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Alta na exportação depende de reforma

Patrícia Zamboni
| Tempo de leitura: 10 min

Para o presidente da Cipagem, Wilson Batista Souto, as exportações só vão crescer quando o Brasil reduzir os impostos.

Para o presidente da Companhia Paulista de Armazéns Gerais Aduaneiros Exportação e Importação (Cipagem), que administra a Estação Aduaneira Interior (Eadi-Bauru), Wilson Batista Souto, o Brasil tem um grande potencial para o mercado exportador. Porém, para que as exportações cresçam, de fato, é necessário que a carga tributária seja diminuída. O grande problema do Brasil é que o produto mais exportado é o imposto. Só que ninguém quer comprar imposto, observa.

Empresário experiente e de opiniões contundentes, Souto diz que o Governo Federal mente ao divulgar que as exportações brasileiras aumentaram. Segundo ele, na realidade houve queda nas exportações e, mais ainda, nas importações. Na opinião de Souto, não importa que o valor do dólar seja muito superior ao do real. O problema seria a constante flutuação cambial. A saída seria a estabilidade. Quando chegar a estabilidade, o Brasil voltará a crescer, analisa.

Outra questão que estaria sendo um entrave para o crescimento das exportações, na opinião de Souto, é a visão limitada. Para ele, não adianta o governo ficar insistindo em somente exportar mercadorias. O caminho ideal seria uma política de exportação e importação. Por isso, considera totalmente equivocada a frase dita recentemente, pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, exportar ou morrer. Para Souto, a economia e o mundo globalizados fazem com que, para exportar mais, seja necessário importar também.

Na entrevista ao JC, o empresário fala sobre o cenário nacional e do trabalho da Eadi em Bauru.

Jornal da Cidade - Qual é a função da Eadi?Wilson Batista Souto - As Eadis foram instituídas no Brasil para haver um desafogamento das áreas primárias, que são os portos, aeroportos e fronteiras. A função é desembaraçar as cargas, fazendo com que sejam nacionalizadas, no caso de produtos importados, ou desnacionalizadas, no caso das exportações. Eu costumo dizer que a estação aduaneira é uma embaixada de mercadorias, porque tudo que está aqui não é nacional.

JC - Quem coordena e quando foi criada a Eadi Bauru?Souto - Existe uma área privada que é controlada por empresários, sendo que eu sou o majoritário. Então, eu tenho a função de fiel depositário das mercadorias e quem faz o desembaraço, ou seja, toda a parte documental, é a Receita Federal. Sobre essa função, eu não tenho poder nenhum, só a Receita. A Eadi Bauru iniciou suas atividades no dia 5 de setembro de 1999.

JC - Como está sendo a evolução dos números/negócios da Eadi? Souto - De janeiro do ano passado para janeiro deste ano, os negócios cresceram 1.606%. O volume processado passou de US$ 269 mil para US$ 4,32 milhões. Este ano, nos últimos meses o volume veio diminuindo, principalmente das exportações. O governo está falando que as exportações no País aumentaram, mas é mentira. Elas diminuíram e as importações caíram ainda mais, porque quem quer comprar alguma coisa que não sabe quanto vai pagar? Entretanto, o problema não é o dólar estar valendo R$ 2,60. No Japão, por exemplo, a equivalência das moedas é de US$ 1,00 para 120 iens e o país anda normalmente. O que interessa não é o valor e nem a correspondência entre uma moeda e outra, e sim, a estabilidade. O Japão está com a moeda estável há quase 30 anos. Se não é possível saber o quanto será pago pelos produtos que serão comprados para avaliar se o negócio é viável e lucrativo ou não, ninguém importa. Existe uma empresa de Bauru que estava importando papel. Agora, não importa mais, porque o produto ficou mais barato no Brasil, em função da alta do dólar. Então, a questão é a estabilidade.

JC - A Eadi Bauru abrange que região?Souto - Quando é feito o estudo de viabilidade de uma estação aduaneira, ele é direcionado para uma determinada região. Porém, o trabalho não precisa ser restrito a essa região, podendo ser estendido para o Brasil inteiro. O estudo para esta Eadi foi direcionado às delegacias regionais da Receita Federal de Araçatuba, Presidente Prudente, Marília e Bauru. Depois, tentaram abrir uma aduaneira em cada uma dessas cidades, mas é claro que não foi possível, porque não existe volume de negócios para tudo isso. Então, a nossa área é essa, mas eu posso trabalhar com cargas de qualquer lugar do País. Tudo vai depender da logística das empresas e do valor pago pelo processo.

JC - Quais as vantagens para as empresas fazerem o transporte de cargas pela Eadi do que pelo Porto de Santos?Souto - Basicamente, o custo-benefício. O que se paga aqui geralmente é bem menos do que nos portos e aeroportos. Em relação aos portos, o custo da Eadi-Bauru chega a ser 50% menor, e em relação aos aeroportos, 20% menor. Em relação às fronteiras, o custo é quase o mesmo. Além do custo, a outra grande vantagem é a agilidade. Se você tem uma carga importada de vinhos, por exemplo, no Porto de Santos o SIV (Serviço de Inspeção Vegetal) demora cerca de 15 dias para liberar o laudo. Aqui na Eadi Bauru conseguimos fazer isso no mesmo dia, pois o volume é menor e porque o SIV e o SIF (Serviço de Inspeção Federal) estão aqui dentro. Existe uma sala para cada um deles aqui na Eadi. Outro ponto é que para uma empresa de Bauru ou região, é muito mais fácil vir até aqui, em função da proximidade, do que ir até Santos. Tudo isso significa custos mais atrativos, inclusive os operacionais, e agilidade, além, dos serviços que a Eadi pode fazer e que um porto ou aeroporto não pode, que é o entreposto.

JC - A Eadi processa somente produtos industrializados ou agrícolas também?Souto - Trabalhamos com qualquer tipo de mercadoria, com exceção de alguns remédios, como os barbitúricos. Esses só podem passar pelo aeroporto de Viracopos, em Campinas, ou no Galeão, no Rio de Janeiro. Cargas vivas, que são os animais, também só podem passar pelos portos e aeroportos. Isso é para evitar a transmissão de doenças. Se um animal que está sendo transportado estiver doente, não passará da fronteira dos portos e aeroportos.

JC - Quantas empresas utilizam a Eadi atualmente? São de quais ramos?Souto - Hoje nós temos 132 clientes. Os ramos são totalmente distintos, desde rapadura em pó até computadores. Tudo se passa por aqui.

JC - Como é a relação com a delegacia local da Receita Federal?Souto - Ótima. O delegado da Receita, Celso Pegoraro, sempre abraçou a nossa causa. E nem poderia ser diferente, porque a Eadi fez com que aumentasse a arrecadação de impostos e para a Receita Federal isso é muito importante. O próprio Pegoraro já admitiu que a estação aduaneira colaborou bastante para o aumento da arrecadação local. A aduaneira é uma coisa boa para todos os envolvidos nesse mercado e, principalmente, para a cidade. Aqui, o delegado sempre nos ajudou.

JC - O que o senhor acha da frase dita recentemente pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, sobre exportar ou morrer?Souto - Eu não concordo, porque a questão não é mais só exportar. A globalização está fazendo com que para exportar, também é preciso importar. É como o caso da Argentina, que queria apenas exportar para o Brasil e não importar. A conclusão foi que o Brasil cortou as importações da Argentina. Isso é o que o mundo está fazendo hoje. Não existe mais aquela sistemática de só exportar ou só importar. É preciso fazer os dois, porque ninguém mais vai fazer favor para ninguém. Os Estados Unidos só importam do Brasil se nós também importarmos produtos de lá. Não se faz mais um só canal, como era antigamente. Os anos 80 foram marcados pela exportação. Os anos 90, pela importação. O governo queria que essa década fosse marcada pela exportação. Certamente, não vai ser.

JC - Algumas empresas preferem a exportação através de postagem por considerar que as aduaneiras têm certos entraves burocráticos e financeiros. O que o senhor diz sobre isso?Souto - Essa teoria só é válida para cargas com volume de mercadorias de até US$ 3 mil. Nesses casos, não compensa utilizar os meios normais, como as aduaneiras, porque o custo do frete seria muito elevado. As cargas são individuais. Então, vamos supor que você importou um computador de US$ 2 mil. Nesta situação, é mais fácil você desembaraçar a mercadoria no próprio aeroporto. Caso contrário, precisará de um caminhão só para trazê-lo até a aduaneira. Aí, não compensa, porque haverá o custo do frete, mais os impostos. Então, até US$ 3 mil a empresa paga um imposto único no Correio. Acima desse valor, terá que utilizar os meios normais.

JC - De que forma a linha férrea Brasil-Bolívia, inaugurada recentemente pela Eadi-Bauru, favorece as empresas da região no escoamento de cargas?Souto - O custo é muito mais baixo. Atualmente, no Brasil, custa cerca de US$ 13,00 o transporte de uma carga com peso de uma tonelada para vir de Corumbá até aqui. De caminhão, esse custo gira em torno de US$ 60,00. Por enquanto, a linha férrea só está atendendo o mercado da Bolívia. Mas, em breve, começaremos a trazer mercadorias do Porto de Santos também através da ferrovia.

JC - Por ser um País de dimensões continentais, o Brasil está se desenvolvendo mais do que outros e a vocação para o mercado exportador vai se configurando. Como o senhor avalia esse potencial?Souto - Veja, fala-se muito que a China é quase um país escravo porque lá a média do salário mínimo é de US$ 40,00. Só que no Brasil, está em torno de US$ 60,00 a US$ 70,00. Então, não vejo grande diferença nisso. O grande problema do Brasil é que o produto mais exportado por aqui é o imposto. E ninguém quer comprar imposto. Os empresários brasileiros não querem, muito menos os de fora vão querer importar os impostos daqui. As pessoas caem no erro de dizer que nas exportações não existe imposto. Mas não é bem assim. O que não existe é o imposto final. E tudo o que foi pago até chegar lá? Só não é pago o ICMS do produto final, mas paga-se o frete, que é caríssimo para levar mercadorias daqui até o norte da Europa, por exemplo. Também tem o frete daqui até o porto e do porto para fora. Então, tudo isso onera os valores. O restante, está tudo embutido e são impostos. Vamos supor que você vai exportar um carro daqui. Nesse caso, não terá que pagar o IPI final. Porém, os impostos estão embutidos em todas as peças que foram utilizadas para a montagem. O Brasil tem um grande potencial, mas as exportações só vão crescer, de fato, quando o governo deixar de exportar impostos para exportar mercadorias. Também precisa ter capacidade produtiva, que no momento não existe em função da crise energética. Além de tudo isso, no País ainda não há a visão futura de que não adianta mais só exportar. Isso não existe mais. É preciso haver uma política de exportação e de importação.

JC - Quais são as perspectivas para o segundo semestre?Souto - Não faço previsões nem positivas, nem negativas. Na minha opinião, o que deve acontecer primeiro é estabilizar o valor do dólar. A Argentina, eu acredito que vai se estabilizar depois que sair o dinheiro do empréstimo. Não é necessário, para o Brasil, que o valor do dólar abaixe. Como já disse antes, a questão é a estabilidade. A partir disso, todos se adaptam à realidade. Dessa forma, o Brasil voltará a crescer. Certamente, o ano que vem será melhor do que este.

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