Talvez por ser de ascendência judaica, Einstein, cuja sabedoria transcende à exatidão da física, ensinava: "É mais fácil destruir um átomo do que um preconceito". Sem dúvida, o preconceito é um mal imensamente cruel a ser combatido e esse combate a ele não pode gerar uma nova modalidade de preconceito, como parece ocorrer em nossos dias.
A condenação de qualquer episódio tido como preconceituoso, sem a devida ponderação dos fatos, parece uma forma de preconceito às avessas, igualmente perigosa e injusta. Uma acusação leviana pode levar o acusado à "justiça", sem que isso venha beneficiar o indivíduo que se diz injustiçado.
Parece que, no Brasil principalmente, a razoabilidade está fora do cardápio.
Assim nasce um novo preconceito que tende a levar ao recrudescimento do mal que se deseja combater. Isso vale para todas as outras modalidades de preconceito. Nessa linha de raciocínio, não é impossível que alguém considere preconceituosas as ponderações aqui feitas.
Parece oportuno, neste momento, destacar o preconceito racial no esporte. De tantos preconceitos desprezíveis, a rejeição pela cor me parece o mais insensato e repugnante, pois não encerra preceitos filosóficos ou morais, nem convicções políticas ou religiosas. É apenas uma questão de preferência, um julgamento sumário do outro devido à cor da pele. Ainda pior, esse não é um julgamento íntimo e silencioso.
Geralmente se manifesta publicamente, eivado dos mais degradantes gestos e palavras, em grandes aglomerações de indivíduos que se consideram brancos e especiais, especiais simplesmente por serem brancos, ainda que destituídos de qualquer atributo.
Os estádios de futebol parecem o cenário ideal para isso. Não falo apenas dos episódios recentes ocorridos na Europa. Incluo, aqui, os pobres países da América Latina e o Brasil não constitui exceção: pobres intelectualmente, pobres profissionalmente, pobres moralmente, onde o preconceito se faz ainda mais inconcebível.
Inchados da soberba que alimenta os mais fracos, tentam diminuir a competência daqueles a quem agridem por serem pretos.
A turba, enlouquecida, já não se distingue, já não se vê a si mesma. Muitos são semelhantes àqueles a quem ofendem. A covardia individual se transforma em coragem coletiva que, por juntar tantas covardias escondidas, camufla um ato covarde ainda maior.
Lá, nos recônditos da alma desses indivíduos, certamente habita um preconceito inconsciente contra eles mesmos. Algum tempo atrás, um programa esportivo da televisão documentava o treino de um time de futebol que se realizava numa segunda-feira, às dez horas da manhã, a arquibancada lotada de torcedores descontentes com o desempenho do time na rodada do domingo.
Dentre muitas palavras ofensivas, aos berros, chamavam alguns jogadores de "preto, vagabundo". Destaca-se a contradição desses torcedores que, em vez de estarem trabalhando, ofendiam os jogadores em seu trabalho, às dez da manhã, numa segunda-feira que, num passado ainda não tão "politicamente correto", seria chamada de "um dia de branco"! Vejam que paradoxo.
Tudo isso exibe o despreparo moral e ético de seres humanos mal constituídos e mal-educados, que expõem sua inferioridade na exata proporção da superioridade que julgam ter.
Do Maracanã ao Santiago Bernabéu, do Parc des Princes à Bombonera, nas praças e nas ruas desses vastos continentes, a ignorância se universaliza fazendo o mundo igual naquilo que tem de pior - a covardia e a prepotência - sugerindo que, nesse mister, ciência e tecnologia não se distinguem de pobreza e subdesenvolvimento.
O ser humano é o mesmo onde quer que habite. Por isso mesmo, a cor da pele não pode ser um fator relevante na relação entre pessoas.
Existe uma variável na conformação da personalidade dos indivíduos que não se escolhe, não se programa e, uma vez instalada, não se altera. Cada indivíduo é como uma planta que não se conhece muito bem. Cultivada em solo fértil, pode dar frutos bons, maus frutos ou, simplesmente, fruto nenhum.
Não depende das oportunidades que tem ou das experiências negativas ou positivas que vivencia, nem do grau de instrução, nem da cor da pele ou da posição social.
É uma força instintiva, inconsciente, estimulada, sim, pela existência em sociedade, mas não produzida por ela, e que tende a juntar pessoas iguais.
Essa força intrínseca que nos domina a todos e que nos distingue, que nas horas mais difíceis da vida nos mostra exatamente como somos, sem disfarces, tão sem escolha como a própria cor da pele, chama-se caráter.
Se o problema é um caráter que não permite diferenciar as atitudes, que não separa o comportamento ético do não ético, que não reconhece a cidadania nem a justa igualdade de direitos, então, que diferença faz ser preto ou ser branco?