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Momentos de muita tensão marcaram a rebelião em Avaré, que durou 26 horas e terminou com 4 mortos

Fabiana Teófilo
| Tempo de leitura: 8 min

No total, foram quatro mortos e alguns feridos durante a rebelião no presídio de Avaré, que durou 26 horas

Uma rebelião iniciada no sábado por volta das 13 horas, terminou, ontem, às 16h20, depois da intervenção da Tropa de Choque da Polícia Militar. Foram 160 homens que invadiram o presídio e detiveram os rebelados com balas de borracha e bombas de efeito moral.

Os 15 agentes penitenciários, que eram mantidos como reféns, foram liberados cerca de uma hora depois da invasão da polícia de choque. Alguns apresentavam escoriações e todos saíram do presídio pálidos e muito assustados. As famílias, que os aguardavam do lado de fora, se desesperaram e, em alguns momentos, chegaram a perder as esperanças.

Quatro presos que estavam na cela do seguro foram mortos pelos colegas ainda no começo da revolta. A reivindicação era uma transferência de 42 presos para a Casa de Detenção, Penitenciária do Estado e São Vicente.

O motim teve início quando um grupo de 50 presos rendeu os agentes penitenciários. Alguns familiares que visitavam os detentos também foram rendidos e libertados meia hora depois. Em seguida, as celas onde estavam os presos jurados de morte foram abertas. Quatro deles foram mortos a golpes de estiletes, socos e pontapés.

O presídio foi cercado por 300 policiais militares dos batalhões de Avaré, Botucatu, Sorocaba e Votorantim.

Durante toda a noite de sábado, os líderes e dirigentes da Polícia Militar e do presídio participaram de tensas negociações.

No dia de ontem, do lado de fora do presídio, centenas de pessoas se comunicavam com os rebelados a fim de conseguir informações e saber se conhecidos e familiares estavam bem. Aos gritos, de cima do telhado da penitenciária, os presos diziam que tudo ia ficar bem.

Tropa de Choque

Depois de várias reuniões que ocorreram durante toda a manhã de ontem, ficou decidido que a Tropa de Choque da Polícia Militar invadiria a penitenciária.

De acordo com o coordenador dos Estabelecimentos Penitenciários do Estado de São Paulo, Sérgio Ricardo Salvador, os presos não aceitaram a condição de entregar os reféns e as unidades e, por isso, ficou decidida a invasão da Tropa de Choque, que resgatou os 15 agentes.

O secretário da Administração Penitenciária do Estado de São Paulo, Nagashi Furukawa, que assumiu, ontem pela manhã, pessoalmente, o posto de comando das negociações devido à gravidade da situação, disse que os presos têm o direito de reivindicar e de pedir, mas em momentos de normalidade. Se eles quiserem que alguém da Secretaria venha aqui para que eles peçam algo, sempre deixei as portas abertas. Mas nessas condições de reféns com facas no pescoço, ameaças, nós não negociamos, afirmou.

O secretário disse, também, que não há possibilidade de nenhuma transferência. De acordo com os presos, esse foi o motivo do início da rebelião, mas Furukawa afirmou que isso não ocorrerá agora.

No momento da invasão da Tropa de Choque, ouviu-se muitos disparos e viu-se muita fumaça no local. O secretário explicou que isso faz parte do procedimento da entrada da Tropa de Choque, para se conseguir o controle imediato da situação. Ele disse que as celas estão praticamente intactas e, portanto, os presos vão continuar no mesmo local. Não houve danificações nas celas. As fechaduras, as câmeras e os colchões estão lá, da mesma maneira. Então, não há problema para que eles continuem ali. O incêndio grande ocorreu no cinema, mas isso não tem importância. Acredito que, em poucos dias, a casa estará em ordem novamente, afirmou.

De acordo com o secretário Furukawa, a rebelião teve início quando, na saída das visitas, os presos encurralaram os visitantes num determinado raio e tomaram conta dos espaços.

Sem garantia

O secretário Furukawa disse que não garante 100% a inexistência de mais mortos dentro do presídio. Ele afirmou que os rebelados ainda estavam no pátio. A polícia, até o fechamento dessa edição, não tinha feito a contagem dos presos e a busca por todo o presídio para verificar se ainda havia alguém morto ou escondido.

De acordo com Furukawa, havia um risco de morte dos reféns com a invasão da Tropa de Choque, mas esse risco foi necessário para estancar a tensão e colocar um fim na rebelião. Às vezes, na vida, nós temos que correr risco. O Estado não pode ceder às exigências de pessoas que cometeram crimes, que matam gente, destroem o patrimônio público com o argumento de que vão matar funcionários, nós temos que dar um basta nisso, a verdade é essa, afirmou.

Ele disse, também, que dos 834 presos, a metade não estava envolvida na rebelião. Eles ficaram nos pavilhões, sem se intrometer nas negociações, mesmo sendo ameaçados, afirmou.

De acordo com o tenente coronel da Tropa de Choque de São Paulo, Reinaldo Pinheiro Silva, foram utilizadas apenas munições de borracha e bombas de efeito moral. Ele disse que não foi necessário o uso de armamento e munição real.

Do lado de fora, ouvia-se explosões fortes. O coronel explicou que a Tropa de Choque entrou e necessitou explodir diversas portas para ter acesso a todo o prédio. Portanto, o barulho foi causado por essas explosões.

Silva afirmou que, somente no início os presos resistiram à chegada da Tropa de Choque, mas depois de alguns minutos, eles foram cedendo e liberando os reféns, sem causar grandes problemas.

Preso acusa polícia de maus tratos

Numa conversa por telefone celular, um preso que se identificou como João, disse que dentro do presídio Doutor Paulo Luciano de Campos, os presos sofrem maus tratos. Ele afirmou que todos são humilhados e a polícia abusa do poder. Veja abaixo um trecho da entrevista:

Jornal da Cidade - Como está, agora, a situação aí dentro?João - Nós estamos com alguns reféns e estamos esperando uma resposta deles.

JC - Quantos reféns? João - São de 15 a 18 agentes penitenciários e mais uns 20 ou 30 presos que estão lá embaixo, trancados numa cela.

JC - Que resposta vocês estão esperando deles?João - É o coordenador (referindo-se ao coordenador dos estabelecimentos penitenciários do Estado, Sérgio Ricardo Salvador), ele tem que falar se vai ter a transferência ou não.

JC - E se a resposta for negativa?João - Se os caras disserem que não, então nós continuamos aqui.

JC - E os reféns? Também continuam? João - Aí eu já não sei, minha filha.

JC - Qual foi o motivo do início da rebelião? João - Nós queremos essa transferência e também tem o problema dos caras aqui, você sabe...

JC - Não, eu não sei. Qual problema? Que caras? João - Eu não posso falar mais.

Desespero e angústia do lado de fora

Centenas de pessoas, vindas de vários Estados do País, esperavam notícias de conhecidos e parentes presos no presídio Doutor Paulo Luciano de Campos. Outros, apenas curiosos, circulavam pelo lado de fora da penitenciária querendo saber como tudo ia acabar.

O sol quente não impediu que mulheres, homens e crianças se agarrassem nas grades do muro da penitenciária para ver um pouco melhor os presos que estavam em cima dos telhados do presídio.

Gritos, choro, desmaios. O desespero tomou conta das pessoas no momento em que a Tropa de Choque invadiu a penitenciária. As esposas, mães, filhos, irmãos gritavam para que os presos corressem para dentro do presídio porque a polícia estava chegando.

Um garoto de 8 anos gritava para os presos o nome de seu pai, Edvaldo: O meu pai Edvaldo está aí?...quero saber se ele está vivo. A mãe e as duas irmãs do garoto, também tentavam encontrar Edvaldo. Eu ainda não soube nada dele, preciso saber se ele está vivo ou não, disse a mulher, que chorava incansavelmente. A família veio de Belo Horizonte para visitar o preso.

Silvani, de São Paulo, tem o esposo no presídio e falava com ele através do celular, mas depois de algum tempo perdeu o contato e se desesperou por não ter notícias do que estava se passando. Ele me falou que a polícia está matando os presos lá dentro, estou com muito medo, disse.

Heloísa, de Birigüi, grávida de três meses, estava passando mal, mas não queria ir embora sem notícias do marido, Aparecido.

Os gritos não cessavam, em busca de notícias, mas eram poucos os que conseguiam se comunicar.

Depois que a Polícia de Choque entrou na penitenciária, os presos correram dos telhados e nada mais se via. As pessoas do lado de fora da cadeia gritavam cada vez que se ouvia uma explosão. Mulheres corriam para cima e para baixo aos prantos, crianças choravam e gritavam.

Ao final da rebelião, só restava dúvidas. Todos queriam saber se haviam mais mortos ou feridos, mas era difícil uma comunicação com os responsáveis pelo presídio. Depois de, aproximadamente, uma hora do final da rebelião, a Imprensa foi autorizada a entrar no prédio para conversar com os dirigentes. A informação era de que não havia mais nenhum morto e isso tranqüilizou um pouco os familiares que aguardavam do lado de fora.

Até às 18h15 de ontem, centenas de pessoas esperavam no lado externo da penitenciária. Os familiares disseram que só estarão tranqüilos quando puderem entrar para ver os presos.

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