhos sobre a casca de uma laranja, chamados de receptores. Células falam o tempo todo para o corpo funcionar, liberando palavras bioquímicas ou mediadores, que se encaixam nos ouvidos das outras células. São trocas de ordens, mensagens e informações de forma corporativa e solidária: é lindo de se ver!

No núcleo de cada célula tem 23 armários com mil fichas em média. Cada armário chama-se cromossomo e cada ficha é um gene, ordem ou mensagem. Cada receptor liga ou desliga uma dessas ordens de funções a executar internamente.

De uma célula, viramos 10 trilhões delas duplicando-se toda hora em mitoses. Os 25 mil genes que temos, são copiados em todas as mitoses. Este processo de divisão celular teria que ser perfeito, senão células filhas sairão defeituosas, desobedientes, rebeldes, intolerantes e proliferarão sem controle.

São trilhões de mitoses, mas o processo não é tão perfeito assim, pois forma milhares de células filhas defeituosas por dia. Se sobreviverem vão desregular tudo e não obedecerão os protocolos de controle e organização. Já nascem rebeldes, inconstantes, parasitas e descontroladas. Se essas células atípicas sobreviverem, podem dar origem ao câncer sem que se perceba em meses e anos.

OS TRÊS VIGILANTES

Na mitose, um dos 25 mil genes fica muito atento e se chama p53. Se uma célula filha sair defeituosa, ele a obriga praticar o suicídio que tem um nome muito poético: apoptose. Do grego, significa despetalar-se ou cair em folhas no outono que chegou! Na apoptose, as células morrem fragmentando-se em pétalas!

Um tipo de células com permissão para matar livremente, circula aos milhares pelo corpo, são chamadas de matadoras naturais ou células NK ou “natural killers”. Na menor suspeita e sem dó, se desconfiar que uma célula está defeituosa ou atípica, matam imediatamente com armas potentes que tem na superfície, em uma cena cinematográfica verídica ao microscópio.

E se a célula atípica enganar o gene p53 e as células NK, teremos um câncer? Calma, ainda temos a chance do sistema imunológico reconhecê-la e matá-la. Este poderoso sistema é um conjunto de células sanguíneas ou leucócitos, anticorpos ou imunoglobinas, e outras substâncias. Rezemos para que os linfócitos e macrófagos saibam distinguir as células do bem daquelas do mal, tal como fazemos no dia a dia com as pessoas, mas reconheçamos que é uma missão difícil.

O INÍCIO DE TUDO

Diariamente, para uma célula defeituosa persistir e dar origem a um câncer, precisa escapar pelo menos de 3 mecanismos muito eficientes de reconhecimento e eliminação. Nesta hora, ela se sente poderosa e livre para proliferar sem controle no organismo, migrando para lá e para cá, com filiais ou metástases.

Um problema sério é que agentes externos podem mudar os genes e gerar células defeituosas. Estes agentes externos ainda podem atrapalhar a ação do gene p53 e as comunicações entre as células NK e as do sistema imunológico. Isto ocorre com o tabaco, álcool, poluentes, raios solares, herbicidas, pesticidas, estresse e vírus como o HPV.

Os agentes externos podem ainda mudar ou destruir receptores e mediadores dos 3 mecanismos anticâncer que funcionam como vigilantes contra as células atípicas que temos diariamente, aumentando-se o risco de um câncer se iniciar.

REFLEXÃO FINAL

O aparecimento do câncer vem de problemas internos do corpo e cada vez mais a forma que vivemos influencia demais, aumenta-se muito o risco de ter a doença! Cada vez menos depende-se do azar para se ter a doença, pois desvendamos cada vez mais os mecanismos de prevenção e diagnóstico precoce. Muitas coisas poderíamos fazer para evitar: vamos refletir sobre isto?

 

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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