Tarde do último sábado, 31º C. Cenário: Câmara Municipal. Embora o termômetro do plenário indicasse, com insistência, um calor insuportável no interior do Poder Legislativo, o clima do debate entre os candidatos à presidência do diretório estadual do PT não esquentou. Quem foi ao encontro petista esperando troca de acusações entre os presidenciáveis, cobranças, discussões calorosas, manobras, lavagem de roupa suja e confusões quadro típico que marcou as reuniões da legenda no passado saiu decepcionado. O PT de hoje está longe do PT do passado. No próximo dia 16, o partido realiza eleições diretas para a escolha de dirigentes em todas as suas instâncias.
A organização do encontro foi perfeita, à exceção do atraso de uma hora do início previsto para o debate, o que já era esperado, justificado pelo deslocamento dos candidatos da Capital até Bauru. Cerca de 100 pessoas, entre militantes, vereadores da região e até mesmo simpatizantes filiados a outros partidos, prestigiaram a reunião do PT, a primeira realizada em Bauru, em 21 anos de história da legenda, para debater a sucessão estadual da agremiação política que nasceu da organização da massa trabalhadora.
Dos seis candidatos que disputam o controle do diretório paulista, quatro compareceram pessoalmente e dois enviaram representantes. O encontro que durou cerca de três horas - foi mediado pelo vereador José Carlos Batata (PT), que do começo ao fim gastou sua experiência política para controlar o debate e levá-lo até o fim sem o registro de traumas. Faixas, jornais, cartazes em papel de boa qualidade e adesivos, coloriram de vermelho os corredores e escadarias da Câmara Municipal e deram um tom antecipado de campanha eleitoral.
A reunião foi dividida em três etapas. Na primeira, cada um dos quatro candidatos presentes e mais os dois representantes tiveram dez minutos para expor suas idéias e explicar por quê é candidato à presidência do diretório estadual. A segunda etapa contou com a participação da militância, através de perguntas ou explanações relâmpagos. Na última, os presidenciáveis retornaram à tribuna e, por sete minutos, fizeram suas argumentações finais. O debate chegou ao fim em clima de armistício entre as várias alas que formam a colcha de retalhos petista.
Glossário
Reestatização, combate ao desemprego, descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, rompimento com o Fundo Monetário Internacional (FMI), recuperação da capacidade de investimento do Estado e decepção com administrações petistas foram os temas que mais foram abordados no debate entre os candidatos à presidência do diretório estadual do PT. O partido, o que não é nenhuma novidade, defende com força total a reestatização das empresas privatizadas pelo governo do presidente Fernando Henrique Cardoso.
Na avaliação da maioria dos candidatos, a Lei de Responsabilidade Fiscal é resultado de uma determinação do FMI, que tem como pano de fundo o reforço do caixa central da União para evitar o calote no pagamento das parcelas da dívida externa do País. Eles defendem o rompimento do acordo firmado entre o governo e o FMI e uma auditoria na dívida, que pode ser entendida como uma espécie de moratória por tempo indeterminado.
Alguns presidenciáveis não pouparam críticas a prefeitos petistas eleitos na última eleição municipal, que estão se desviando da conduta política determinada pelo partido. A prefeita de São Paulo, Marta Suplicy (PT), foi cobrada pelo reajuste da tarifa de ônibus circular e pelo reajuste insignificante que deu aos servidores públicos municipais da Capital. As críticas também apontaram para o Rio Grande do Sul, onde um prefeito petista de uma cidade do Interior daquele Estado promete isenção de 100% no Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) para indústrias que se instalarem no seu município.
Veja quem são os candidatos à presidência do diretório estadual
Francisco Campos Prega o fortalecimento do partido nas pequenas e médias cidades; defende a aplicação do orçamento participativo no PT e a descentralização de seu poder. Campos afirma que o PT não pode recuar diante do grande desafio de dar a importância necessária para a elaboração de um programa de governo que aponte políticas públicas capazes de reverter a atual desordem e a exclusão social causada pela política neoliberal do PSDB e aliados.
Paulo Frateschi Atual presidente do diretório estadual do partido. Afirma que a burguesia brasileira já acostumou a fazer as transições por cima e prepara, neste momento, ataques ataques ao PT e a Luís Inácio Lula da Silva, virtual candidato da legenda à Presidência da República. Estamos construindo uma alternativa que seja a busca de um Brasil e de um São Paulo democrático, soberano e justo, discursa.
Simão Chiovetti É sociólogo e secretário agrário do diretório estadual do partido; chefiou o gabinete do deputado estadual Paulo Teixeira (PT). Defende que as atuais administrações petistas devem ter como base um programa democrático e popular, desconcentrando o poder e as políticas que atendam os interesses das maiorias. Paranaense, filho de camponeses, veio com a família para São Paulo. Iniciou sua militância nas pastorais sociais.
Misa Boito Militante da corrente O Trabalho. Lembra que nas eleições municipais do ano passado, milhões de eleitores votaram no PT para oferecer resistência à sede desenfreada do capital especulativo. Alerta para uma pesquisa feita pela CNI, a qual indica que 65% não votariam para presidente em nenhum candidato que representasse a continuidade da política de FHC. Que o partido cumpra o mandato e se apresente como um instrumento para esta discussão, exige.
Gilberto Maringoni (representou o candidato Wagner Lino) Avalia que o momento exige do PT a demonstração de que a corrupção constitui um dos meios utilizados para flexibilizar as relações trabalhistas e promover o desemprego, privatizar as estatais e transferir fortunas para fora do País. Um espaço enorme se abre para os socialistas se apresentarem como alternativa histórica para o Brasil, discursa.
Ricardo Alvarez (representou a candidata Lisete Arelaro) Seu grupo defende a necessidade de mudança e de radicais transformações que combatam a brutal concentração de terra, de renda, da riqueza e do poder. É necessário, mais do que nunca, afirmar um programa democrático e popular que reafirme a reforma agrária, a suspensão do pagamento da dívida externa e a quebra do monopólio dos meios de comunicação, diz.